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Lençois Maranhenses...a pé!


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O LABIRINTO DE AREIA VIVO DOS LENCOIS MARANHENSES

São muitos os adjetivos q fazem do Pq Nacional dos Lençóis a maior atração do Maranhão. Razoes + q suficientes p/ conferir de perto este local q é realmente de paisagem surreal, composta de uma mistura impar de dunas douradas, lagoas cristalinas, oásis verdejantes e habitantes simples e hospitaleiros, q tem sua rotina - e conseqüentemente, a vida - regida pelo capricho dos ventos. O desafio de conhecer td aquilo na base da pernada e longe do esquemao turístico tradicional era tentador demais de passar batido, ainda + pra quem curte caminhar, convive c/ um perrengue e quer experiências q vão alem do passeio-de-mao-dada ofertado por agências. Assim, encarei a parada sozinho - munido apenas de bússola e uma info prévia - apenas pra ter 2 certezas: q a Travessia dos Lençóis, saindo de Barreirinhas e finalizando em Sto Amaro, requer apenas disposição, já q é uma caminhada de 65km percorridos em 3 dias árduos mas q não oferece maiores problemas de navegação; e constatar tb q o local realmente faz jus aos adjetivos q lhe são dirigidos.

 

DE SÃO LUIZ À BARREIRINHAS

Saí de São Luiz bem cedo da rodô c/ destino novamente p/ Barreirinhas. Novamente? Pois é, apos navegar o Delta, chegar em Tutoia, passar por Caburé e velejar o Rio Preguiças, cheguei em Barreirinhas já c/ gdes amizades formadas durante td aquele trajeto. Sacumé, laços mochileiros sempre se estreitam em trechos comuns e demorados. Ainda + se forem mulheres(rs). Foi o meu caso, pois poderia ter imediatamente feito a travessia naquele instante, mas como a galera formada tava tão legal, optei por curtir baladas em São Luiz e depois retomar meu plano de travessia, afinal Barreirinhas dista apenas 250km de São Luiz e a passagem não era tão cara. Bem q tentei convence-las a me acompanhar na empreitada, sem sucesso! "Vc é louco em cruzar isso a pé!", diziam, alegando q tb não tinham condicionamento físico pra tal.

Voltando à vaca fria, me despedi da mineira Rosa e da francesa Danielle na Pousada Alcântara - um muquifo barato e decente localizado no Cto Histórico - e me encaminhei p/ rodoviária, onde tomei o busao das 8:45 com destino Barreirinhas. O trajeto é um porre, sem maiores atrativos a não ser as incontáveis planícies forradas de carnaúbas, babaçu, buritis, mangas e alguns riachinhos. A paisagem verdejante vai lentamente se mesclando ao de areial, q emoldura as poucas choupanas e casinhas de palha q pipocam aqui e acolá. Algumas paradas - em Bacaubeiras, Rosário e Morros - no trajeto me acordam de agradável soneca apenas p/ constatar q o busao vai lotando aos poucos e não tem limite de passageiros, c/ muitos locais em pé, cheios de sacolas de compras. Sempre atento às placas e anúncios pois eles são reflexo da cultura local; me chamam a atenção a "Caninha do Engenho", o refri "Psiu", "oficina de cabelo", "Guaraná da Amazônia", "vende-se suquinho" e a EM Jose Sarney. Porem, nada mais hilário ao ouvir a gritaria das mulheres do coletivo ao saber q havia uma elétrica barata tb entre os passageiros, de carona, claro!

Por conta das inúmeras paradas, chegamos em Barreirinhas às 13:15 sob um sol e calor da peste! Barreirinhas é uma cidadezinha pequena q não oferece dificuldade de orientação, pois td se concentra basicamente em sua Rua/Avenida principal, onde o busao finalmente parou. Comprei mantimentos p/ 4 dias numa padoca e me abasteci de agua. Quis tomar alguma coisa gelada antes, mas so havia o "Guaraná Jesus" - a bebida mais tomada no Maranhão - e mandei ver assim mesmo. O liquido é um cor-de-rosa chocantemente cristalino e seu sabor hiperadocicado é único, um misto de guaraná, canela e xarope. Na seqüência, bastou andar pela rua principal rumo à balsa do Rio Preguiças, não muito longe dali, sentido oeste, onde cheguei em menos de 10min.

 

RUMO ÀS DUNAS

Na beira do manso Rio Preguiças, aguardei algum veiculo chegar p/ ir junto na mesma balsa ate a outra margem. Nada. Mas havia um barqueiro q cruzava gente sem veiculo como eu, e foi nele q embarquei. De graça. Já do outro lado, comecei efetivamente a travessia pela sinuosa estradinha de areia sentido noroeste, rumo às dunas, ainda distantes quase 12km.

Passei inicialmente pelo vilarejo de Sto Antonio - q se resumia a algumas casas - e uma guarita do IBAMA onde as excursões de agencias devem sempre parar. Pra minha surpresa, andarilhos solitários como eu passam batidos, sem sequer me pedirem nada. Os guardinhas apenas acenaram e nada mais. Não demorou e logo me vi sozinho, num caminho de areia retilíneo sem-fim em meio a vegetação arbustiva, um misto de caatinga/restinga. Parecia um tapete verde-claro sendo cortado por um risco branco! Como se o sol forte já não bastasse, ainda havia a estrada de areia fofa em si, q tava escaldante de tão quente. Mesmo andando de chinelao de dedo, a dificuldade em caminhar ali era real. Fiquei imaginando como seria entao andar nas dunas!? Uma dica é seguir as marcas de Toyotas deixadas pelo caminho, bem mais firmes e compactas p/ pisar e andar.

Há apenas duas bifurcações no percurso: primeira à direita, beirando uma cerca; e a segunda à esquerda. Em ambas me guiei pelas mesmas marcas de veículos deixadas, afinal os únicos q circulam e conseguem vencer o areial são as possantes Toyotas das agencias de Barreirinhas q levam turistas (diariamente, pela manha e no começo da tarde) às dunas e lagoas próximas da cidade. E elas não tardaram em aparecer. Enquanto eu me matava caminhando, algumas passavam do meu lado e os turistas - empolierados em tabuas/assentos dispostas na caçamba da mesma, carinhosamente chamadas de "pau-de-arara" - me olhavam perplexos. Vontade de pedir carona não faltou, mas tava resoluto a chegar às dunas a pé, mesmo com todas as adversidades acima mencionadas.

O tempo foi passando, o sol da tarde fritando meus miolos e tostando minha pele, e o cansaço já pegando. No caminho, paro pra conversar c/ 3 criancas q tavam ali, no meio do nada, pegando algo dos arbustos rente à estrada. Rosilda, Raimunda e Larisa coletavam sacolas de muriqui, frutinha pequenina q tem um leve gosto de maçã. Na seqüência dei continuidade à minha camelação às dunas, ainda não visíveis na planície de arbustos q parecia não ter fim. Faltando quase tortuosos 5km eis q uma das Toyotas parou do meu lado e me ofereceu carona. Não pensei duas vezes, nem tampouco de rogado e me acomodei na caçamba, atrás dos últimos turistas, e lá fomos nós! O resto do trajeto foi ate q emocionante, já q o motora pisou fundo e com destreza impar no volante vencia o areial - que + parecia um purê de batatas - com muito sacolejo, solavancos e remelexo, no melhor estilo off-road! Como não tava sentado comodamente tal qual os demais passageiros e sim acomodado na lataria, tive q me segurar firme pra não meter a cabeça no teto ou ser arremessado pra fora do veiculo! Após cruzarmos algumas pequenas lagoas no meio do caminho - c/ água quase na altura da caçamba - e passarmos por uma rústica ponte, já podiamos avistar no fim da estrada, ao longe, a pontinha de "morros" ora dourados ora claros cada vez mais proximos. Estávamos chegando nas dunas!

Por volta das 16hrs chegamos no final daquela precária estradinha, q coincidentemente é onde a vegetação termina e começam efetivamente as dunas - isto é, os Grandes Lençóis - onde estavam todos os veículos q passaram por mim, estacionados ao pé de um enorme morro de areia dourada. Não havia necessidade de guia nem nada, bastava seguir as pegadas na areia dos demais turistas. Duna adentro e subindo a primeira delas, levemente inclinada, o horizonte se abre por completo p/ contemplar uma paisagem surreal q me acompanharia nos dias seguintes: um "mar-de-morros-ondulados" feitos da mais fina areia, de colorações q iam desde o branco total aos mais diversos tons de ouro imagináveis! Pra completar esse panorama de puro deslumbramento, alguns espaços entre as dunas estavam preenchidos com lagoas cujas tonalidades variavam do verde-esmeralda ao azul-turqueza, contrastando exoticamente da claridade daquele areial-sem-fim q se estendia ate onde a vista alcançava! Olha, já vi dunas em Floripa, Itaúnas, Mangue Seco e Jeri, mas aquilo lá diante de mim superava qq termo superlativo q ate entao pudesse conceber. Simplesmente impressionante! Foi aí até q bateu um medão real e concreto da empreitada q estava resoluto a fazer: "Não seria muita areia - literalmente - pro meu caminhãozinho cruzar isso aí, sozinho?", pensei. Temores à parte, esqueci o cansaço, o calor e fiquei ali um tempão apreciando, hipnotizado, aquela paisagem lunar , p/ continuar a caminhar pela mesma, seguindo as pegadas ou os vários turistas q ali se encontravam.

As excursões de Barreirinhas vão sempre a um mesmo local: p/ Lagoa Azul e à Lagoa do Peixe, próximas uma da outra. Como era inicio de "inverno maranhense" (janeiro é estação de chuvas por lá) as lagoas estavam começando a encher. Contudo, a famosa Lagoa Azul estava totalmente seca, razão pela qual bastou descer pela areia fofa de onde estava e caminhar pelo enorme espaço deixado pela lagoa seca, já em chão bem mais firme e compacto, onde alguns tocos de madeira e restos de troncos dispersos são prova de q aquilo já foi um exuberante mangue. Lagoas secas sempre tem uma vegetação rasteira de gramíneas/capim ralo q cresce c/ o inicio da pluviosidade, mas o q me chamou a atenção foram pequenas poçinhas dágua c/ girinos(!?), cujos ovos são enterrados na época seca e eclodem ao menor sinal de agua.

Caminhando ate o fim da enorme lagoa seca, logo há de se subir a duna seguinte p/ desce-la em seguida, e andar novamente por outra pequena lagoa seca, sempre seguindo as pegadas deixadas (ou seguir sentido noroeste), bem obvias e evidentes. Olhando pra noroeste/norte ate sudeste a visão das dunas, de contornos suaves e abaulados, salpicadas de pequenas lagoas represadas; já pro sul/sudoeste ainda avistamos a faixa verdejante de restinga q limita so Grandes Lençóis.

 

NA LAGOA DO PEIXE

Nem 10 min de pernada nesse sobe/desce e logo alcanço a Lagoa do Peixe, uma enorme lagoa perene aos pés de majestosas dunas, onde parece q todos os turistas estão concentrados, refrescando-se ou nos arredores. O local é muito bonito, mas a farofada geral não impediu q me viesse à mente a muvuca do "Piscinao de Ramos", no RJ. Claro q a comparação é injusta, pois o local era paradisíaco, e limpíssimo. Joguei a mochila num canto e fui me refrescar nas águas da lagoa, q recebe este nome pq diziam ter peixes, mas não vi nada a não ser girinos. A profundidade me impressionou, pois a água ia um pouco alem da cintura. Destaque p/ belas flores aquaticas e alguma vegetação q finca suas raízes no fundo e permanecem balançando à tona, ao sabor do vento.

Com girinos ou não, a água - ao menos pra mim - é + q potável e abasteci minhas garrafas. O resto da tarde fiquei ali, curtindo aquele local, ora descansando, conhecendo os arredores, conversando c/ gringos ou coletando infos c/ os guias, q permanecem com os grupos p/ apreciar o por-do-sol, q diziam ser fantastico. No entanto, por ser verão o céu se tingiu de nuvens antes do crepúsculo, obrigando as excursões a retornarem sem apreciar o famoso espetáculo. Assim, antes das 19hrs e enquanto todos iam embora, retomei a pernada apenas p/ buscar um bom local p/ acampar.

Em pouco tempo me vi sozinho. Eu e o vazio. Caminhei pelo alto das dunas q ladeavam a Lagoa do Peixe e, mais adiante, passei a bordejar outras lagoas menores, ladeadas ainda por alguma restinga. Sempre em suave sobe/desce, sentido noroeste, terminei decidindo pernoitar do lado da ultima gde lagoa q encontrei, aos pés de uma duna mediana mas não muito proximo dela, porem protegido do vento. Saber montar a barraca voltada de costas p/ duna é fundamental, pois o vento rasteiro sempre carrega muita areia, e se deixar a entrada (tela) voltada pra duna em pouco tempo o interior se encherá de areia. Eu q o diga.

Devidamente instalado, preparei minha janta c/ um sucão e adormeci antes mesmo de escurecer totalmente, pois o dia sgte seria bem puxado. A noite fora tranquila e foi ai q lamentei trazer o saco de dormir, totalmente dispensável! Estava quente, porem agradável, bastava apenas o isolante. Impressionates foram as esporadicas ráfagas de vento: eventualmente sentia o dedilhar/tilintar de montes de areia sendo arremessados nas laterais da barraca pelo vento! A impressão q dava era estar numa tempestade de areia, com a armação da barraca remexendo bruscamente a cada forte ventania! Certamente se estivesse de frente p/ duna teria acordado coberto de areia!

 

PERNADA DE MADRUGADA

Pra não pegar o forte sol da tarde e render na caminhada, resolvi compensar pernando bem antes de amanhecer. Acordei antes das 4 da madru, tomei café e levantei acampamento, com tempo bastante ameno e alguma brisa vinda do norte. O destaque, porém, nao foi o céu limpo e estrelado, e sim a maravilhosa lua cheia q iluminava a paisagem diante de mim; as outrora ondulações de areia douradas agora eram espetacularmente prateadas, de perder a vista!!! Com perfeita visibilidade e visu + q inspirador, comecei a andar, deixando lentamente as lagoas e a faixa de restinga la pra atrás. O belo brilho da lua refletido em laminas de agua dissiparam meu receio de não achar o precioso liquido naquele dia, pois carregava quase 4L de água caso no trajeto td estivesse seco. Joguei fora, permanecendo apenas c/ a garrafa básica de 1,5L q levo permanentemente.

Com os temores se dissipando tal qual pegadas na areia e cada vez + confiante, continuo minha jornada noturna duna adentro, sob belo luar maranhense. Basta tb 1 hora de caminhada no deserto p/ vc pegar o "jeito" menos desgastante e + produtivo de avançar naquele local, q tem sempre a mesma paisagem, não dispõe de trilha e nem sequer referencia visual. Como meu destino naquele dia eram os "oásis" de Baixa Grande ou Queimada dos Britos - distantes quase 30km - teoricamente bastava seguir sentido norte/noroeste, descontada a declinação magnética básica, claro! Qq perdido eu certamente chegaria no mar, q é de onde sempre sopra o vento, e isto pode ser constatado atraves do formato das dunas: a "barriga" levemente inclinada sempre será o norte/nordeste! Assim sendo, bastava subir o alto de uma duna, checar a bússola, e traçar uma linha imaginaria ate norte/noroeste q seria meu destino e pra la seguir. E assim sucessivamente. Mas em função dos obstaculos (lagoas e dunas altas) logicamente q nunca se anda em linha reta: qdo cheias e fundas, as lagoas devem ser contornadas pelo lado menos íngreme da duna; qdo secas as atravessava direto. As dunas, por sua vez, sao firmes, compactas e boas pra caminhar na barriga e no alto, ou seja, do lado q sopra o vento; já do lado íngreme, oposto ao vento, é fofa demais e quase impossível de encarar subir de frente, mas pra descer é uma delicia pois se afunda o pé inteiro, quase ate a canela! Ah, embora o ideal fosse andar descalço ou de papete, eu particularmente caminhei perfeitamente de bota mesmo, afinal terreno firme não faltava e assim se avança bem + rápido, sem receio de pisar algum objeto estranho, principalmente nas lagoas secas, cheias de farpas e toquinhos de madeira. O dose era ter de remover toda vez a areia qdo se desce pela parte íngreme da duna, afim de atravessar direto as lagoas secas sem ter de contorna-la. Assimiladas estas "manhas", foi so colocar pé-na-areia e ir checando a bússola a cada 5/10min, sem desviar muito de minha reta imaginaria.

Caminhar de madrugada é fantástico não so pelo rendimento maior, mas tb pelo visual do manto negro do firmamento repleto de estrelas, algumas delas ofuscadas pela beleza da lua cheia reinante. Mesmo assim, 1 hora de pernada bastou p/ me deixar completamente encharcado de suor. E assim prossigo naquele mesmo ritmo inabalável, ditado apenas pelo terreno q se apresenta aparentemente o mesmo, mas q está em constante mutação. Afinal, as dunas nunca são as mesmas de um dia pra outro; avançam, somem umas, aparecem outras, retrocedem e, conseqüentemente, ditam o formato das lagoas, algumas desaparecem dando origem a outras, ou simplesmente acabam sendo interligadas, umas c/ outras. Carta topográfica aqui não faz sentido.

 

AMANHECENDO

Quase 2hrs depois e no alto de uma duna, faço uma pausa p/ descansar, beliscar alguma coisa e apreciar o sol nascer atrás dos morros alvos à leste. Show de bola! A escuridão lentamente se dissipando, dando lugar a um céu tingindo-se gradativamente de tons escarlates e, conseqüentemente, iluminando àquela paisagem em tons cada vez mais vivos q são reforçados no reflexo das lagoas presentes! Mas o tempo de contemplação não deve se estender, afinal, já já o sol aperta, portanto, pé-na-areia!

Continuando inipterruptamente nesse sobe-desce-duna-contorna-atravessa-lagoa, e agora com iluminação suficiente é possível observar particularidades na paisagem desapercebidas de madrugada. A medida q minha enorme sombra vai se encolhendo, posso observar a textura ondulada das dunas - quase q totalmente simétrica e homogênea - lentamente sendo modificada pelo vento rasteiro, q carrega finos grãos de quartzito constantemente. As vezes o vento sopra + forte em rajadas, fazendo com q a areia "pinique" as canelas e sejam um incomoda, mas a grosso modo o vento se limita a brisas suaves e bem-vindas. Outro detalhe é o silencio generalizado, perturbador até, q só é quebrado pela minha respiração ofegante ou qdo eu amaldiçoava a areia por ter entrado bota adentro..

A luminosidade incipiente tb torna as dunas claras, tendendo ao branco cada vez mais intenso. E contrastando com a superfície é possível ver sinais de vida - não necessariamente selvagem - naquele local aparentemente inóspito. Pegadas de aves ou cavalos, e diminutos dejetos de bode são quase uma constante! E de repente, eis q um rebanho errante deles surge na vastidão de areia, nos remetendo ate a uma cena bíblica qq. Soltos, eles passam o dia comendo o capim das lagoas secas. As lagoas secas, por sinal, são o maior reduto de vida por incrível q pareça. Era la q sempre ouvia alguma ave reclamar diante minha aproximação, principalente a caburé, uma corujinha q faz sua toca no chão. Haviam tb carcarás, maçaricos e quero-queros. E piningas, uma espécie de tartaruguinha, da qual vi apenas o casco rente a algumas outrora lagoas.

Às 9:30, mais um dos vários pit-stops q me reservei por conta do cansaço e do calor, desta vez ao lado de uma belíssima lagoa verde-azulada ao pé de uma enorme e alva duna. A coloração das lagoas - cristalina, azul ou verde - depende exclusivamente do tipo de vegetacao e lodo depositada no fundo. Haviam ate pequenos peixinhos q fugiram qdo mergulhei nela pra me refrescar. Um tchibum + q merecido.

 

SEU OSMAR, CACADOR DE PORCOS PERDIDOS

Prosseguindo a pernada naquele ritmo imutável, lentamente o cansaço vai se fazendo sentir. Vontade de parar a cada 10 min não faltam. O calor é realmente causticante e a areia vai tornando-se cada vez mais abrasiva, mas tenho um objetivo naquele dia. Nessas horas procuro esquecer o cansaço ocupando a mente com outras coisas ou simplesmnete cantando em voz alta, afinal, ninguém ta ali p/ reclamar do desafinado q sou. A constante "mesmice" da paisagem é perturbadoramente bela, porem a presença constante de bodes aqui e acolá torna a pernada menos monótona: dou nome aos bodes q cruzo, particularmente àqueles q seguem na mesma direção minha, apenas p/ fins de distração.

Lá pelas 11hrs, no alto de uma duna e conferindo pela centéssima vez a bússola, ao tracejar meu rumo imaginário naquele horizonte ondulado eis q avisto outro andarilho solitario numa lagoa seca, não muito longe, à leste!!! Não titubiei de ir em seu encontro, pois era minha oportunidade de saber se estava indo na direção certa!! Desviei do meu curso e desci apressadamente - e torpe tb - a duna, atravessei duas lagoas secas e contornei outra cheia q havia no caminho, ate alcançar o outro extremo da lagoa seca na qual vi o andarilho, q tb estava acompanhado de um cão esquálido. Gritei p/ ele p/ q me esperasse e fui ao seu encontro. Era seu Osmar, um tiozinho desdentado de Buriti Grosso - pequena vila quase 20km ao sul - trajado bem simples, roupas em frangalhos, bolsa no ombro com água. Devia ter 60 anos mas aparentava + devido à vida dura. Estava ali desde cedo c/ + 3 colegas espalhados pelo deserto tentando buscar/juntar seus bodes e porcos(!?). Me disse q td mundo solta seus rebanhos (incluindo vacas, jegues e bois) no deserto pra pastarem livremente nas lagoas secas, pq não tem condições de mante-los presos e seus locais de origem. Depois tem a árdua tarefa de ir busca-los, pq senão eles ficam por la mesmo e, diferentemente de cães e gatos, eles não retornam p/ casa. Por incrível q pareça, eles sabem reconhecer qdo um bode pertence a ele e não à outro rebanho, só não me pergunte como. Deve ser a mesma argúcia com q enxergava diferenças entre as dunas, q pra mim são simplesmente iguais. Coisas de gente do deserto. "Mas de vez em qdo tem um caboclo ruim q pega um bode q não é dele e come!", emenda. P/ minha felicidade estou no sentido correto, e a direção q devo prosseguir apontada por ele confere com a marcação minha reta imaginaria!! Uffaaa! Qto à kilometragem q falta ele responde, convicto: "Ta pertinho, apenas 3hrs ate lá!" Esqueci q aqui as distancias não se medem em kms e sim por tempo.. Me despedi de seu Osmar e continuei a jornada.

A tempo passa e a pernada torna-se mais fácil: as dunas são cada vez + baixas, os espaços são cada vez + amplos e as lagoas secas vão se interligando, formando uma espécie de "avenida" em meio àquela vastidão ondulada. E o cansaço pegando..A luminosidade das dunas é intenso, e como não uso óculos escuros, me resigno a caminhar com os olhos encolhidos, franzindo a testa. Como a coloração da areia depende da incidência dos raios, a paisagem é totalmente branca; já ao entardecer as dunas tornam-se douradas. Felizmente, por volta do meio-dia e sol a pino, já consigo avistar a noroeste pontinhos escuros em meio ao areial, q são nada mais o inicio da faixa de restinga arbustiva de Baixa Grande!! Graças a Deus! Embora tenha contato visual, as distancias no deserto enganam e chegar ate la leva ainda um bom tempo! Desgastado pelo sol, caminhando trópegamente c/ areia acumulada nas botas molhadas, dor nas costas e a parte superior das coxa c/ incomodas assaduras fazem com q pare por um bom tempo antes de chegar em meu destino. À beira de mais uma lagoa, tomo mais um refrescante banho e ter um tempo de relax. Uma leve brisa surge p/ amenizar o calor enquanto belisco algo e beberico um suco.

 

NO "OASIS" DE BAIXA GRANDE

Às 13:30, após meia hora de pernada e um breve banho (não tem jeito, o calor pede!), alcanço a beirada do "oásis" de Baixa Gde. Subo uma duna mediana apenas p/ ter uma panorâmica desta "ilha verde" em meio a paisagem monocromática do deserto: uma larga faixa de restinga verdejante contrastando c/ a areia, arbustos medianos de galhos retorcidos, salpicada de pequenas dunas e lagoas de água cristalina, um verdadeiro "oásis"!! Mas pra q lado seguir, sendo q não avistava nenhuma casa ou sinal de civilização? Continuei atravessando o oásis sentido noroeste ate q topei com uma precária estrada de areia q seguia p/ norte, acompanhando td a extensão de vegetação. Se tem estrada deve dar em algum vilarejo, não?

Continuei não mais q 10min pelo caminho ate q cheguei na "vila", q se resumia a umas 5 casas de taipa onde apenas 4 familias vivem ao pé de frondosos coqueiros, uma boa referencia p/ achar o local. Apesar de simples, eram bem organizadas, com uma cerca bem rustica de galhos de cajueiros e mirins, roçado, pomar e ate um jardim! A presença abundante de arvores baixas funciona como cerca viva, impedindo as casas serem engolidas pelas dunas. Mal me aproximei p/ pedir informações e uma simpática senhora, Dna Maria, me convida insistentemente p/ entrar tomar água e descansar. Não recuso, lógico! O interior da choupana, com teto forrado com palhas de buriti, não poderia ser mais simples. Forno a lenha estilo casa-de-farinha, redes espalhadas por todo lado servindo de sofá, e ausência de portas ou janelas, permitindo patos, galinhas, cabritos, gatos e cachorros terem transito livre no interior. Sento na única cadeira disponível apenas p/ me sentir no programa "Roda Viva": o pessoal dos oásis não deve ter visitas regulares q andarilhos como eu despertam-lhe a atencao, tanto é q aos poucos foi surgindo mais e mais gente q se juntava na entrada da casa, principalmente jovens e criancas!! Dna Maria dizia q ela cuidava da família enquanto os homens da casa iam pescar no litoral, quase hora e meia dali, numa espécie de nomadismo sazonal. A pesca é favorável apenas no "inverno"; já na época de secas dedicam-se somente a criação de rebanhos e vivem do q plantam, produtos como macaxeira (uma mandioca + macia),milho, arroz, feijão, etc. Luz elétrica, nem pensar. Lamparinas estão espalhadas por todo canto. E água retiram das inúmeras lagoas ou de simples bombas manuais. Perguntei da "estrada" pela qual viera e Dna Maria diz q ela raramente é usada em janeiro. Na época de secas, o prefeito de Sto Amaro vai ate ali de Toyota deixar produtos encomendados p/ eles passarem o "inverno", pois a estrada tornava-se intransitável na época de chuvas. Ou seja, estavam literalmente isolados do resto do mundo, o q explica em gde parte a curiosidade e extrema hospitalidade c/ estranhos como eu. "E qdo alguém adoece?", perguntei. Pra isso ela tinha toda sorte de receitas q beiravam o curandeirismo natureba, se valendo do q estivesse à mão: sebo de bode, oleo de mamoma, caldo de mucura, etc.. Pros males do outro mundo tem o "sino de salomão", uma figura geométrica desenhada no piso, logo na entrada da casa. No entanto, ao mencionar o prefeito, Dna Maria não perdoa: "Prometeu muita coisa, mas melhorar q é bom, nada.." Pois é, tem coisa q não muda seja onde for.

Depois de tão agradável prosa e dois goles de café irrecusáveis, sinto q já estou descansado o bastante p/ continuar a pernada p/ proximo oásis, distante apenas 5km dali, Queimada dos Brito. Dna Maria ainda insiste p/ q eu pernoitasse ali, e q havia espaço de sobra entre as redes da sala (detalhe: 2 bebês dividiam a mesma rede). Agradecido, recuso sua tentadora oferta, mas tava resoluto a avançar mais naquele dia deveras cansativo.

 

MORRENDO NA PRAIA

Seguindo as instruções de um dos filhos de Dna Maria, as 15:30, cruzo um pequeno riachinho, contorno uma duna e logo estou deixando Baixa Grande. Dali mesmo já consigo avistar meu destino, a noroeste: uns "matinhos" despontando no horizonte. E dou prosseguimento à pernada atravessando varias lagoas secas e cortando caminho subindo/descendo dunas medianas. Apesar do trajeto ser bem mais amplo e fácil q o feito pela manha, o cansaço acumulado se faz sentir e os meros 5kms parecem não terminar nunca! Na metade do trajeto eu já parecia andar mais pro inércia, apenas norteado pela necessidade de chegar nos "matinhos", cada vez + próximos. Neste trecho passo por uma lagoa seca bem bonita, onde arvores secas retorcidas inteiras mais parecem esculturas em meio ao deserto, remanescentes do q já foi um mangue q foi soterrado! Contudo, a esta altura do campeonato pouco tempo dispenso p/ contemplações. Quero chegar logo em meu destino e la comemorar o final de dia, com cerveja, se possível!

Chegando, enfim, proximo dos matinhos eis mais um agradavel obstáculo, o manso e largo Rio Negro, curso dagua q atravessa perpendicularmente todos os Lençóis ate desaguar no mar. Jogo a mochila no chão p/ testar a profundidade (e ter um banho, claro!) e nado ate o outro lado, com água ate o pescoço, felizmente! Atravesso-o novamente - desta vez equilibrando a mochila na cabeça - apenas tendo cuidado em não pisar no lodo escorregadio ou galhos pontiagudos, e finalmente alcanço a outra margem, ao pé de uma enorme duna. Como se a camelação nao tivesse fim, ainda tenho q subir uma duna íngreme p/ alcançar definitivamente meu destino. Não é bem subir e sim escala-la! Não havia outra maneira de avançar, ou se houvesse não vi. Escalar a desgraçada de frente é patético e exaustivo à beça: dá um passo e retrocede dois! O jeito foi subi-la em diagonal, mas mesmo assim alcancei o alto de seus 20m quase me arrastando!

No alto da duna, minha decepção. Kd a "vila" de Queimada dos Britos? Em Baixa Gde me informaram q era bem maior, mas de onde estava só avistava a linda paisagem do "oásis", dunas, lagoas e muita, muita vegetação arbustiva! Uma versão maior do oásis anterior! Sinal da vila, nenhum. Certamente teria q procura-la mas estava no limiar de minhas forças, extremamente cansado, sem condições de buscar a vila alguma. Caminhava desde as 4 da madru e se desse mais um paso era bem provável de aparecer uma tela azul na minha frente acusando minhas pernas de executarem uma operação ilegal e provavelmente travariam.. Dane-se a vila e a cerveja!

Assim sendo, 17hrs decidi acampar aos pés daquela enorme duna, porem do outro lado e ao pé de uma bela lagoa. O céu naquela altura se tingiu de nuvens escuras carregadas e novamente não vi por-do-sol nenhum. Duro foi armar a barraca pq começou a ventar consideravelmente, e duro tb foi remover a areia q entrava a td hora dentro dela. Enquanto preparava meu tradicional miojao, ouço vozes próximas proveniente de dois garotos de bike indo em direção ao rio. Eram de Queimada dos Britos - q distava dali uns 15min, segundo eles - e tavam indo pescar na praia. O som de trovões ao longe faz com q use - pela primeira e única vez na viagem - o sobreteto p/ chuva da barraca. Não tive muito trabalho p/ cair no sono - tambem pudera - e já sonhava com os anjinhos antes mesmo de escurecer totalmente, antes das 19hrs.

 

AGORA SIM, NO OASIS QUEIMADA DOS BRITOS

De madrugada começou a chover inipterruptamente. Felizmente o sobreteto tava bem firme pq chovia com vento forte. Contudo, foi inevitável q começasse a pingar aqui ou acolá no interior da barraca. Porem, meu cansaço e sono eram indiferentes a este detalhe, e so percebi isso ao acordar umido na manha seguinte, as 6:00hr. As paredes estavam totalmente úmidas e havia pequeninas poças com areia dentro. Chovia la fora e fiquei aguardando parar p/ poder começar a pernar naquele dia, enquanto aproveitei p/ tomar café e dar uma limpada no interior.

Um tempão depois e, ao ver q a chuva parecia não dar trégua, resolvi levantar acampamento à contragosto, já q iria carregar o dobro do peso naquele dia: eu q me preocupava em comer td q levava a fim de aliviar peso, levaria desta vez a barraca molhada e muita areia a tiracolo. Ao desmontar minha tenda, fiquei surpreso com a lagoa do meu lado, q aumentara consideravelmente de volume quase alcançando minha barraca! O mesmo pras lagoas nos arredores! Incrível como a chuva e os ventos transformam subitamente a paisagem aqui!

Com a chuva fustigando meu rosto, percorro paralelamente as dunas rente ao rio, contornando as matacoes e dunas mais altas, seguindo o sentido indicado pelos jovens, o dia anterior. Mas ao subir uma duna p/ ter uma panorâmica, apenas avisto um maravilhoso e enorme tapete verdejante de arbustos/arvores baixas salpicado de lindas lagoas azuis. Nem sinal da vila, portanto teria q me enfiar ali e procurar. Mas q direção? Pra complicar, minha bússola tava molhada e não funcionava. O jeito foi seguir intuitivamente pelas dunas enormes paralelas ao oásis, e depois de subir/descer algumas consegui entrar no mesmo por uma brecha entre no emaranhado de arbustos, sem cair em alguma lagoa funda.

Ali, consegui avistar muitas trilhas se entrecruzando sentido oásis adentro. Totalmente perdido, decidi seguir as trilhas q seguiam pro oeste, pois algumas levavam apenas à lagoas maiores. O bom daqui é q ta repleto de cajueiros e miris e o chão forrado dos mesmos complementou meu mirrado café da manha. A esta altura a chuva cessara, mas isso não impediu q tivesse q atravessar laminas de água ate as canelas e muitos campos encharcados. Cada vez + no interior do oásis, noto q algumas trilhas agora tornam-se mais largas e me guio por elas. Ironicamente, é mais difícil se orientar dentro dos oásis q no deserto. Subo uma duna maior p/ ter uma geral dali, e finalmente avisto ao longe um telhado vermelho, do lado de uns coqueiros, e é pra la q me dirijo em linha reta, contornando as matas e bordejando as lagoas do trajeto.

Ao alcançar a casa - as 8hrs e com a chuva retornando - um senhor me convida sem ceremonia p/ entrar. Tal qual Dna Maria, Seu Jose Domingues é extremamente cordial e hospitaleiro c/ forasteiros. Ele é pai dos 2 jovens q vira o dia anterior e me oferece café e bolachas. Em seguida, me brinda c/ uma tigela c/ camarões frescos enquanto me conta da vida dali, não muito diferente de Baixa Grande, c/ a diferença q em Queimada dos Brito mora + gente nas 25 casas espalhadas pelo oásis, e q ele é o único q tem eletricidade esporadicamente, vinda de um precário gerador. Tb tem suas queixas c/ o prefeito: "Prometeu trazer eletricidade, mas agora vem com a desculpa de q os postes podem ser engolidos pelas dunas!" O isolamento e as agruras do deserto tb são responsáveis pela união e pela solidariedade entre todos os moradores dali, e onde resistem como uma gde família. E de fato o são, uma vez q todos tem algum grau de parentesco. Contou q certa vez alguém adoeceu gravemente, colocaram a pessoa numa rede pendurada num pau, e em comitiva de parentes atravessaram o deserto ate Sto Amaro (6hrs dali), se reverzando qdo alguém cansava!! Seu Domingos foi muito gentil comigo, tanto é q deixei c/ ele mantimentos q tinha de sobra. "O que é isto? Como é q come?", perguntou qdo entreguei um pacote de miojo, sinal de q seu único horizonte eram as areias. Dele e de muita gente, pois haviam jovens q nunca saíram dali. O papo tava ótimo, Seu Domingues me deu ate um gole de "xoxota": um mix de cachaça, suco de morango, leite de coco, leite condensado, gengibre e açúcar. E eu q achava q o Guaraná Jesus era a bebida mais doce q teria ali. Antes de me entusiasmar e beber +, me despedi dele logo qdo q a chuva novamente passou.

 

SEM BUSSOLA E AGORA?

Seguindo as instruções dos filhos de Seu Domingues, cortei caminho pelas "morrarias" ou "serras" - como eles chamam as dunas - paralelas ao oásis p/ novamente entrar e estar em trilhas no meio do oásis. Atravessando arbustos e arvores baixas molhadas, alcanço a Queimada dos Lira e, logo a seguir, a Queimada dos Paulo, onde haviam mais casinhas simples c/ gente nos roçados. Todo mundo, sem exceção, pára p/ me ver. Coleto infos e prossigo, bem na hora em q a chuva torna a cair. Ao chegar nos limites do oásis e o deserto, procuro as marcas de trilha q deveria seguir (pois minha bússola ta pifada) e nada. Claro, a chuva havia apagado! E agora? Sem trilha e bússola?

Matutando em como sairia dali, volto pras casas de Queimada dos Paulo, onde espero a chuva passar. Pensei em ate contratar um dos locais p/ me acompanhar o resto da trip mas ai seria morrrer na praia. Esperança de carona era zero, pois realmente as chuvas detonavam as já precárias estradinhas ate pra possantes Toyota, e nem havia uma sequer ali, de acordo com os locais. Pra minha felicidade, um dos locais tinha q ir buscar uns bodes na direção de Sto Amaro, meu destino. Beleza, vou com ele e dali continuo sozinho o resto! E assim fizemos qdo a chuva parou, la pelas 11hrs!

 

A PERNADA FINAL

Eu e Neto passamos pelas ultimas casas de Queimada - na única estradinha de areia q tem - ate alcançar os limites do oásis com o deserto. Ate la tivemos q atravessar c/ água ate os joelhos muitas lagoas q simplesmente transbordaram no caminho. Neto colhia frutos nos arbustos como o jabiru e o mirim p/ eu provar, e olha q eram ate gostosos. Chato era um mosquitinho parecido com borrachudo, o marium.

Finalmente no deserto, começamos o já habitual sobe/desce/atravessa/contorna/lagoa. Por estar nublado naquele horario, a pernada estava tolerável e ate agradável. O q me incomodava em Neto foi somente a enorme peixeira q levava junto. "Pra que?", pensei, e imaginei q o cara ia me matar, roubar e me largar no meio do nada. Ele disse q podia ter "caboclo ruim" no deserto (!?) Ainda assim, não tirei os olhos daquela peixeira e deixei ele ir sempre na minha frente. Receios de gente de cidade grande.

Sempre sentido oeste/sudoeste e em ritmo firme e forte, paramos apenas uma vez p/ descansar e beliscar algo. O destaque deste trecho são as varias sondas desativadas da Petrobrás espalhadas pelas dunas, e uma pequena cobra q Neto quase pisou ao atravesarmos o pasto numa lagoa seca. De resto, a beleza das dunas e suas laminas de água reluzindo naquela tarde de nebulosidade clara valiam o preço daquela dura pernada. Por conta das chuvas, as lagoas aqui eram maiores e espaçadas, e as dunas eram mais fáceis de caminhar. Ainda bem.

Às 13:30 nos separamos; Neto seguiu p/ sul atrás de uns bodes ao longe mas não sem antes apontar a direção q eu devia seguir, sem desviar pra nenhum lado. E foi o q fiz, atravessando o deserto p/ oeste, já meio cansado e sentindo as assaduras novamente. Felizmente, minha bússola havia secado e voltava a operar normalmente. Estava no sentido correto. Meia hora depois, do alto de uma duna, meu corpo doído se encheu de alegria ao conseguir avistar no horizonte os matinhos q limitam o povoado de Santo Amaro. Agora havia apenas q chegar lá, o q me tomou quase 2 interminaveis horas! Ai resolvi seguir em linha reta mesmo, sem desviar de lagoa alguma. Subia e descia duna, e cortava pelas lagoas, secas ou não. As q estavam cheias felizmente naquele trecho eram bem rasinhas, mas como meu pé já tava detonado pelo atrito da areia c/ a bota molhada, a água ate veio em boa hora.

Cada vez + proximo dos matos q me guiavam, as lagoas q se interpunham no trajeto eram maiores e largas. Como não as contornava e sim as atravessava direto, apenas tomava a precaucao de não serem fundas avaliando a distancia ate a outra margem. Felizmente a mais funda chegou apenas quase ate a cintura. Foi ali, já quase no areial perto dos matos, q avistei sinais de trilhas deixadas por veículos e de bicicletas!! Ótimo, bastava segui-los. Varei a ultima lagoa, sob o protesto de varios carcarás, e coloquei pé na areia firme do q teoricamente era o limite de Santo Amaro. Arvores baixas, palmeiras, dunas, lagoas, etc.. o local é bonito, mas esta totalmente repleto de dejetos de bode forrando a areia.

Adentrando em terreno + amplo e plano, com mato aqui e acolá - sempre seguindo as marcas de veículos - contorno lagoas e algumas dunas forradas de arbustos ate chegar numa extensa planície de pasto encharcado. A trilha continua sentido oeste, passando a bordejar por um bom tempo uma enorme lagoa q se apresenta à direita, a Lagoa de Sto Amaro. Meia hora depois, e ladeado à minha esquerda por um extenso carnaubal, avisto pescadores retornando de mais um dia duro de batente, com os quais apenas tenho a confirmação q to no sentido correto e q não falta muito p/ chegar à vila. Extremamente exausto e não vendo a hora de tirar o peso das costas, o silencio da pernada é quebrado pelo alto som de forró aumentando atrás de mim. Uma Toyota repleta de pescadores locais vem pelo mesmo caminho q percorro e me oferece carona. Não recuso, claro, e os 5km restantes são feitos num divertido sacolejo, entre isopores cheios de gelo, tainha e pescada frescas, e embalados ao som do "Garoto Safado & Lagosta Bronzeada". Cheguei ao meu destino exatas 16:30.

 

SANTO AMARO DO MARANHAO

Santo Amaro do Maranhão é uma vila cercada de palmeiras. Simples, dispõe de alguma infra, porem é bem menor q Barreirinhas. Ficou famosa recentemente pelo filme "A Casa de Areia" (c/ Fernanda Montenegro), q trouxe eletricidade ate ali. Mas mesmo assim mantem um charme e rusticidade; as ruas de areia do entorno contrastam com o pavimento existente apenas na "rua" principal, cercada de igrejinha, vendinhas, etc. O motorista da Toyota conhecia uma pousadinha barata e me deixou bem na frente. Não era só pousada, era "Restaurante & Hospedaria Fé em Deus", onde pechinchei meu pernoite por R$15. Devidamente instalado, tomei um banho demorado, tratei das malditas assaduras, comi uma suculenta galinha caipira e comemorei a empreitada com 3 cervejas, p/ somente depois atentar p/ preço caríssimo delas!

Ao anoitecer, dei uma voltinha pela vila afim de conseguir transporte p/ São Luiz. Lógico q ali não tem rodoviária, mas tem uma pequena agencia da Cisne Branco, empresa de bus do Maranhão, q ia ate a capital em 2 horarios: pela manha e tarde. Depois fiquei zanzando pela pacata vila, q se conehce em menos de 20min. Destaque p/ sem-numero de moscas e sapos q circulam livremente pelas ruas, alem de um curioso "trator-bus", meio de trasnporte coletivo q consiste num trator c/ reboque c/ assentos. Engraçado era ver os jovens motoristas fazendo pose - qdo estavam sem passageiros - tal qual a playboyzada na cidade gde, só q com um baita tratorzao. Hilário!

O cansaço e o sono me pegaram antes das 20hrs. No quarto, não bastasse o calor sufocante ainda haviam os pernilongos, q pela qtdade industrial q eles estavam presentes no recinto mais parecia praga egípcia. Felizmente, o "hotel" dispunha de ventilador e mosqueteiro, senão uma boa noite de sono seria impossível. Pior q td isso, era um forrozao rolando em alto som quase do lado.

 

CAMELANDO NA VOLTA

A Toyota me pegou na pousada por volta das 5:30 da matina já de péssimo humor. Queria tomar banho antes de viajar mas as torneiras estavam sequinhas, e falei um monte p/ cara da pousada. Tentei me animar com a perspectiva de ainda achar bus p/ SP ainda naquele dia e assim foi. O "pau-de-arara" estava vazio na caçamba e foi la q sentei, pois a cabine tava lotada. Assim, deixamos Sto Amaro por uma sinuosa e precária estrada de areia, q atravessava ora matas fechadas de restinga alta ora pequenas lagoas com água acima das rodas!! Aventura mesmo! Bem q tentei cochilar mas o sacolejo, a trepidacao e os constantes "chicotes" dos galhos úmidos no meu braço impediam qq tentativa de descansar. O jeito foi apreciar a alvorada dando cores àquela paisagem selvagem e agreste.

Às 7:30 e 35km depois alcançamos o rijo asfalto (MA-402), num ponto de apoio chamado Matoes, onde se fazia conexão ate São Luiz. Tomei um rapido café c/ tapioca p/ pegar o bus logo a seguir, onde desta vez consegui dormir ate chegar na rodô da capital maranhense, exatas 11hrs!!

Por sorte havia poucas vagas no busao p/ SP, as 14hrs. Infelizmente, revirando tds meus bolsos possíveis vejo q não disponho grana suficiente p/ passagem, faltando apenas R$20 p/ completar a dita cuja. O cx eletrônico dali não funcionava e se fosse p/ cidade sacar grana perderia tempo em condução, na busca de banco, etc. Não queria perder esse busao e + uma noite em São Luiz tava fora de cogitação, e agora? Pepinos extremos requerem medidas extremas, e já q durante a viagem me confundiram com riponga vendendo artesanias resolvi fazer jus à alcunha. Peguei as camisetas e souvenires q havia comprado p/ trazer de lembrança p/ família e passei a anuncia-los do lado de um vendedor de pitombas. Achei q minha breve profissão não renderia muito principalmente pela discrição q tinha em vender meus "produtos", mas não é a gringaiada na rodoviária não se interessou?? Não deu nem meia hora e já tinha vendido td, com lucro até. Preciso repensar minha carreira. Assim q garanti minha passagem, tive tempo de fazer uma boquinha e ate de secar a barraca e as botas. Tomei o busao e, após 2dias e meio de cansativa trip - com longas paradas em Teresina, Petrolina, Feira de Santana, Vitória e Niterói - cheguei finalmente na Terra da Garoa.

 

Recapitulando, os Lençóis Maranhenses recebem esse nome justo pela similaridade q suas dunas guardam com as dobras de um lençol estendido na cama. Injusto, porém, é enquadrá-lo na simplista definição de deserto, uma vez q sazonalmente ele se transforma por completo proporcionando miragens de rara beleza q se tornam tangíveis na forma de oásis verdejantes, lagoas cristalinas, muita vida, habitantes gentis esporadicamente nômades e donos de uma cultura peculiar. Ao contrario dos demais desertos, locais efêmeros e sem memória, os Lençóis são igualmente locais mutantes ao sabor dos ventos, porem de uma dimensão exótica q fica + evidente qdo se cruza este nosso deserto-tupiniquim tal qual seus moradores, ou seja, a pé.

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Postado pelo usuário wrich

em 02/02/2006 13:01:05

Mensagem:

Nossa!!!

Que viagem, hein!?

 

Farei algo assim, quando estiver de férias, pode ter certeza.

 

O dom de expressar-te é impresionante.

 

Abraço, migo mochileiro

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Jorge Soto

em 04/02/2006 09:53:23

Mensagem:

valeu, writch! Quero complementar q seu relato de trip Jeri/Camocim tb foi bem legal. E quero tb adendar q tb a fiz...a pé, pra variar. Já já posto meu relato.

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Mantiqueira

em 04/02/2006 13:20:08

Mensagem:

Parabéns Jorge!

 

Fantástica jornada, ein?

 

Eu e um amigo estamos planejando cruzar os Lençóis a partir de Paulino Neves, nos Pequenos Lençóis, até Engodo, no extremo oeste.

 

Tínhamos dúvidas quanto ao fato da água das lagoas ser potável ou não, o melhor calçado, rendimento (km/dia) etc... e lendo seu relato acabei por afastar todas as dúvidas. Aliás, a melhor das dicas é quanto à desnecessidade de se levar um saco de dormir; o que faz muita diferença.

 

Apenas para confirmar:

 

1-a água das lagoas não te fez mal?

2-vc filtrou a água ou a consumiu sem filtrar?

3-vc relata q não estava usando óculos de sol; existe algum motivo em especial ou simplesmente esqueceu de levar?

 

Reitero meus parabéns, principalmente pela bravura de viajar sozinho, já fiz muito disso e compreendo razoavelmente bem as dificuldades de tal opção.

 

Abraços mochileiros,

 

Mantiqueira

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário rodrigoschemes

em 04/02/2006 13:49:49

Mensagem:

Sobre isso..

1-a água das lagoas não te fez mal?

2-vc filtrou a água ou a consumiu sem filtrar?

 

O Jorge tem uma garrafinha plástica q ele usa como cantil que tá verde de tanto mofo que juntou na boca da garrafa e vc vem perguntar se a agua da lagoa vai fazer mal pra ele?? hahahah

 

Zuera... parabens pela trip, confesso q nao tive tempo de ler o relato ainda, mas farei-o

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Mantiqueira

em 04/02/2006 14:11:43

Mensagem:

 

Originally posted by rodrigoschemes

 

 

O Jorge tem uma garrafinha plástica q ele usa como cantil que tá verde de tanto mofo que juntou na boca da garrafa e vc vem perguntar se a agua da lagoa vai fazer mal pra ele?? hahahah

 

 

 

Então acho q aconteceu o contrário: é capaz dele ter feito mal para os peixes das lagoas, he he...

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Jorge Soto

em 06/02/2006 17:18:25

Mensagem:

vc e foda hein, Rodrigao.... zuera tb... ja ja te respondo Mantiqueira..hj to na correria..demoro, mas retorno, sempre!

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário samuel_adv

em 06/02/2006 17:59:39

Mensagem:

Caramba, fiquei exausto só de ler o relato, imagina caminhar isso tudo!!! Muito legal sua pernada (ou camelada, como vc mesmo disse!)

 

Acho que vai tirar o Jalapão de letra, vai fundo! :-)

 

E as fotos dessas trips todas, onde a gente vê???

 

[]'s

Editado por Visitante
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Valeu ai, Mantiqueira!

Cara, eu pasei por Paulino Neves, Pequenos Lencois, etc e nao achei td aquilo nao. Este ultimo tb é pequeno mesmo. Nao passa de um trecho de dunas bem estreito, entre ampla restinga e praia, isto é, vc sempre tem uma referencia de navegacao e é meio sacal. A praia é bem feinha, diga-se de passagem.

Já estar no meio dos Grandes Lencois é vc nao ter referencia alguma, olhar ao redor e ver a mesma paisagem monocromatica!! Coisa de louco!

Meu, esquece saco de dormir!!! À noite é bem quente - no ano todo! - e o isolante ja basta! O saco de dormir apenas ocupou um espaço desnecessario na mochila. Calçado vc q vê: papete, chinelo, bota ou descalço mesmo, tanto faz! Eu ouvia q papete era melhor, mas me dei bem de bota... vc decide na hora!

Qto suas perguntas:

1-as aguas das lagoas sao um misto de agua de chuvas e de lencois freáticos, teoricamente potáveis. Sao cristalinas, c/ algumas algas, peixinhos, girinos, etc..mas eu mandei ver assim mesmo! Nao fez mal nao! Agora se vc tem algum receio/frescura, coloca algum purificador (hidrosteryl, cloro, etc) nela, mas eu nao vi problema algum! O pessoal de lá bebe numa boa..

2-filtrei p.. nenhuma! Qdo me banhava nas lagoas, bebia na hora mesmo! Tô vivo ate hoje!

3-qto uso ou nao de oculos escuros, isso nao é tao relevante. Só q ao meio-dia e se estiver ceu limpo, as dunas ficam tao claras (branquinha, branquinha!) pelo sol q chegam a ofuscar a vista. Mas nada q vc nao enxergue nada, mas um oculos escuro ajuda nesse horario. Eu esqueci mesmo de levar...

Bem,qq coisa ou duvida a respeito tamos ai..

Abracao,

Jorge

 

Entao, Mantiqueira!

Pior q eu tb tava na pilha de pernar pelos Pequenos Lencois, mas qdo vi q nao eram lá aquela coisa desencanei e fui direto até Caburé.

Cara, p/ pernar ate Engodo pode acrescentar + 2 exaustivos dias, é longe à beça. E pode apostar q lá nao encontrará transporte facil p/

"civilizacao", justamente pela distancia e isolamento. Sto Amaro é realmente o point da infra, e mesmo assim achei quase uma vila de tao

pequena. Engodo nao faz parte do setor turistico portanto nao espere achar bugues ou caminhonete facil. Quiçá um jegue ou cavalo c/ locais, q vivem de roçado e da pesca. Tem mapa da regiao? Se quiser te mando por email!

Agua doce é o q mais tem nas lagoas, nao encana. E potável, q é melhor. Tb se nao fosse eu bebia do mesmo jeito...comigo nao tem tempo ruim. Meu estomago é de avestruz..

Qto Jalapao, realmetne tô na pilha de faze-lo a pé. Contudo, ando estudando se existe a real possibilidade p/ tal, tendo em consideracao as enormes distancias. Vc q ja foi poderia me dar maiores infos do local, principalmnte logisticas?

Valeu ai,

Jorge

PS: Ô, Samuel! Foto ate tem tb, se quiser te mando por email. Mas adendo q nao sou fotografo e q nao ficaram lá essas coisas.

 

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Mantiqueira

em 07/02/2006 10:15:42

Mensagem:

Valeu Jorge!

 

Muito útil a sua informação quanto aos Pequenos Lençóis... não sabia disso não...

 

A água de lá sempre foi a minha maior dúvida; eu sempre pensei que a água era salgada, de modo que já me imaginava puxando um jeguinho cheio d'água doce pra poder fazer a travessia... mas com os seus esclarecimentos fico mais tranqüilo.

 

Mudando de assunto, vi comentários de q vc vai fazer o Jalapão; pergunta: vc pretende fazê-lo à pé?

 

Eu já fui, mas de jipe...

 

Grande abraço e muito obrigado pelos esclarecimentos.

 

Mantiqueira

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  • Membros de Honra

Postado pelo usuário Jorge Soto

em 08/02/2006 08:25:11

Mensagem:

Entao, Mantiqueira!

Pior q eu tb tava na pilha de pernar pelos Pequenos Lencois, mas qdo vi q nao eram lá aquela coisa desencanei e fui direto até Caburé.

Cara, p/ pernar ate Engodo pode acrescentar + 2 exaustivos dias, é longe à beça. E pode apostar q lá nao encontrará transporte facil p/

"civilizacao", justamente pela distancia e isolamento. Sto Amaro é realmente o point da infra, e mesmo assim achei quase uma vila de tao

pequena. Engodo nao faz parte do setor turistico portanto nao espere achar bugues ou caminhonete facil. Quiçá um jegue ou cavalo c/ locais, q vivem de roçado e da pesca. Tem mapa da regiao? Se quiser te mando por email!

Agua doce é o q mais tem nas lagoas, nao encana. E potável, q é melhor. Tb se nao fosse eu bebia do mesmo jeito...comigo nao tem tempo ruim. Meu estomago é de avestruz..

Qto Jalapao, realmetne tô na pilha de faze-lo a pé. Contudo, ando estudando se existe a real possibilidade p/ tal, tendo em consideracao as enormes distancias. Vc q ja foi poderia me dar maiores infos do local, principalmnte logisticas?

Valeu ai,

Jorge

PS: Ô, Samuel! Foto ate tem tb, se quiser te mando por email. Mas adendo q nao sou fotografo e q nao ficaram lá essas coisas.

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Mantiqueira

em 08/02/2006 10:46:26

Mensagem:

Tem mapa da regiao? Se quiser te mando por email!

 

Legal, Jorge. Ficaria muito grato.

 

Qto Jalapao, realmetne tô na pilha de faze-lo a pé. Contudo, ando estudando se existe a real possibilidade p/ tal, tendo em consideracao as enormes distancias. Vc q ja foi poderia me dar maiores infos do local, principalmnte logisticas?

 

Meu velho, já deu pra ver que vc é osso duro, mas jalapão é brincadeira séria... (falei isso pra te motivar, he he).

 

As distâncias são enormes... eu tava de jipe e ainda assim ficava horas e horas contemplando a mesma paisagem, que às vezes chegava a ser monótona.

 

Ademais, são principalmente 4 os pontos de interesse (cachoeira da velha, fervedouro, dunas e cachoeira da formiga) e enormes (não me recordo da quilometragem exata) distâncias entre um e outro.

 

Assim é o Jalapão: deserto, pouco habitado, quente e selvagem.

 

Dê uma olhada aqui:

 

http://www.viagensmaneiras.com/viagens/jalapao.htm

 

Se um dia eu fosse fazê-lo à pé seria assim: carregando apenas uma mochila de ataque e puxando um jeguinho (com muita água e o restante da tralha).

 

Preciso dar uma olhada nas minhas anotações para ver se encontro números mais exatos, e assim q for possível eu te informo.

 

Grande abraço,

 

Mantiqueira

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Jorge Soto

em 08/02/2006 11:22:19

Mensagem:

cara, vc so esqueceu de me passar teu mail pra te madar a carta da regiao! Se bem q mapa é desnecessario pq a topografia sempre muda (dunas), mas apenas pra ter uma ideia do trajeto.

 

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Mantiqueira

em 08/02/2006 11:24:51

Mensagem:

 

Originally posted by Jorge Soto

 

cara, vc so esqueceu de me passar teu mail pra te madar a carta da regiao! Se bem q mapa é desnecessario pq a topografia sempre muda (dunas), mas apenas pra ter uma ideia do trajeto.

 

 

Putz... agora dei uma de mané...

 

Eis: arqueiro5420@yahoo.com.br

 

Valeu pela atenção.

 

Abs mochileiros,

 

Mantiqueira

 

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário oteb

em 15/02/2006 20:42:10

Mensagem:

Aí Jorge, muito maneira essa sua empreitada! Até me motivou a fazer também.

Abraço

 

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário pedrodeportugal

em 17/02/2006 16:36:35

Mensagem:

esta viagem foi uma grande aventura. li-a de uma só vez, pois os lençois são um sonho já com algum tempo.

 

pena que nao tenha feito algo como o Jorge enquanto era solteiro. agora casado, como a mulher não é muito fã deste tipo de aventura, acho que vou ter de tentar fazer uma viagem hibrida, ou seja, um misto de mochileiro e farofeiro!!

 

venha o próximo!! vou guardá-los para mais tarde servirem de referencia.

 

tenho um de uma viagem a pé até Prado. o relato tb é teu Jorge? ou será que estou a fazer confusão com outro Jorge??

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário Jorge Soto

em 18/02/2006 20:40:41

Mensagem:

Grde Pedrao, seu sumido... a viagem ate Prado é tb minha...

E aguarde mais...

PS: espero q estar casado naos eja empecilho,pra aventuras; pelo contrario, isso é estimulo.

 

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário pedrodeportugal

em 19/02/2006 14:17:23

Mensagem:

Fala Jorge!!!! Estar casado não é empecilho, mas não posso fazer coisas tão radicais assim... tenho de ir com calma!!! irei fazer várias viagens se Deus quiser, mas acredito que nao serão do género dessas tuas! a minha mulher tem mais juízo que eu e então não vai deixar que eu faça nenhuma loucura!!!

 

Fico no aguardo de outros relatos.

 

 

 

 

 

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Postado pelo usuário bruna.brunilda

em 23/02/2006 15:00:53

Mensagem:

um máximo sua viagem! vc sabe se ir no começo de setembro, as primeiras duas semanas é desanconselhável?

vc poderia me mandar o mapa e as fotos?

Obrigada, Bruna

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  • 1 mês depois...
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Eu e minha namorada fizemos a travessia dos lençois a pé de Atins até Santo Amaro, fizemos em setembro deste ano, foi otimo!!!!! as lagoas são o maximo e a lua cheia parecia um sol a noite, seguimos por dentro das dunas e chegamos a Qeuimada dos Lira, Queimada dos Britos, Queimada dos Paulos e de lá até Santo Amaro.

 

Tenho o arquivo GPS completo desta nossa travessia, se alguem quiser é só pedir que eu mando por e-mail

 

Abraços,

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São Luis, 8 de outubro de 2010

Preparativos e motivação

 

A idéia inicial era fazer um acampamento com uma galera em vassouras ou caburé durante os dias 9 a 12 de outubro. Para isso convidei varias pessoas e consultei o Forum de discussão do mochileiros.com. Foi ai que despertou a vontade de fazer trekking, inspirado principalmente pelo post de Jorge Soto (lencois-maranhenses-a-pe-t22253.html). Depois que todos confirmaram negativamente, excesso meu parceiro e chará, Tássio Barney, decidi cruzar os lençóis maranhenses entre Atins e Santo Amaro a pé.

Tivemos uma semana para levantar todo o equipamento necessário, o que não era muito e devia ser cuidadosamente escolhido para levar a menor quantidade de peso possível, mas sem deixar pra trás os utensílios essenciais: o mochilão (dispensável, não fosse pela preferência de levar barraca e o saco de dormir, pois somente uma rede fina e leve de paraquedas servia); dois conjuntos de roupa, incluindo do corpo e uma camisa de laicra com filtro UV; uma canga feminina que serve de lençol, toalha e ainda de proteção contra possíveis tempestades de areia; um chapéu com protetor de nuca; óculos escuro; uma sandália de dedo, tipo havaiana; protetor solar e repelente contra insetos; uma lanterna; câmera fotográfica; uns comprimidos de emergência para dor e inflamações; escova de dente e pasta de dentre; papel e caneta para registro; um cantil de água com capacidade de 2l, mais duas garrafas pets de 1l em cada bolso lateral da mochila; e suprimentos para até 3 dias (toddy ou Nescau em caixa; biscoito club social; chocolate em barra; barras de cereais; amendoim; miojo e sopão);

 

Sábado, 9 de outubro de 2010

São Luis / Barreirinhas / Atins

 

No dia imediatamente anterior a viagem, tive de trabalhar até as 2h da madrugada para deixar tudo em dia até meu retorno. Visitei algumas lojas de camping em São Luis para comprar o equipamento listado acima e arrumei o mochilão minutos antes do taxi passar às 4h da madru. Junto com outras duas pessoas com destino comum até Barreirinhas, fechamos um taxi de uma cooperativa por R$35 / pessoa. Foi uma mão na roda! Chegamos em Barreirinhas as 7h30, a tempo de dar uma volta pela cidade, visitar o comercio e tomar uma vitamina numa cantina enquanto aguardava o horário de saída da embarcação de linha até Atins, as 10h. No cais situado a frente da av. beira rio, estão varias lanchas e voadeiras para passeios com turistas ao longo do rio preguiças pelo preço de R$30 em média. Pagamos R$10 na lotação de passageiros que sem pressa nos levou até nosso primeiro destino, passando antes por Vassouras, Caburé e Mandacarú. No barco, conhecemos uns coroas de meia idade que viajavam sempre para Atins com sua família e um casal de franceses que buscava explorar as belezas dos lençóis maranhenses.

Desembarcamos as 14h em Atins e, depois de consultar preço em duas pousadas, optamos pela pousada do Pedro Bruno e Dona Maria por R$10 / pessoa, quarto com banheiro externo e sem café da manhã. Almoçamos por lá também, mais uma vez a opção mais barata. Refeição para 1 pessoa, bem servida de peixe ou camarão por R$15. No final da tarde fomos até a praia do vilarejo, pois é banhado tanto pelo rio preguiças de um lado, quanto pelo mar de outro. Na volta para a pousada encontramos com o guia local, Benedito, para conversar sobre trajeto e fazer nosso plano de viagem. Como já era de se esperar, as luzes da cidade se apagaram por volta das 19h e pudemos observar a imensidão do universo da rede na varanda do chalé. As 20h já havíamos pegado no sono.

 

Domingo, 10 de outubro de 2010

Atins / Canto do Atins / Baixa Grande

 

As 3h da manhã, o guia bate à porta do quarto, anunciando o inicio de nossa caminhada. Com o pé no chão e mochila nas costas, deixamos o “conforto” da pousada de Dona Maria e Seu Pedro Bruno para nos lançar em meio as dunas e lagoas. Em uma mão segurávamos a lanterna e em outra as sandálias que iam para o chão somente como o terreno era mais duro ou era coberto por alguma vegetação rasteira. O guia ia à frente indicando a direção entre arbustos do cerrado em direção a Canto do Atins. As 4h da madru era possível ver todas as estrelas que não suspeitamos que existe entre as luzes da cidade e ainda o gasume (áurea de luzes em torno dos centros urbanos) da cidade de Barreirinhas e São Luis. Seguimos no sentido noroeste até chegar em Canto do Atins, onde fica a famosa pousada da Dona Rita, conhecida por seus generosos e deliciosos camarões que não pudemos experimentar, dado que chegamos às 5h da manhã no local.

Tomamos nosso café da manhã (toddy, club social e barra de cereais) ao alvorecer na paisagem praiana. Seguimos viagem pela beira da praia o máximo que podíamos para evitar (ainda) o sobe e desce das dunas. Seguindo pela orla marítima, todo tempo a oeste, alcançamos um baú de ferro encalhado na areia que media aproximadamente 1 metro de comprimento e ½ metro de altura. Este é o ponto de referencia onde deixamos a facilidade do terreno firme da praia para o arenoso das dunas. Por volta das 10h, paramos em baixo de uma choupana de pescadores para fazer uma boca. Comemos amendoim e chocolate, com água. Já fora 2l de água das garrafas pet’s. Restavam ainda 2l para cada do cantil. A partir de então, tomamos a direção sudoeste rumo ao Oasis de Baixa Grande.

As lagoas desse trecho estavam completamente secas, o sol já começava a esquentar e a perder de vista o litoral. De cima das dunas podíamos observar a imensidão do lugar com suas “ilhas” de areia e os contornos que dão nome aos “lençóis”. Já podíamos dizer que atravessávamos um deserto, pois já não se ouvia nada além dos ventos, não se via nada alem de dunas e não contávamos com a presença de outros seres, a não ser as gaivotas que sobrevoavam por ali e os poucos vegetais que resistiam as secas no vale onde se formam as lagoas no período de cheia. Perto de meio dia, avistamos ao longe o Oasis que buscávamos. Esqueça toda a noção hollywoodiana que lhe venderam sobre oásis. Este aqui não havia coqueiros e água, mas cajueiros, carnaúbas, porcos, cabras e galinhas. Ao contrario do que esperei, o clima não era mais ameno, antes mais quente, acredito porque a vegetação bloqueava o vento úmido do litoral. Meu parceiro já estava cansado, que segundo ele mesmo era um cansaço psicológico. Engraçado dizer isso depois de 9 de caminhada e não alegar o aspecto físico. As 12h30 chegamos na casa de Dona Beth, que já parecia acostumada com o transito de aventureiros pelo lugar. Tinha até um barraco construído somente para abrigá-los no meio da jornada. Tomamos um banho num pequeno córrego que ficava nos fundos da casa. Não pudemos nos demorar muito porque as piabas beliscavam o corpo quando cessávamos o movimento, como quem não quer nos deixar relaxar. Difícil tarefa também debaixo de tamanho sol. Tiramos uma soneca nas redes armadas dentro do barraco enquanto D. Beth preparava o almoço para a gente. Podiamos escolher entre uma galinha caipira no valor de R$50 ou uma humilde refeição com arroz, feijão, macarrão e ovo frito por R$15. O valor é alto devido a dificuldade de transporte até a região. Para conseguir suprimentos, D. Beth tem que caminhar 3h até Queimada dos Britos, comprar o necessário e retornar mais 3h de caminhada. Finalmente o almoço delicioso, temperado com a fome da longa caminhada ao molho de cansaço. Pena que não pudemos contar com uma bebida gelada, porque não compensava economicamente ligar o gerador para vender apenas duas latas de refrigerante. Então, enchemos nosso cantil com água do poço mesmo. A água tinha gosto, mas não parecia de todo ruim. Acho até que boa demais para as condições. Nada que um vermífugo não resolva quando voltar pra casa. Tiramos mais um cochilo depois do almoço à ladainha do guia para pernoitar no lugar até que fomos acordados pela chegada de outro grupo de 5 pessoas de meia idade, um deles com um marca-passos para o coração. Terminado de almoçar, eles se preparavam para partida, então aproveitamos o ânimo deles para seguir viagem também.

 

Queimando Etapas – mesmo dia

Baixa Grande / Queimada dos Britos

 

Apesar de ter o destino em comum, fomos por caminhos diferentes, pois os acessos são diferentes de acordo com o lugar a que se pretende chegar no próximo oásis. Saímos as 16h30 e tomamos as dunas novamente. Assistimos ao por do sol no ápice de uma duna alta, tiramos algumas fotos e, sem pestanejar, seguimos para nosso destino. Atravessamos um lago com o nível de água na cintura, onde provavelmente tinha cobras e outros bichos já na “boca da noite”. O guia se reclamava pelo atraso na saída que implicou em caminhada durante a noite. Já na escuridão, alcançamos Queimada dos Britos, onde enfrentamos uma trilha densa e escura, comparado com o deserto que tínhamos passado até então. Lanternas a mão, caminhávamos agora próximos uns aos outros para iluminar o local. A areia deu lugar a vegetação rasteiras com tocos e arbustos. É hora de calçar as sandálias não fosse a ter quebrado minutos antes quando atravessada um campo alagado. Passamos por meia dúzia de casas até chegar a casa de Neto, amigo do guia e onde passaríamos aquela noite. Aqui também não tinha energia elétrica. Os moradores do lugar, em associação ligavam um gerador em ocasiões especiais. Fora isso a escuridão tomava conta do pedaço. Meu parceiro teve que procurar o mato pras suas necessidades fisiológicas. Enquanto isso eu preparava o sopão com miojo no fogão e panela cedidos pelo dono da casa. Terminado de preparar a gororoba, plantamos nossa barraca no quintal da casa, junto com o cavalo e cabras que tinha no lugar. Estranho, mas não sentíamos fome mesmo depois de tanto esforço. Forcei comer um pouco, mas quem comeu a maior parte mesmo foi o gato que acabou se dando bem. Já passara dois dias inteiros fora de casa e sem tomar banho, exceto pelos banhos nas lagoas durante o trajeto. Já podia mesmo me considerar um autêntico natureba. Prefiro dizer que não levamos sabonete porque não queríamos poluir a lagoa do que parecer displicente em esquecer item essencial. O fato é que a “nhaca” tava grande e ainda tinha de dormir do lado de outro cara, que além de fedorento, roncava pra caramba.

 

Segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Queimada dos Britos / Santo Amaro

 

As 3h da madru, novamente o guia nos acorda com a pressa de quem quer chegar. Ele havia se zangado porque não topamos realizar a travessia nos 3 dias (o roteiro padrão), e portanto, não iria embolsar 3 diárias de R$100. Aproveitamos o pulmão e vigor da idade que ainda resta para realizar a jornada em 2 dias, o que nos rendeu qualidade de malucos, porque além de não ser experiente em trekking (pelo menos eu), nenhum dos aventureiros até agora guiados por ele realizou a proeza. Além da sandália, minha lanterna também quebrou nessa hora. Teria que seguir até amanhecer perto de meu companheiro para enxergar os obstáculos pela frente. No entanto, isso não foi grande problema, visto que logo alcançamos as dunas onde podíamos andar de olhos fechados sem preocupação de esbarrar em algo, a não ser cair duna abaixo! As 4h da manhã foi a cena mais impressionante de toda viagem para mim. O branco das dunas por que andávamos se confundia com a neblina da madrugada de forma a ver-se somente uma película branca com a mancha preta que contornava a imagem do guia que seguia à frente. Não tinha a menor idéia por onde andava agora. Não sabia se o branco ao redor era água, areia ou neblina. O vento soprava do nordeste para sudoeste, portanto a nosso favor que ia em direção oeste. Só se escutava os sons do vento e da areia flutuante. Sem duvida impressionante! Mais uma vez assistimos ao amanhecer, mas dessa vez não era praia, mas estávamos no mar de areia. Estávamos cercados por dunas por todos os lados. Tomamos café da manhã e seguimos o caminho. A paisagem aqui era muito mais bonita que o que tínhamos atravessado até então. As lagoas daqui não estavam completamente secas. Tinham uma “lâmina” d’água o suficiente para cobrir o corpo deitado. O melhor disso é que ainda podíamos atravessá-las sem ter contornar e aumentar o caminho. Molhávamos as canelas e ainda economizávamos passos. Aqui passos já era moeda com valor. O cansaço de 14h acumuladas de caminhada fazíamos esquecer de tudo e pensar em nada. Respondíamos apenas aos estímulos naturais do corpo: à sede e à fadiga. As relações entre os homens por um instante foi totalmente ignorada e me sentia um bicho em sintonia completa com a natureza. Impossível não lembrar do filme “Natureza Selvagem” ou mesmo do “Senhor dos Anéis” quando atravessamos cada vale entre as dunas. O terreno se parece com um pântano ao preservar as algas do fundo das lagoas em sua cor verde e marrom. Passamos por várias lagoas muito bonitas, todas elas sem nomes. Daí vemos que as lagoas que estão com nomes estampadas nos pacotes de turismo são apenas as mais conhecidas de centenas de outras maravilhosas espalhadas pelo lugar. Já pensávamos até em pernoitar a margem de uma delas, mas ainda era muito cedo pra pensar em parar de andar.

Os passos eram cada vez mais curtos retratando a fadiga. Descobri que meus pés têm músculos que são movimentados quando flexiono os dedos ou a curvatura do centro para cravar na areia a ganhar impulso para o movimento. Descobri que pernas foram feitas pra andar e não apoiar em uma cadeira de bar. Descobri a postura ereta da coluna que era puxada pelo peso do mochilão, entre tantas outras descobertas. Se procuram por respostas e suspeitam que estas respostas estejam dentro de você mesmo, sugiro que faça uma aventura dessas porque certamente você se revirará ao avesso em busca de conhecimento próprio. Ou se simplesmente, assim com eu, precisam de um reset para enfrentar a correria da cidade, essa caminhada também serve a este propósito. Mas a caminhada não termina aqui.

Chegamos ao final das dunas por volta das 10h, quando o guia apressado insinua em nos deixar na trilha sozinhos porque tinha que apressar o passo para chegar em Santo Amaro a tempo de pegar a condução para Barreirinhas. Isso reflete sua frustração em realizar a travessia em apenas 2 dias e deixar de ganhar R$100. Mas este problema foi resolvido porque o dinheiro só seria entregue quando chegássemos a nosso destino. O descontentamento não era explicito, mas era notória sua ansiedade por chegar. Meu parceiro não se abalava com a situação. Travou o ritmo de sua caminhada dentro de suas limitações físicas e disposição para curtir a paisagem. Fiz o mesmo.

Chegamos ao Lago de Santo Amaro, já podíamos dar a missão por concluída e pegar uma carona até uma pousada para descansar os pés. Mas não passou nenhum carro no mesmo sentido que nós e, segundo o guia, ainda havia 1h30 de caminhada até alcançar as casas que enxergávamos do outro lado do lago ou a torre que já tínhamos visto de cima das dunas a quilômetros de distancia. O terreno já era firme e facilitava sem duvida a caminhada. A água chegava ao seu fim, mas já podíamos avistar a “civilização” de Santo Amaro. Às 12h15 chegamos à pousada Pontual, onde o primeiro pedido foi uma bebida bem gelada com gelo. Cada água custava R$4, mas pedimos 3 ou mais se fosse necessário. Descansamos as costas e almoçamos regado a muito liquido enquanto o guia se encarregava de construir nossa reputação na cidade. No inicio ele não levava fé que conseguiríamos porque disse que seria minha primeira vez e, a valer pela musculatura das pernas, não agüentaria chegar a metade do caminho. Mas como eu havia respondido: “pode me faltar preparo, mas coragem e determinação eu tenho!” Foi assim, e com inspiração em Ben Hur que concluímos nossa missão tem números recordes, segundo o guia: 65km em 20h liquidas de caminhada, cumpridas em apenas 2 dias (ou 1 dia e meio como queira).

Depois do almoço nos apossamos das redes que tinha no lugar, colocamos as mochilas na mesa entre nós e tiramos um cochilo. Passamos a tarde de molho, tomando cerveja e conversando lorotas sobre a conquista. Mas o espírito mochileiro ainda vigorava, então após pagar a conta gorda dessa tarde, pedi para o proprietário para dormir nas redes da pousada até pegar a condução às 4h da madru. O cara, que já tinha ouvido nossa historia pelo guia, não criou obstáculos para isso e até guardou nossas coisas enquanto passeamos pela cidade no final da tarde. Como toda cidade provinciana, Santo Amaro tem uma praça e uma igreja no centro, as ruas são ora de areia, ora de paralelepípedo, é banhada pelo rio Alegre que da um quadro bem bonito para o lugar. Sentamos abaixo de um coqueiro as margens do rio enquanto o sol de pôs e planejávamos nosso retorno. Compramos os últimos suprimentos necessários apenas para o café da manhã, pois ao meio dia do próximo dia já estaríamos almoçando o velho tempero em casa. Quando retornamos para a pousada, um grupo de pessoas que jantava no restaurante perguntava por nós. A essa altura já tínhamos virado heróis dos lençóis maranhenses graças ao mito criado pelo guia. Tiramos fotos com pessoal de Sampa e Minas, e víamos o respeito que as pessoas nutriam quando contávamos nossa saga. É com o mesmo orgulho que venho aqui registrar cada passo e sensações vividas durante essa jornada. Depois do jantar e de mais uma cerveja para comemorar o feito, dormimos nas redes cedidas até as 4h da manhã.

 

Terça-feira, 12 de outubro de 2010

Santo Amaro / São Luis

 

Dessa vez foi eu quem acordou quebrado. Pegamos a Toyota junto com um grupo da igreja que ia realizar uma missa em um povoado próximo. Isso foi bom porque o transporte estava fechado para o grupo, exceto para nós dois, e não tivemos que ter a desventura de ir mutuado entre pessoas e bagagens. A viagem é lenta e desconfortável, mas o clima do alvorecer torna as dificuldades mais amenas. Chegamos em Sangue às 7h30 e não tardou para que passasse o ônibus de linha da Cisne Branco para São Luis. Novamente tivemos sorte, porque as pessoas que chegaram antes de nós se apressaram para pegar a Van lotada. E na calma e coragem, colocamos a mochila e o polegar na beira da estrada até que passou o ônibus.

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