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TRILHA DO RIO BRANCO : DE PARELHEIROS À ITANHAÉM


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O RIO BRANCO E A SERPENTE NEGRA

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- “Divanei, é melhor vocês não irem viajar, pois nosso primo de Rio Preto, o Valdeir, recebeu uma mensagem espiritual. E a mensagem dizia que se vocês fizerem esta trilha, pelo menos um voltará em um caixão”.

 

 

 

Caminhar em trilhas pelas florestas e montanhas sempre foi minha grande paixão, escrever, minha grande decepção. Mas o que aconteceu conosco nesta caminhada,

acho que merece ser colocado no papel. Invertendo o velho ditado, seria trágico se

não fosse cômico.

 

A trilha do Rio Branco é uma daquelas caminhadas pouco conhecida pelos paulistanos, apesar de partir do extremo sul da cidade, mais precisamente do distrito

de Parelheiros, num lugar conhecido como Represa, ela atravessa toda a serra do

mar, findando em Itanhaem , já no litoral. Eu já havia tomado conhecimento a algum tempo da existência desta trilha e

aguardava a oportunidade de fazê-la,para isso convidei um primo que mora na capital, pois seria mais fácil para ele descobrir os horários e itinerários dos ônibus,

do que para mim, pobre habitante do interior de São Paulo. Marcamos a viagem para o primeiro final de semana de agosto, pois eu não iria

trabalhar e a previsão do tempo era favorável. Começava então uma série de

acontecimentos e coincidências que parecia anunciar uma tragédia.

Ao sair de casa para trabalhar, três dias antes da viagem, pela primeira vez, de-

pois de seis anos trabalhando como motociclista, levei a minha primeira queda, de-

pois de atropelar um cachorro. Braços ralados, mãos esfoladas, joelhos inchados

e outras escoriações pelo corpo. Viagem cancelada, que frustração!!!!

Na semana seguinte não seria possível ir, tinha que trabalhar no sábado e ponto

final. Escolhemos então como nova tentativa o terceiro final de semana do mês,

mais precisamente o dia vinte e três de agosto, já que o calendário da empresa onde

eu trabalhava não previa trabalho para o final de semana.

 

Na quinta-feira, 21 de agosto, minha mochila já estava pronta, a comida e tudo

para a viagem já estava pronto. Quando cheguei à tarde na empresa, me deram a

péssima notícia. Por alguns problemas técnicos, eu iria ter que trabalhar no sábado. Bateu em mim um sentimento de derrota, mais uma vez iria ter que dar um bolo

no meu companheiro de caminhada?

Passei toda a sexta-feira tentando achar uma solução rápida. Trabalhei

na hora do almoço, consegui que um colega fizesse parte do meu trabalho

no sábado. A outra parte eu faria na sexta- feira mesmo, depois do expediente. E assim

foi. Terminado o expediente às 17 horas, peguei a minha moto e fui terminar o serviço que me restava. Foi quando der repente minha moto foi atingida por trás por um

carro. Lá estava eu, mais uma vez beijando o asfalto, e amaldiçoando a minha sorte.

Seria a maldição da trilha? Seria algum aviso para eu esquecer desta caminhada?

Levantei-me do chão, tirei a poeira da roupa, minhas mãos sangravam um pouco,

as costas e as pernas estavam doloridas, mas eu não havia quebrado nada. Levantei

e fui correndo para casa. Tomei um banho, eu ainda não estava derrotado, nunca

escondi de ninguém o meu ceticismo por estas coisas, tudo não passava de mera

coincidência do acaso, eu iria viajar, mesmo dolorido, eu iria assim mesmo.

Coloquei a mochila nas costa e peguei o ônibus para São Paulo as 08 da noite,

fui para casa do meu primo, na Zona Leste.Chegando lá descobri que um amigo dele,

na verdade um rapaz casado com uma meia prima minha, iria conosco.

 

O Marcão parece ser gente boa.Nunca tinha caminhado em nenhuma trilha, se-

ria a primeira dele. Ele é evangélico. Só não me perguntem de que igreja, pois não

saberei responder. Possivelmente de uma destas dezenas que surgem a cada ano no

Brasil. Todas as mochilas prontas, mapas, e outros equipamentos, resolvemos dormir

na casa do meu primo e combinamos de sair as 04 horas da manhã, pois era primordial

começar a trilha o mais cedo possível. Dormíamos na sala, eu , o Marcão e a esposa dele,quando mais ou menos as 03

e meia da manhã tocou o telefone.Eram os nossos parentes que haviam chegado de Rio Preto e estavam no portão. Como a casa era de fundos e nós não estávamos escutando eles baterem, resolverão ligar para que nós fôssemos abrir o portão.

Como quem atendeu ao telefone foi o Marcão, coube a ele a missão ingrata de

levantar da cama quente e fazer entrar os parentes.

Estes parentes são gente boa, primos, tios, todos da mesma igreja do Marcão.

Eles passam os finas de semana viajando com uma Vam, cheia de evangélicos, pregando e tinham vindo a São Paulo justamente para isto. O que o Marcão conversou la

fora com eles, eu não sei dizer. Só sei que o Marcão foi até a sala onde estávamos dormindo e disse que não iria mais viajar, pois teria que participar de uma vigília

com os nossos parentes evangélicos. E que se ele não fosse à vigília e fosse viajar,

para ele seria a morte. Como eu estava meio sonolento, não liguei muito para o assunto, já havia me acostumado durante vários anos de caminhadas a levar bolos

de última hora.Com toda esta confusão acabamos perdendo a hora e acordamos depois das 06

da manhã. Tudo bem, mais um infeliz azar.Agora éramos só nós dois , eu e meu companheiro de viagem, o meu primo Lindolfo . Mochila nas costas partimos para o ponto de ônibus. Meu primo à frente e eu

logo atrás. Mas antes que eu cruzasse o portão, fui surpreendido por uma janela

que se abriu subitamente na minha cara. Era outra prima minha que morava na

casa da frente. Cumprimentei-a, pois não a vi quando cheguei à noite. O cumpri-

mento foi retribuído. Foi quando ela sem me deixar falar mais nada, me deu o seguinte aviso:-“Divanei, é melhor vocês não irem viajar, pois nosso primo de Rio Preto, o Valdeir,recebeu uma mensagem espiritual . E a mensagem dizia que se vocês fizerem esta

trilha, pelo menos um voltará em um caixão .

 

Há, vai se foder, diante de tanta coincidência, não havia ceticismo que não se abalasse. Mesmo assim fingindo estar todo seguro de mim, balancei os ombros e sai.Decidi que não contaria nada para o meu primo. Se contasse sei que ele não sairia de casa.

Confesso que fiquei muito preocupado.Já pensou se acontecesse alguma coisa

com o meu primo. Iriam me culpar para o resto da vida. Mais eu tinha que pagar para

ver.Pegamos as peruas, metrôs e ônibus, e atravessamos da zona leste até o fim

da zona sul em três horas de viajem. Chegamos ao vilarejo da Represa, possivelmente pertence ao distrito de Parelheiros. Que aliás é conhecidíssimo por ser uma região muito violenta . Descemos do ônibus, que estava muito lotado e fomos tomar um

café antes de começar a caminhar.

 

Tínhamos que andar mais de 15 km pela linha de trem que desce para o litoral. Enquanto caminhávamos, eu ia pensando em tudo que tinha acontecido até o mo-

mento, nos dois acidentes de moto, na convocação para trabalhar no sábado, na

chegada dos parentes 30 minutos antes da viagem, na desistência de última hora do

Marcão, sem falar naquela previsão mórbida que teimava em não abandonar os

meus pensamentos. Comecei então a me sentir responsável pela vida do meu companheiro de trilha.Começamos a cruzar com alguns elementos estranhos, e eu imaginava que

poderíamos ser assaltados a qualquer momento, pelo menos enquanto não nos

afastássemos da civilização. Mais ou menos uma hora depois de começarmos a caminhar,passou por nós uma caminhonete, já que paralelo a este pedaço da linha do

trem, havia uma rústica estrada. A caminhonete passou uns 100 metros e voltou. Foi

quando um dos ocupantes disse : “Aí, vocês tem dinheiro aí mano”. Na hora gelei. Mas

felizmente, era só uma brincadeira. Eles só queriam uma informação, que foi dada

por nós sem nenhum problema.

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Abandonamos de vez a civilização e chegamos ao nosso primeiro objetivo ,

a Estação Evangelista de Souza. Melhor dizendo, antiga estação, pois está abando-

nada desde que os trens pararam de carregar passageiros e passaram a transportar apenas cargas. Nós só não contávamos com um pequeno problema. Havia instalado ali, um pequeno posto da polícia metropolitana. E assim fomos informados que

não poderíamos passar sem autorização da prefeitura. Caramba!! Nada estava dando certo, agora mais esta . Parecia haver uma conspiração para nos impedir de realizar a trilha.

Depois de muita conversa, o guarda nos disse que faria vistas grossas e nos

deixaria passar. Não antes sem dar um aviso: “Vocês vão com cuidado, pois é muito

grande o número de pessoas que morrem atropeladas nesta ferrovia”. Mais morte

atravessando o nosso caminho. Parecia que morrer, seria apenas questão de tempo.

Mesmo assim seguimos nosso caminho, olhando as belas e surpreendentes paisagens

ao nosso redor. Florestas e montanhas a perder de vista, rios de águas cristalinas,

pássaros, muito ar puro e também, é claro, o patrimônio histórico da ferrovia, com

suas estações, túneis e pontes. Por falar em túneis e pontes, estes dois me fizeram

tomar cuidados especiais. A todo o momento eu pedia para o meu primo não andar na

beira das pontes, que estavam muito deterioradas e escondiam debaixo de si dezenas

de metros de altura. E os túneis sempre escuros e em curvas, podiam nos fazer bater de frente com um trem.

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Estávamos na metade da caminhada que teríamos que fazer na linha férrea,

quando passou por nós, um trem com umas vinte pessoas em cima. Eram alguns mochileiros que estavam descendo para o litoral de carona, clandestina é claro. Meu

primo sugeriu pegar uma carona até o nosso destino, já que a velocidade ali na serra era muito baixa. Pensei bem: Andar de pingente de trem depois de tudo o que estava acontecendo, não seria uma boa. Meu primo, não entendia o que estava acontecendo comigo, onde estava o meu espírito de aventura. O coitado ainda não sabia o

que realmente estava acontecendo.

 

Cruzamos com um índio, que morava numa tribo próxima dali, e pedimos infor-

mação sobre a tal trilha que iria até o mar. Ele nos disse que nós poderíamos pegar

um atalho, e assim não precisaríamos andar muito sobre o trilho, entrando logo

na mata. Agradecemos a dica e seguimos. Alguns minutos depois encontramos um rapaz que já tinha feito a trilha e nos confirmou a dica do índio. Mas disse que seria

quase impossível terminarmos a trilha, pois não tínhamos cordas para atravessar

alguns abismos no final da trilha. Fiquei preocupado, mas decidi seguir caminhando

assim mesmo, deveria haver algum desvio que pudéssemos pegar para terminar a tri-

lha. Ele ainda avisou para tomar cuidado no início da trilha com uma grande cachoeira, que deveria ser transposta sem trilha.

 

Enfim abandonamos a ferrovia e caímos na mata. No início a trilha um pouco

íngreme e escorregadia logo nos levou a uma pequena cachoeira, com um poço de

águas verdes e profundas. Imediatamente tirei a minha roupa, me apoiei sobre uma

grande rocha e .........voltei a vestir a roupa de novo , pois a água estava muito fria e

eu não queria virar picolé. Minha atitude foi seguida pelo meu primo.

Comemos alguma coisa e retomamos a viagem. Nosso próximo objetivo era

chegar até o Rio Capivari, e percorrê-lo até o seu encontro com o Rio Branco. Anda-

mos uns dez minutos pelo rio até que encontramos a tal cachoeira. Na verdade uma

gigantesca queda de água descendo por fendas na rocha. Começamos a descer os

abismos pela mata, na esperança de encontrar a tal trilha no pé da cachoeira. Levamos quase uma hora para vencer o desnível de mais de cem metros. A dificuldade

do terreno voltou a me preocupar. Cada vez que meu primo por algum motivo escorregava a beira do precipício, aquele pensamento macabro voltava a minha cabeça.

 

Minha preocupação começou a se transformar em pânico quando percebi que no pé da tal cachoeira não havia sinal algum de trilha. Procurei dos dois lados do

rio, mas nada encontrei. E para piorar a situação, surgiu no pé da cachoeira outro abismo igual ou maior que aquele que acabávamos de atravessar. Foi aí que tomei

conta da gravidade e da enrascada em que tínhamos nos metido. Não contei nada para o meu primo, não queria deixá-lo em desespero. Era como se naquela hora o passeio tivesse acabado para mim, e agora o meu principal objetivo era me manter vivo, e principalmente manter vivo o meu primo. Claro que se fosse em outra circunstância eu estaria vibrando com a possibilidade de uma aventura a mais na viagem, mas como não pensar na tal profecia depois de tudo que vinha acontecendo de errado, era como se a tragédia anunciada fosse acontecer a qualquer momento.

Tinha chegado a hora de eu por em prática toda a minha experiência, adquirida em vários anos de caminhadas por todo tipo de terreno. Tinha que redobrar a

atenção, usar meu faro de trilheiro. Mas será que tudo isso resolveria, já que a minha maior luta seria contra supostas forças do alem? Literalmente não dava para

voltar atrás, nem na trilha e nem no destino. Aliás, o nosso destino teria que ser sempre em frente, ou melhor, sempre para baixo.

 

Abismos, despenhadeiros, gargantas profundas, cipós que agarravam na

mochila, espinhos que castigavam as mãos, as dificuldades iam se seguindo. Quando a

tensão diminuía um pouco, podíamos prestar atenção nos maravilhosos poços que

se formavam no pé das cachoeiras. Houve um momento em que eu e meu primo estávamos tentando vencer mais

uma queda, quando nos vimos presos a um paredão. Pendurados, não conseguíamos

ir para lugar algum. Abaixo de nossos pés uns quinze ou vinte metros de altura, e

para piorar, um poço profundo, não que para mim isso fosse algum problema, pois sei

nadar razoavelmente bem, mas meu primo só sabe nadar o famoso estilo machado

sem cabo. E para piorar ainda, ele acabará de perder seu colete salva vidas.

Seria apenas mais uma coincidência, o certo é que conseguimos nos livrar de mais

aquele sufoco.

 

Já era quase seis horas da tarde, o sol já começava a desaparecer no horizonte, ainda estávamos presos ali naquela garganta, sem nenhum lugar para dormir. Se ficássemos sentados ali no leito do rio esperando a noite passar, corríamos o risco de sermos arrastados por alguma cabeça de água, que poderia possivelmente inundar todo o rio. Foi quando quase praticamente já sem luz, depois de descer mais um paredão, para minha surpresa dei de cara com um antigo acampamento de

palmiteiros ou caçadores. Tratava-se de uma pequena barraca quase todo destruída pelo tempo, parecia ter sido abandonada há anos , mas para mim parecia o mais lindo e confortável hotel. Comemoramos muito aquele achado. Depois de um dia de decepção, poderíamos descansar confortavelmente. Se realmente íamos morrer no dia seguinte, pelo menos morreríamos de barriga cheia e com o sono em dia.

 

Acordamos poucos minutos depois das cinco da manhã, nenhuma cobra,

onça ou qualquer outro animal selvagem tinha aparecido, tínhamos um longo dia

pela frente. Teríamos que caminhar bravamente para tentar alcançar o litoral

até o anoitecer. Fiquei pensando como ficariam preocupados as nossas famílias se

não chegássemos em casa na hora marcada. Ainda mais sabendo da previsão macabra.

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Parecia que nossa sorte tinha começado a mudar. Depois de uma vasculhada pela área, encontrei uma trilha. Só podia ser a tal trilha, era batida, um pouco

confusa, mas larga. Corria paralela ao rio, e olhando o mapa que tínhamos em mãos,

não tínhamos mais dúvida, era a trilha que procurávamos. Estávamos no plano, o

rio era cristalino, gelado e maravilhoso. O prazer voltara a fazer parte da nossa caminhada. Pássaros, árvores enormes, todos os cheiros e cores que só a mata Atlântica pode proporcionar. Depois de três horas de caminhada finalmente encontramos

o famoso Rio Branco. Paramos, fizemos um lanche, estávamos extasiados com tanta

beleza. A preservação do local é incrível. São florestas e montanhas a perder de

vista. Pequenos rios que deságuam no Rio Branco, são dezenas.

Por enquanto toda tensão havia passado, caminhávamos eufóricos, a tri-

lha fácil, plana e larga. Batíamos papo e observávamos tudo ao nosso redor. Resolvi então apertar o passo, deixando meu primo um pouquinho para trás. Foi quando

der repente ouvi um grande barulho de alguém caindo no chão. Olhei para trás e o

que eu vi me deixou paralisado, mal consegui mover as pernas, senti arrepios em to-

do o corpo. Vi meu primo caído no chão com as mãos na garganta sem poder respirar.

Ele levantava e caia de novo. Apontava a mão para a cabeça e para a coluna, balançava os braços pedindo socorro. Sim, meu amigo estava morrendo na minha frente, e

aparentemente sem que eu pudesse fazer nada. Mesmo conhecendo técnicas básicas

de primeiros socorros. Na minha cabeça só um pensamento: A maldita profecia havia

se cumprido. Eu estava pasmo, perplexo. Havíamos passado por tantos perigos, e a

morte nos apanhara em um lugar onde nem uma criança seria capaz de se acidentar.

 

Meu primo Lindolfo é grandão, um pouco acima do peso. Quem o vê pela primeira vez, com seu chapéu com uma pena de urubu, pensa estar frente a frente com um Rambo das florestas Brasileiras, mas não é bem assim, como ele mesmo diz, ele é

meio estabanado, costuma cair com certa freqüência. Mas é impressionante o

progresso que teve em pouco tempo em matéria de caminhadas. Hoje ele já consegue

terminar trilhas, que antes ele nem sonhava em realizar. Falastrão é uma excelente companhia para caminhar, me agrada e da prazer caminhar a seu lado.

Der repente vi o meu pesadelo ruir em alguns segundos, meu primo voltara

pouco a pouco a respirar. Foi se acalmando, sua cor voltara ao normal. Ele sobrevivera a mais esta. Até hoje não sei o que aconteceu. Possivelmente ao cair no chão,

depois de tropeçar em um cipó, bateu com o peito e a garganta em um toco, fechando-lhe as vias respiratórias, que aos poucos foi voltando ao normal.

 

Depois de um breve descanso, seguimos firmes e a passos largos. Vário riachos

foi cruzado, começaram a surgir de repente alguns pés de bananas. Um claro sinal de civilização. Mas como? Civilização no meio da floresta? . Mais meia hora de

caminhada e nossa pergunta foram logo respondidas. Uma tribo indígena! Sim indígena.

Uma tribo Guarani. Uma visão de encher a alma. Depois de tanto tempo quase se

arrastando pela mata, fomos dar de cara logo com um povo que sonhara em conhecer. Mesmo estando a menos de 100 km da maior cidade do país, esta tribo, conhecida

como tribo do Rio Branco, mal fala português, as crianças só tupi-guarani.

Nosso primeiro contato foi com as crianças, claro que não entendemos uma

palavra do que elas falaram. Logo avistei uma índia seminua, que tratou logo de

vestir uma camiseta. Pedimos para nos aproximar e fomos autorizados. Cumprimentamos o índio e a índia, que nos responderão com um português de difícil compreensão. Perguntamos o tempo que gastaríamos para chegar ao litoral, e ele disse

que em quatro ou cinco horas de trilha, chegaríamos a um local onde seria possível pegar um ônibus. Ficamos felizes, conseguiríamos com certeza terminar a nossa

viagem na data prevista. A pedido do índio distribuímos alguns doces para as crianças, nos despedimos e seguimos em frente .

 

A trilha continuava plana e de fácil navegação. O Rio Branco continuava a

nos acompanhar e fazia jus a seu nome, limpo , translúcido e calmo. Encontramos pela frente um índio que vivia isolado da tribo. Parecia ter uns 50 anos de idade. Segundo ele, estava morando ali a uns vinte anos. Disse ter vindo de uma tribo guarani do Estado de Santa Catarina. Foi por ele também que descobrimos e ficamos sabendo que aquela tribo, conhecida como Rio Branco,está ali a menos de trinta anos. Provavelmente habitavam o litoral e com a explosão urbana, foram obrigados a

se mudar para as montanhas. Atravessamos o Rio Branco e continuamos a caminhada, agora pela sua margem esquerda. Depois de algum tempo de caminhada, agora

por uma estradinha de terra, paralela ao rio, chegamos ao que parecia ser a área

principal da tribo. La havia uma pequena escola e um posto de saúde e a iluminação

elétrica também havia chegado. O que não diminuía em nada a fantástica sensação

de estarmos diante de um povo de hábitos tão primitivos. Surpresas que só um país

como o Brasil pode nos proporcionar. Um Brasil pouco conhecido pela maioria dos

brasileiros. Tiramos algumas fotos e continuamos pela estradinha.

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Eu estava eufórico, fui acometido der repente por uma felicidade que não

sentira há muito tempo. Sentia-me leve, parecia estar flutuando, era como se eu tivesse atingido o nirvana. Começara a perceber que toda aquela profecia, não passava

de pura cretinice. Ao invés de morrermos, havíamos ganhado mais vida. Tínhamos passado algumas dificuldades,admito, mas estávamos ali de pé, firmes para contar

a história. Sobrevivemos a tal maldição. Íamos ver o sol nascer mais vezes. Desta vez fortalecidos e confiantes em nós mesmos.Contei toda a história paro o meu primo, enquanto caminhávamos pela estradinha de terra e depois fizemos muitas piadas com o que tinha acontecido. Rimos muito. Foi ai que ele começou a entender porque eu havia durante toda a caminha-

da, o tratado como se ele fosse uma criança.

 

Conseguimos uma carona com um baiano, que morou na Chapada Diamantina, e hoje vivia em São Bernardo. Descemos em um bairro do litoral, onde pegamos

um ônibus que nos deixou na rodoviária de Itanhaem.Pedi que meu primo ligasse para casa dele, pois provavelmente sua esposa

poderia estar preocupada por causa da tal profecia. Ficamos sabendo que a profecia teria sido recebida, na verdade, por uma tia nossa, e que a profecia dizia que se

fôssemos, seríamos picados por uma serpente negra. E que a visão se limitava apenas ao Marcão e sua esposa. E no caso serpente negra na crença deles não tinha nada a

ver com cobra, e significaria somente a morte. Juro que a minha vontade era de mandar enfiar profecia e serpente negra na bunda. Mas por respeito a minha tia, pessoa a quem admiro muito, deixei pra la.

 

Pegamos uma Vam até o terminal do metrô Jabaquara. Despedimo-nos na Estação da Sé com uma sensação de vitória, de alma lavada, com alegria e satisfação, que só pode ser sentida apenas por quem se dispuser a abandonar a civilização e se lançar rumo ao desconhecido.

 

Divanei Goes de Paula / agosto de 2003

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Drama, suspense, mistério, terror, comédia e aventura. Rsrsrs...

Muito bom! ::otemo::

Só faltaram algumas fotos.

 

Também já estive fazendo trilhas na APA Capivari-Monos, em uma ocasião parti de Marsilac e cheguei até a Usina do Rio Capivari onde também existe uma bela cachoeira.

 

Dica para quem for fazer essa trilha:

Ao chegar ao posto policial na Evangelista de Souza diga que está indo acampar no sítio do Jamil. Você terá apenas que escrever seu nome e endereço em um livro de registros.

No sítio do Jamil também tem uma cachoeira, ele cobra uma taxa de visita e pode-se acampar.

 

Abraços.

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  • Membros de Honra

Bom , Sandro .

As fotos praticamente não foram tiradas e as únicas que se salvaram , vou tentar escanear porque não são digitais . É engraçado que depois de se passarem tanto tempo desta aventura, toda vez que encontro com o meu primo ainda damos muita risada desta história bizarra .

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  • Membros

Excelente relato, realmente...

 

To pensando em fazer essa doidera, mas como eu chego de transporte público até a estação evangelista de souza?? Peguei o ponto final do busão que vai para esses lados, e mesmo assim é bem longe ainda!!!

 

Vejam só:

http://maps.google.com/maps?f=d&source=s_d&saddr=Pca.+Maria+Nazareth+Da+Costa,+0&daddr=Esta%C3%A7%C3%A3o+Evangelista+de+Souza+%40-23.930769,-46.647971&geocode=%3BFW_Ykv4dXTU4_Q&view=map&hl=pt-BR&mra=ls&sll=-23.90084,-46.690635&sspn=0.082865,0.110035&ie=UTF8&z=13

Lógico que essa volta toda é porque o maps tenta fazer o caminho de carro...

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  • Membros de Honra

Então, Edu .

Como você leu no relato , eu não moro em São Paulo . Sou de Sumaré, interior . Mas acho que você tem que ir mesmo até parelheiros e de la pegar o ônibus para o bairro REPRESA e descer bo ponto final e é ai que começa a travessia . Você ira seguir pela linha do trem . Bom como o relato está escrito mais no sentido literal, acho que fica difícil se guiar por ele . Aconselho você a conseguir o antigo livro de trilhas do Sergio Beck .É um livro bem famoso entre os aventureiros e você não terá problemas em consegui-lo . O livro está meio desastualizado, mas acho que ainda da para se guiar por ele . Quarquer coisa entre em contato comigo que terei o maior prazer em ajudá-lo . Pode entrar na minha paguina do Orkut - é so digitar Divanei Goes de Paula e você me acha .

Um grande abraço .

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  • Membros

fala Divanei!

 

Então é no potno final mesmo... No link eu mandei, é do ponto final do busão até a estação evangelista de souza. Na volta que tem no mapa, dá para imaginar que o jeito é descer no ponto final e caminhar um pouco até alcançar os trilhos.

 

Ê vontade de fazer essa trilha!

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  • 4 meses depois...

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