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TRAVESSIA EXPEDICIONÁRIA - VALE DO RIO GUARATUBA


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  • Colaboradores

"O Vale do Rio Guaratuba é uma sucessão de abismo que parece querer tragar a superfície para o centro da terra. Um rio que é sinônimo de mar bravo detentor de maremotos aterrorizantes onde marujos não navegam, pois se navegam morrem. E esse era nosso medo: morrer, ou passar por apuros nas profundezas de um cânion onde o socorro não chega. Tivemos medo porque ali eramos um grupo de marujos teimosos que vivem inventando de peitar tempestades em alto mar sem saber dar uma braçada se quer sem o uso de coletes salva vidas, correndo o risco de sermos tragados pela fúria indomável das águas."

OS BASTIDORES

Muitos pensam que nossas jornadas se dão como tiros no escuro, mas não. Tudo se antecede por meses de buscas e estudos para criar uma rota fiel e, mo mínimo, segura próxima ao rio que pretendemos desbravar. Com o Rio Guaratuba não foi diferente!
Já se passava de um ano que o nome Dele havia sido mencionado, como há uma infinidade de roteiros selvagens para discutirmos, esse acabou por ser arquivado. Mas, como tudo tem sua hora certa, a vontade de viver novas emoções despertou voltada para o extremo do planalto Leste de São Paulo. Pra ser mais Exato, Bairro Rural de Casa Grande -Biritiba Mirim/SP. 
Entre várias conversas com os amigos que demonstravam vontade de encarar o Guaratuba sempre ficamos de ver uma data para fazer uma investigação local para achar o acesso inicial para realizarmos a travessia, mas já estávamos de muita conversa e pouca ação. Deveríamos colocar o plano como meta, e para isso chamei o Tony, que no início de Outubro foi comigo fazer a PRIMEIRA INVESTIGAÇÃO no local, apenas com à cara e a coragem sob a luz do dia. Chegamos lá por volta das 05h40, carregados de adrenalina e medo, aquele medo que chega a dar dor de barriga. A intenção era de irmos até primeira casinha que é possível ver nas imagens de satélite. Tínhamos que descobrir se era uma espécie de guarita, ou alguma casa de bombeamento para captar água do Rio Claro. Varamos mato para não ter que sair tão próximos da entrada principal da EMPRESA que iríamos invadir território, acessamos a pista principal dentro de suas dependências e fomos somente até esse ponto (4km percorridos), a ponte sobre o Rio Claro. Ao voltarmos, um carro dobrou a esquina silenciosamente e quase nos pega com a boca na botija. Nem deu tempo de avisar o Tony, me joguei no mato e disparei na corrida até enfiar os pés num pântano, onde paramos e esperamos abaixados o carro passar e sumir de vista. O bom foi que meu comparsa entendeu o recado e me acompanhou uns 10 mts mais atrás, caso contrário seríamos pegos pelos funcionários que faziam ronda.
O susto passou, mas a adrenalina só aumentou. Ainda tínhamos 2 km para andar completamente expostos na via. Aceleramos os passos e quase não conversávamos para ouvir melhor qualquer barulho que se aproximasse ao longe. Conseguimos percorrer a distância restante sem apuros, mas quando entramos na mata outro carro da empresa passou no mesmo sentido. Só tomamos o cuidado de nos abaixar para não sermos vistos.
Quando Voltei para casa, animado com as infos que conseguimos, joguei as cartas na mesa de reuniões dos mais retardados/malucos Exploradores da Serra do Mar que conheço. Ainda assim a info coletada não foi suficiente para animar o bando, era apenas 1/3 do caminho até as bordas do Rio Guaratuba, onde há uma enorme "casa" vista por satélite, e ali morava a grande dúvida de podermos partir ou não rumo ao vale . Então me propus a voltar lá na semana seguinte. 
Na SEGUNDA INVESTIGAÇÃO estávamos em quarto: Daniel Trovo, Paulo Potenza, Rafael S Lima e Eu. O plano era chegar até essa "possível casa" para saber do que se tratava. Para termos êxito na busca por infos completas partimos na surdina. Começamos o vara mato inicial às 21h30, e junto veio a chuva acompanhada de frio. Logo pisamos na pista principal, onde nos restava uma caminhada de +ou- 2h30.
A chuva se fez ininterrupta, castigava o psicólogo enquanto o frio judiava a parte física. Foi eu quem menos resistiu à tal pressão. Com duas horas de caminhada eu já tremia o corpo, batia os dentes, e logo comecei a gemer de tanto frio que sentia. Era o início de uma hipotermia. Eu andava com a sensação de estar me rastejando com uma tonelada nas costas, vi que a metade da noite estava próxima, a suposta casa também, mas eu não conseguia assimilar nosso avanço. E quando vimos os fachos de luz iluminando a neblina tive um certo alívio em saber que meu sofrimento estava perto do fim.
Chegamos com cuidado, olhamos o entorno para ver se não havia algum vigilante nas dependências e tratamos de procurar abrigo. Aliás, cuidamos, não! Cuidaram. Eu não tinha condições de pronunciar meu próprio nome, tremia mais que vara verde.
Farejando os cantos da construção que desejamos alcançar, os meninos conseguiram vislumbrar uma possibilidade de entrarmos e passarmos a noite, secos e abrigados do frio que estava pouco acima dos 10°C.
Leve como uma pena e liso feito uma lesma, Potenza conseguiu escorregar entre a única fresta aberta que possui aquela parede, e logo abriu as portas para um mundo novo. Com dez minutos, após trocar as roupas molhadas por roupas secas, eu ja estava renovado com quem acordar para enfrentar o dia. Lá dentro descobrimos que teríamos um horário certo pra sairmos de lá, também um horário certo para transitar pela estrada sem sermos vistos pela fiscalização no dia seguinte. Mas, como era coisa pra ser colocada em prática só após a alvorada, esticamos uma lona no chão, também os sacos de dormir, e apagamos no sono.
Na manhã seguinte tivemos alguns conflitos ideológicos, teve amigo que deu um chilique danado por que fazia questão de irmos até o POÇÃO DO GUARATUBA. Quando tudo se resolveu partimos em direção ao Poção, e pouco além dele montamos acampamento para passar a parte da manhã chuvosa esticados nas redes curtindo uma preguiça.

A TRAVESSIA 
PRIMEIRA NOITE - 17/Nov/2017
O estado de São Paulo estava sendo castigado por uma forte tempestade, e isso acontecia ainda quando a luz do dia se fazia presente. Era um aviso de que as coisas se tornariam mais difíceis naquele lugar escondido nos confins de Biritiba Mirim. A tormenta ainda era bruta quando caiu a luz do Sol, antes mesmo de nosso grupo se reunir e decidir se teríamos a coragem de partir rumo ao novo desafio, selvagem e desconhecido, que tanto nos assustava com seu desnível, o maior de que se tem notícias na Serra do Mar. Muitos acontecimentos vieram à tona para testar nossa resistência psicológica, a lei de Murphy nunca tinha se aplicado tão fiel em minha vida...
"Falecimento de três parentes às vésperas do evento, filha que adoeceu gravemente na mesma semana, metade dos envolvidos desistiram de embarcar nessa aventura, alterações em escalas no trabalho, etc e tal..."
Mas quando as forças conspiram à favor para que tudo aconteça não há nada e nem ninguém que possa impedir aqueles que sonham. Nem mesmo nosso amigo, Paulo Potenza, que carregava toneladas e mais toneladas de argumentos catastróficos para que nosso clã cancelasse a missão. Desde cedo ele me mandava mensagens que previam as mais hediondas tragédias. Quando se encontrou com Divanei, em Itaquera, buzinou o fim dos tempos na orelha do pobre velhinho até a Estação de Suzano (CPTM), onde formamos o quinteto que encararia a Besta de frente.
A chuva fez com que nosso transporte viesse a atrasar mais de duas horas, e com isso tivemos tempo suficiente para discutir se realmente valeria a pena prosseguir com tamanha loucura sob aquelas condições climáticas, que previam 3 dias de chuvas, sendo que só em um desses dias estava previsto para ser despejado sobre nossas cabeças 50 mm de água. É água pra cacete. 
Durante a espera nosso amigo continuava com seus argumentos carregados de maus espíritos, mas como ele mesmo disse:
- estando Divanei, Trovo e Vgn juntos, dificilmente ele conseguiria fazer com que a gente fosse desistir.
E quando se convenceu de que seu poder de persuasão era falho, às 22h18m, decidiu embarcar na Van com a gente. Partimos (Daniel Trovo, Divanei Góes, Paulo Potenza, Tony Eduardo e Eu Vgn Vagner) sob a condução de um motorista chamado Aro, animado e descontraído, que ficou encarregado de levar até os quilômetros finais da Rodovia SP-092. Entre as conversas de assuntos corriqueiros, muita tiração de sarro e risadas, ele também fez o favor de nos avisar sobre o dilúvio que caía em Biritiba Mirim, nos alertando se realmente valeria a pena arriscar nossas vidas na descida até o litoral, ou era melhor escolhermos outra data, e ele nem cobraria pelo valor q foi combinado. Tudo para que não fôssemos. Mas todo aquele bom humor que a gente ja vinha se acostumando se transformou em ira quando viu que quanto mais avançávamos, mais distante parecia estar o local onde deveríamos desembarcar. Por várias vezes vi aquele senhor bufar pelas ventas e coçar a cabeça, impaciente, já nos respondia somente o necessário e com rispidez. A cada 5 min perguntava de estava chegando. E quando passamos pela gigantesca ETA da SABESP (Estação de Tratamento de Água) o veículo foi adentrando pela estrada que se resumiu pela metade do que percorremos nos 20 km anteriores. Com isso a paciência do motorista chegava cada vez mais perto do esgotamento. Falamos para ele nos deixar na próxima bifurcação que aparecesse logo à frente (uns 300 mts), e ele respondeu que "esse logo ali" da gente daria mais uns 10 km. Foi quando ele embicou o carro na mata e iniciou uma manobra para retornar. Como faltava apenas 1 km para o início de nossa jornada não questionamos a ação daquele homem. Até por que não queríamos ver ninguém surtando ou sofrendo um ataque cardíaco na nossa frente. rsrs
Quando acabamos de pagar o serviço, um de nossos integrantes nos pergunta: 
- vocês não vão achar ruim se eu disser que vou voltar daqui?? (adivinha quem, rs, Potenza).O silêncio se fez presente.
Me recordo apenas de ter baixado a cabeça, e quando levantei os olhos mirando nosso amigo, lhe disse:
- isso é algo que só você pode decidir. E se for pra desistir o momento é agora. Depois que a Van for embora não tem mais jeito.

Ele justificava sua desistência quando Tony o interrompeu imitando um frango...
Pó, Pó, Pó, Pó... 
As gargalhadas ecoaram por toda escuridão daquele lugar. E como quem ameaça, ou roga praga, Potenza retrucou:
- É... quero ver você chorar lá no meio do Vale por que não tá aguentando o rolê. 
Depois de muita zoação, com um forte abraço ele se despediu de nós, deixando algum lanche e uma corda de 15 mts para usarmos a favor de nossa segurança.
À meia noite começamos nossa caminhada no último quilômetro antecedente ao trecho de vara mato noturno que iríamos enfrentar. Depois usaríamos como via uma estrada que corta a Mata Atlântica por 12 quilômetros. Um caminho longo, porém, agradável.
Da mesma forma q da vez anterior adentramos sorrateiramente ao "acampamento base" por frestas que há nas janelas do alojamento. Às 03h00 a.m, depois de comer alguns pedaços de torta que a sogra do Trovo fez, cada qual já pegava no sono como podia, largados ao chão, usando saco de dormir ou não, porém, bem abrigados. Mesmo que ilegalmente. rs
PRIMEIRO DIA DE CAMINHADA - 18/Nov/2017
Todos os dias, independente se é sábado, domingo ou feriado, há uma patrulha que se repete três vezes ao dia para manutenção do lugar que passamos a noite, começando às 08h00. Por isso tratamos de acordar cedo e picar a mula dali o quanto antes. Ser pego com as calças nas mãos nunca foi coisa legal. Às 07h00 já estávamos guiando nossos pés e levando a tropa de encontro ao monstro que tanta nos assustava. No descampado mais próximo da Estação de Bombeamento parte uma trilha, e por ela seguimos, passamos pelo POÇÃO GUARATUBA, chegamos até a área que usamos como acampamento de preguiçoso na segunda investigação, e seguimos. A partir daquele momento estávamos entrando num mundo totalmente novo aos nossos olhos, um mundo completamente agressivo e selvagem. A cachoeira que fazia estrondo da vez anterior já não era tão voraz desta vez. Passar por ela sem medo foi algo fácil de se fazer.
Na margem direita do rio, ainda plana, há rochas de tamanhos parecidos e a vegetação é baixa. Terreno ideal para caminhar sem grandes riscos. Com 40 min após a saída de nosso abrigo chegávamos ao ombro da Serra do Mar. Divanei seguia puxando em um ritmo tranquilo, mas estava a uns 30 metros à minha frente enquanto o Trovo e o Tony vinham numa distância parecida depois de mim. 
Me lembro que o rio fez uma leve curva para direita, foi quando vi nosso amigo parado em cima de uma grande pedra analisando o que teríamos de vencer. Rapidamente desviei meus olhos dele e fixei minha atenção na cabeceira da cachoeira. Me arrepiei da cabeça aos pés com o cenário se abriu à nossa frente, lindo e fantasmagórico ao mesmo tempo. Era a beira de um abismo que ruge ferozmente enquanto traga aquele terreno acidentado, e chega a assustar por parecer não ter fim. Ali estava certo o início de nossa odisseia, e se fosse para batermos em retirada aquele era o melhor lugar, mas como a equipe "só tinha carne de pescoço" estufamos o peito, respiramos fundo e nos jogamos pra dentro da mata borrando as calças com medo do que estava por vir. O desafio inicial já era de patente alta, de respeito, certo de que seria um sofrimento galgar cada curva de nível que se aprofundava cânion adentro. Iniciamos tudo na cota dos 820 mts de altitude, e com menos de 4 km toda a elevação já vai se acabando. Ou seja, uma pirambeira descomunal. 
Antes da cabeceira não foi possível atravessar o rio, já em declive fortíssimo não devíamos nem pensar em tal hipótese. Fomos tocando nosso bando e e beirando as encostas para manter proximidade com o rio, por que na menor das possibilidades nós iríamos arriscar um acesso à base da cachoeira. Escutávamos o barulho de um turbilhão vindo do fundo do Vale, mas não conseguíamos ver nada além de paredões de rochas expostas guardando as águas. Estávamos ansiosos e curiosos para ver qualquer filete que fosse, pois era certo de que seria formidável, já que o satélite mostra um cacheira incrivelmente grande naquele altimetria, avistar uma queda partindo daquela altura seria maravilhoso. Perambulávamos sobre a crista, e de vez enquanto metíamos o cabeção fora da mata, beirando o penhasco, na esperança de ver algo, mas a altura era tanta e o vale tão profundo que não víamos nada, além da possibilidade de morrer. O jeito foi permanecemos firmes no vara mato até a chegada do platô principal. A cada cinco passos descíamos três metros de altitude, a cada metro de desnível vencido muita vegetação mediana e árvores de grande porte que serviram de apoio eram deixadas para trás. Dessa maneira seguimos avançando rápido, mas carregando o receio de perder de vista a principal cachoeira que corria ao nosso lado, tão perto e tão distante. Mas o receio se dissolveu quando o enorme platô rochoso pode ser visto entre as árvore vale abaixo. Nós o miramos como objetivo e saímos gastando faro em busca de alguma via que nos levasse até lá. O sentimento que nos dominava já dava lugar à ansiedade mista com a alegria de poder ver algo tão lindo, tão grandioso e tão selvagem, pois já tínhamos achado a artéria certa q nos levaria ao coração do Rio Guaratuba. Ao pisarmos nas primeiras rochas nuas do platô a alegria transbordou euforicamente diante do espetáculo que se abriu aos nossos. Era como se estivéssemos vendo tudo sobre as nuvens, utilizando as janelas do céu. O mirante natural nos permitiu ver uma boa parte da Praia de Boraceia - extremo norte de Bertioga. Ver o Rio Guaratuba, largo e sinuoso, se juntando ao mar enquanto uma revoada de Andorinhas bailava ao nosso redor foi um momento raro e precioso, imensurável. Recompensas que faziam valer cada minuto em que arriscávamos nossas vidas em busca de aventura. Às nossas costas estava uma Queda d'água bruta, gigante, que a batizamos como SALTO DO CACAREJO. Já estávamos felizes por recebermos aquele presente logo nas primeiras horas do dia, às 09h10m a.m. O mirante serviu como palco contemplativo, área de descanso e piquenique, e depois da sessão de registros voltamos pra mata.
Montão de Trigo e Alcatrazes (ilhas em alto mar), formosas e imponentes, foram vistas de longe em meio ao vara mato parecendo flutuarem sobre o azul marinho que se estende pelo horizonte e se mescla com o azul cerúleo. Penhascos e desfiladeiros eram nossos obstáculos e companhias inseparáveis por qualquer lugar que fossemos, direta ou esquerda. E mesmo com tamanha adversidade nos cercando, Trovo parecia uma criança em um parque de diversões, transbordando felicidade através de gritos e gargalhadas somadas aos bordões de alto teor cômico. Coisas que se aprende no gueto, rs. Mas não era pecado nenhum sentir-se feliz dentro daquele inferno verde e deixar tal sentimento extravasar. Até por que o pacote estava saindo melhor do que a encomenda.
Vez ou outra a gente parava para aferir o GPS, analisar o quando a gente perdia em altimetria e o quanto avançávamos em quilometragem. Era satisfatório pregar os olhos na telinha e ver que estávamos despencando como a água do rio, e deixando para trás várias curvas de nível que não arrefeceram por horas. O plano de seguir o mais próximo possível das fendas deveria de ser mantido, mas, presos no ombro de uma rocha lisa, sem agarras, nem vegetação firme para servir de apoio, Divanei chegou a lançar a corda mas não foi o suficiente para deixar nossos pés em segurança no patamar abaixo. Recolhemos a corda e fomos caçar um caminho melhor pra dentro da floresta, que estava muito quente e abafada devido aos 30°C previstos para o dia. Quando retomávamos a direção das águas o pensamento coletivo não era outro, senão, TOMAR BANHO DE CACHOEIRA. Mas para isso, Divanei e Eu tivemos que vencer um jardim de bromélias e grudar nossos esqueletos numa árvore e executar as técnicas mais apuradas de "Poli Dance Selvagem," para ter acesso ao rio. Tony e Trovo escolheram uma via melhor para chegar na ducha gelada da CACHOEIRA GRUTA DA BELA VISTA. Eu já fui largando a mochila nas rochas, tirando a camiseta e me enfiando debaixo da queda. Tony e Trovo também foram. Precisávamos daquilo.
Depois das de longas costumeiras tratamos de deixar o leito à nossa esquerda e tirar mais algumas horas de vara mato até o ponto crucial da Travessia, onde o principal afluente deságua no Guaratuba, e essa confluência faz um forte vinco em forma de V, e essa junção aponta tarefa árdua, carrasqueira. Conversamos à respeito de tal ponto, e deduzimos que passando dessa parte estaríamos com passe livre para concluir a descida até o litoral. Mas, se tudo aquilo se transformasse em um pesadelo de barreiras intransponíveis iríamos engolir nosso orgulho, enfiar o rabinho entre as pernas, voltar tudo o que deixamos para trás e afogar nossas mágoas no aconchego de casa. Seria frustrante, mas não haveria outra opção. 
Às 11h40, quando o sol estava de rachar o coco, colocamos as pontas dos pés em mais um precipício, olhamos para baixo para ver a enorme cachoeira caindo e voltamos pro mato. Começamos por um vara mato horrível, espesso, sobre um afluente seco onde tentei descer e voltar pro rio o quanto antes. Mas a via acabava numa altura nada convidativa, e prosseguir por ela também não era nada fácil. Tudo muito escorregadio e cheio de galhos tombados atravessando o caminho. Então voltamos e subimos mais um pouco para darmos a volta, o Trovo assumiu a dianteira e começou a rasgar um emaranhado de samambaias que parecia não ter fim. Uma mata densa e entrelaçada que não dava espaço para abrirmos espaços. O Tony xingou os diabos por conta daquele pedaço horrendo e tortuoso. Mas como nenhum sofrimento é eterno, às 11h50, saímos em um afluente de águas claras, um lugar simples, de encher os olhos. Era "o nosso afluente." Verificando seu curso vimos ele se transformar em uma cachoeira ímpar, linda (CACHOEIRA DA PROA), que despenca com pouco volume há pouco mais de 12 mts de altura. Sua cabeceira também é um mirante especular, permite avistar o restante do Vale, a imensidão do mar sustentando as duas ilhas, e o condomínio que tínhamos como alvo final. O lugar se apresentou tão agradável que gastamos um bom tempo por lá. E como não poderia faltar recreação, descemos até sua base para revigorar as energias de nossos corpos cansados.
Não poderíamos contar vitória antes da hora, mas acabávamos de deixar para trás o Cão Cérbero que nossa mente havia criado. A cota 470 foi ficando cada vez mais acima de nossas cabeças, e já dentro do leito do rio paramos de fronte ao Poção que recebe a força de uma enorme cachoeira que corre na diagonal - CACHOEIRA DA JUNÇÃO - sendo abastecida pelo "nosso afluente." Beliscamos alguns pedaços da iguaria trazida pelo Trovo (+ torta), admirando mais um espetáculo que aquele lugar apresentava.
Até então tínhamos andado apenas pelo lado direito do rio, coisa que causava estranheza, pois achávamos que seríamos obrigados a ficar saltando de lado à lado por conta das dificuldades do caminho, mas o rendimento vinha sendo satisfatório em meio a tudo aquilo. Às 13h50, dentre a cota que arrefece por alguns minutos, forçados por uma garganta que nos barrava prosseguir por onde estávamos, fizemos a primeira travessia de margem à margem saltando sobre as rochas e sendo desequilibrados pela força da água. A margem esquerda "estava uma uva" de tão prazerosa que estava, já estava mais do que na hora de todo aquele declive acentuado dar um trégua e nos deixar um pouco mais seguros sem ter que ficarmos pendurados em paredes. Seguimos um longo trecho pelo próprio leito, pulando de pedra em pedra e contornando poções. E como ja diz o velho ditado: em time que está ganhando não se mexe, fomos fiéis à mesma tática que vinha sendo aplicada até então: hora eu puxava o ritmo da tropa, hora Divanei assumia a frente, enquanto Trovo vinha sempre como o terceiro homem dando sugestões de caminho, e o Tony era o mudinho do grupo, vinha aguentando a pressão quietinho como um líbero de time da várzea - o último zagueiro. Assim seguiríamos até o fim daquela batalha de sobrevivência do homem vs a força da natureza.
Não muito diferente do lado oposto na esquerda também tivemos penhascos para andar sobre suas beiradas correndo riscos de cair pra nunca mais voltar. Mas as árvores continuavam sendo nossas melhores aliadas naquela luta pela sobrevivência, e quando não as tínhamos éramos obrigados a subir morro acima, ganhar altitude novamente, contornar algum obstáculo e voltar sem demora. Assim fomos vencendo mais curvas de nível, tudo tão agressivo quanto antes, e às 14h40, já na cota 470 encontramos uma sequência de 3 cachoeiras lindas (CACHOEIRA DOS TRÊS POUSOS). Entre cada uma delas há um poção, ideal para banho, e as rochas que cercam o lugar serviram como ponto descanso para o Tony - que já demonstrava muito cansaço em seu semblante, e o mesmo lugar serviu como área de TOP LESS para o Divanei, que arrancou a camiseta e se estirou no chão queimando a barriguinha e as peitcholas rsrsrs, enquanto Isso Trovo e EU fomos explorar as quedas mais acima e dar aquele merecido tibum. Às 15h20 partimos de lá devido a ameaça que São Pedro enviou. Em menos de 10 minutos o céu que estava dava lugar ao sol de rachar pedra tomou todo espaço azul e nos cobriu com nuvens carregadas. Corremos pra mata querendo acha algum lugar decente para nos abrigar do temporal que "Pedrão" prometia. Enquanto a gente seguia varando mato os trovões estalavam no céu acusando que logo cairia chuva forte sobre nossas cabeças, e justo naquela hora topamos com uma cabeceira que parecia ser de uma cachoeira com mais de 120 mts de altura. Contornar tal obstáculo iria tomar muito tempo, mas, como não tínhamos outra opção, e estávamos à beira de um precipício guardado por fortes inclinações nas escarpas laterais, com o pensamento de: se correr o bicho pega e se ficar o bicho come, tentamos não parar enquanto a chuva Não caía, pois não sabíamos quanto ainda faltava para aparecer algum canto para jogarmos as tralhas e descansar sossegados e distante das enxurradas do rio. Às 16h20, quando gritei: AFLUEEENTE, começou a cair chuva. Colocamos os pés no pequeno tributário e já falávamos que seria por ali mesmo que iríamos montar acampamento para passarmos a noite. Meio que desesperado, com medo de a chuva trazer água barrenta para o afluente, algo comum em dias de chuva, comecei a pedir para os meninos encherem suas garrafas e armazenarem água limpa para prepararem a janta e consumir até o dia seguinte. Olhamos com atenção, analisamos onde poderíamos nos acomodar, e vimos que o lugar era o pior local para acampamento no momento, cheio de pedras, galhos e buracos, numa pirambeira chata de andar, mas seria ali mesmo a parada final daquele dia, pois, além de estarmos extremamente cansados havia uma barreira surreal à nossa frente que preferimos deixar para confrontá-la na manhã seguinte, quando já estaríamos revigorados e prontos para uma nova batalha.

O ACAMPAMENTO 
Limpamos o espaço que ocuparíamos esticando nossas redes, escolhemos a árvores que pareciam as certas e colocamos a mão na massa ainda sob a chuva. Tony nunca havia feito um acampamento selvagem utilizando redes, não sabia nem por onde começar suas arrumações, e para ajudar, o lugar que lhe restou foi o pior lugar que um corpo cansado poderia merecer em todo o planeta. Divanei armou seu abrigo rápido demais e desfaleceu sem querer saber de jantar, Trovo deu um jeito de erguer sua "casa amarela" na encosta superior do local, estiquei minha cobertura de lona sobre minha rede, depois fui ajudar o pobre coitado do Tony a conseguir algo que lhe permitisse ao menos esticar o esqueleto. Foram apenas dois passos para que ele tivesse um abrigo, primeiro a lona, segundo a rede, mas a dificuldade que tivemos para concluir a tarefa foi duradoura. Ele acabava puxando mais um lado da lona deixando o outro lado quase todo descoberto, tinha que desamarrar e arrumar novamente. Como a rede seria usada pela primeira vez ele teve medo de deitar e cair, ou ela não aguentar o peso do mamute e rasgar rs. Pediu pra que eu a deixasse baixa e depois testá-la. Quando ele deitou a rede encostou no chão, tivemos que subi-la, e isso se repetiu algumas vezes. Foram tantos empecilhos que se fosse relatar com detalhes esse arquivo/texto ocuparia 1 TB do meu HD Externo, rs. Dava pra ver no rosto do garoto o quanto ele estava nervoso com aquela situação que perdurou por duas horas de luta sofrida, mas acabamos. Depois fui preparar meu jantar, Tony fez o mesmo, enquanto Divanei roncava, e Trovo não dava as caras - deveria estar comendo torta, rs. Antes das 20h todos já estavam recolhidos, Tony ainda me chamou mais duas vezes para ajeitar a rede dele, que, de quando em quando tocava no chão.
Não se ouvia nossas vozes, apenas flashes, muitos flashes de luz que piscavam naquela noite extremamente quente. Imaginei q fossem relâmpagos antecedendo a tempestade, mas era o Tony, inquieto com as intempéries que o torturavam no momento. Devido ao calor calor da noite e a proximidade com a água nosso alojamento estava dominado pelos pequenos "demônios alados." De repente, no breu da escuridão, escutei o Divanei me chamar perguntando se eu estava com a lanterna, de imediato iluminei em direção àquele senhor de idade avançada e vi uma infinidade de borrachudos rodeando seu corpo franzino. Era uma quantidade que eu nunca tinha visto antes nas vezes que fiz pernoite na Serra do Mar. Ainda mais perto das 22h, horário que eles não costumam aparecer. Divanei pegou algo em sua mochila e retornou para rede.
Os flashes continuavam frenéticos às 23h, toda hora em que colocava a cara para fora da rede eu via o Tony se estapeando ou rasgando a cara de tanto coçar por conta de uma luta desleal com centenas de mosquitos. Teve um momento em que ele viu que eu o observava, não se conteve e veio em minha direção desabafar...
... ele se dizia agoniado demaaais sem saber o motivo, e não conseguia dormir desde quando deitamos. Tinha vontade de gritar, sumir dali. Tentei acalmá-lo dizendo q também não havia pregado os olhos até então. Depois de alguns minutos de conversa ele voltou a deitar.

Não demorou muito para os flashes voltarem, mas voltaram com barulhos estrondosos que davam medo. Quando a chuva caiu fez jus à barulheira que veio antes. Foi um temporal impactante que rasgou horas madrugada à dentro, me deixando receoso, mesmo estando todos bem instalados, eu estava muito próximo ao afluente e temia que viesse alguma enxurrada e levasse meus pertences que estavam no chão. A todo momento eu conferia o nível da água. Mas tive um certo alívio quando se passava de uma hora de chuva forte e nada mudara perto do nosso acampamento. Mas, como "todo sofrimento pra corno é pouco" toda água que escorria pela árvore era absorvida pela corda que prendia a rede do Tony, e como ele não havia levado mosquetões ou argolas de metal para mudar o curso da água, ela fez seu caminho pela rede do amigo, ou seja, ele estava deitado tentando dormir e a água da chuva escorrendo pela suas costas. Que Maravilha, não? Enquanto eu estava acordado meu pensamento estava fixo no volume da chuva, e eu só rezava pra que todo aquele dilúvio da madrugada fosse toda a chuva (50mm) prometida para o domingo.

A noite deu lugar a luz do dia, e o rosto do Divanei demonstrava que a luta contra os pequenos demônios havia sido de desvantagem para nós, meros mortais. O senhorzinho que costuma se apresentar com seu rosto fino e chupado de tão magro que é, desta vez amanheceu com uma cara que parecia com a cara de um obeso mórbido em fase avançada. Estava todo inchado, desconfigurado. Ele ainda se queixou de algum infeliz ter mudado a posição de sua lona ao esticar um cordinha sob seu teto. Isso fez um acúmulo de água sobre seu teto que mais tarde veio a molhar sua rede.
Retirando as remelas dos olhos deu pra perceber melhor o que aquela manhã cinzenta tentava nos dizer. Estávamos na cota 350, na média altura da terceira queda da CACHOEIRA NEBLINA DO GUARATUBA - uma formação brutal de três grandes quedas d'água de por medo em qualquer marmanjo barbado. O bom era que já havíamos vencido a grande parte de seu desnível, mas ainda tínhamos resquícios de sua dificuldade a transpor. Então recolhemos acampamento depois de tomar um "cafézin da manha" e voltamos para mais um dia de batalha. Estávamos emparedados por uma muralha que segue paralela ao lado oposto do afluente até sumir de vista mata à dentro, escalar era impossível, além de ser completamente vertical não se via nada de tão seguro onde nos agarrar. A solução foi encarar o contra fluxo do afluente até acharmos um escape. Subimos bastante, pulando de rocha em rocha, até esbarrarmos em uma cachoeira de uns 10 mts, onde tivemos que encontrar alguma via pela esquerda, já que na direita ainda se estendia a "muralha da China". Aparentemente seria algo tranquilo a ser feito, mas ao tentar ascender às primeiras rochas vimos q se tratava de encostas tomadas por pedras escorregadias, cheias de limo e vegetação rasteira solta, onde o avanço era de 2 mts com um retrocesso de 3 mts, ou seja, sobe três passos, volta cinco ainda tendo de enfrentar um vara mato dos infernos, quase impossível de prosseguir. Mas ao chegarmos no topo da cachoeira vimos que o paredão estava se igualando com a altitude do afluente, e que teríamos um pouco a mais pra subir em uma piramba que nos levaria à crista. Ganhamos uma altitude considerável, mas fomos de passo após passo caminhando sobre a crista que nos barrava a passagem, e essa mesma crista foi embicando em direção às profundezas do Vale (aos pés da Cach Neblina do Guaratuba), mas seria algo para nos liquidar, então paramos na borda do precipício para registrar com fotos e vídeos a potência devastadora daquelas três quedas gigantes. Toda inclinação era forte e pendente à graves acidente se houvesse qualquer descuido, mas éramos obrigados dar os passos na perpendicular até sairmos da linha dos desfiladeiros entre as cotas 350 e 280, onde o rio começava a ficar menos caudaloso e tendo sua perda de altitude mais branda. 
A fera começava a recolher garras, e isso nos motivava a querer andar no leito. O pula pedra começou a ser frequente, pra variar um pouco tentamos atravessar para a outra margem do rio mas sem resultado duradouro. Em menos de 10 min os paredões da direita nos forçaram a manter nossa caminhada pela margem esquerda, onde tudo fluía bem. Exceto vez ou outra que surgia pelo caminho alguma rocha enorme, as quais tínhamos que contornar entrando na mata. E foi nesse entre e sai pelas árvores que tivemos o privilégio de encontrar "duas cavernas" que serviriam de abrigos naturais para qualquer situação emergencial, ou não. Na cota 200 encontramos o único lugar decente para montar acampamento em todo aquele Vale, era um terreno incrivelmente plano, repleto de árvores fortes e com um belo espaço para fazer as amarrações necessárias. Uma pena não termos chegado até ali no dia anterior, há 2 hrs de onde repousamos, seria o cenário prefeito para ver ao acordar pela manhã. Divanei não pensou duas vezes, logo se encarregou de instalar A CÁPSULA DO TEMPO, mesmo sob a leve chuva que começava a cair, não poderia deixar em outro lugar.
Eu mencionei estar aliviado quanto aos grandes desafios, mas o Trovo refrescou minha memória ao lembrar que em outro rios há obstáculos de respeito já na cota 200. Mesmo assim seguimos em paz saltando de pedra em pedra sobre aquele rio manso que até pouco tempo o tínhamos visto furioso. Ele ganhara uma cor caramelo e seu leito a partir dali era raso e largo, o que o tornou mais bonito. Ainda teríamos muito por caminhar naquelas condições e isso demoraria muito, mas, vez ou outra, quando a gente contornava alguma rocha e entrava na Mata encontrávamos algum leito de rio seco, plano, largo e sem intempéries pelo caminho. Era o vento soprando à nosso favor, toda vez que isso acontecia nos rendia uma jornada, um longo tempo sem ter que voltar pra água. Assim seguimos até o ponto em que o Guaratuba faz um curva brusca para esquerda e se volta para direção contrária (subindo), para o planalto, mas logo volta a correr na direção do mar. Ali encontramos uma trilha descendo, deduzimos que seria para cortar aquele ziguezague - fomos por ela, e quando surgiu uma bifurcação tocamos para o sentido óbvio. Logo a trilha encontra o rio, parecendo outro, raso e arenoso sem qualquer vestígio de pedras que tanto haviam dentro dele. A trilha continuava no lado oposto, atravessamos e andamos um pouco pelas belas prainhas formadas por grandes bancos de areia, mas seguir por elas, ou chapinhar pela água iria demorar demais. Decidimos continuar pela trilha, que nos levaria por quilômetros sem parar. Lembro de o Divanei mencionar que não adiantaria a gente "correr" pois não teríamos ônibus para voltar para São Paulo se chegássemos em Bertioga tarde da noite. Fazia sentido toda aquela preocupação, então seguimos preparados para fixar abrigo assim que encontrássemos alguma clareira apropriada para descansarmos por mais uma noite e irmos embora no primeiro horário com luz na manhã seguinte. O que causou estranheza foi o fato de não haver nenhum descampado em uma trilha tão aberta e próxima da civilização, cota 20.
Como não haveria mais nada de tão grandioso até o final da trilha trarei de guardar meu celular na mochila estanque por a chuva havia voltara a cair, por isso imprimimos um ritmo forte e constante, sem pausas. A gente via o rio correr ao nosso lado esquerdo, horas por entre as árvores, hora bastante exposto, e quando o cenário de abriu em um enorme descampado pude imaginar que já teríamos avançado além do poderíamos estar pensando. Pena que era um descampado impróprio para nosso repouso, era apenas um ponto de referência marcado no tracklog.
Ao completarmos pouco mais de duas horas ininterruptas de pernada pisei o pé no freio do bonde e pedi a parada de cinco minutos. Já estava ficando cansado física e psicologicamente. Larguei a mochila no chão enquanto dois dos amigos jogaram seus próprios corpos ao chão, estávamos destruídos. Ao conferir nossa localização no GPS fiquei pasmo, apenas pedi que meus amigos olhassem onde estávamos. Questionaram com ansiedade, mas pedi-lhes que vissem com os próprios olhos. Inacreditavelmente, estávamos à 200 mts da picada final que nos levaria ao Condomínio Morada da Praia - nossa porta de saída do submundo selvagem, bastava encontrá-la na outra margem. 
Quando pulamos novamente pra dentro do rio tivemos um pouquinho de dificuldade para seguir no caminho correto, já que a trilha se manter à vista por um curto trecho, depois nos vimos obrigados a voltar ao rio. Mas algo parecia errado, obviamente a trilha deveria continuar visível naquele ponto. Voltamos e, vasculhando o caminho, achamos a continuação da danada, porém no sentido contrário, subindo o rio. Seguimos em frente, mesmo com dúvidas, na pior das hipóteses teríamos que varar mato até encontrar alguma rota viável. Por um longo momento o Rio se fez visível à nossa esquerda, o que nos deixava mais duvidosos sobre aquele caminho, mas ao observar direito estávamos acompanhando o fluxo da água, e isso nos aliviou um tanto. Voltei a andar com o aparelho na mão para poder conferir nossa localização. 
Depois de quase 2 km caminhando de mãos dadas com a ansiedade começamos a ouvir vozes. Na mente já vinha a cena de quatro pais de família farejando um muro alto procurando a melhor maneira de pular sobre os arames fardados e/ou cercas elétricas, mas, pela graça daquele que nos protege não há muro algum, a muralha que rodeia o condomínio é natural, composto apenas pela mata atlântica. 
Respiramos fundo e enfiamos nossas caras, sujas e inchadas, para dentro de um mundo onde meia dúzia de pessoas nos viam com olhares carregados de expressões que não dá para descrever. A nossa sorte foi que se tratava de um domingo "frio" e chuvoso, o que deixou o conjunto habitacional luxuoso com poucas pessoas pelas ruas, e mesmo assim tivemos medo de sermos pegos por algum guardinha que faz ronda local. Um deles passou por nós de moto e nos cumprimentou, moradores e seus convidados talvez se assustaram com o que viam: quatro homens usando perneiras, mochilas sujas e molhadas, um deles usando capacete e colete salva vidas. Meu Deus, o quê aqueles almofadinhas deveriam estar pensando da gente? Talvez se sentissem ameaçados, mas não sabiam que mesmo sendo invasores nós éramos a caça, vigiados a cada quarteirão por câmeras instaladas no alto de cada poste. Parecia um Big Brother. Essa tensão seria eterna por 5 km, mas ao vermos outro ônibus na lista oposta tínhamos a certeza de que ele voltaria passando onde estávamos. Decidimos para e esperar, ajeitar as roupas e mastigar alguma coisa que não fosse torta, rs. Quando veio o coletivo fiz sinal de parada para perguntar ao motorista se o destino era Bertioga, ele disse que não, pois o ônibus é de circulação interna nas dependências do condomínio. Abriu a porta de trás de nos deu aquela carona que todo aventureiro sonha em conseguir ao término de sua aventura.
Passamos pela portaria principal ainda com receio de termos daquela dor de cabeça que tem os INVASORES DE PROPRIEDADES quando são pegos, mas saímos lisos, sãos e salvos, vitoriosos e felizes por poder olhar para trás e ver que enfrentamos um monstro feroz, e que o vencemos sem precisar matar, ou o ferir aquela fera. Apenas dominá-lo.

Fim.

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