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Indonésia - A Chave de Ouro


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A Indonésia foi o último país da minha volta ao mundo. De Hanói eu peguei um avião para Jakarta. A capital se situa na ilha de Java e é um aglomerado de 20 milhões de pessoas. País de maioria muçulmana, conta com forte presença budista sobretudo em Bali. A Indonésia é um país extremo, ariano, fogo e conta com mais de 17 mil ilhas, sendo o maior arquipélago do mundo. Com mares revoltos e dezenas de vulcões, muitos deles ativos, não é raro populações inteiras serem deslocadas devido a uma erupção. O país é ótimo para um explorador que gosta de se aventurar pela natureza, seja mergulhando, fazendo trekking pelos vulcões ou conhecendo os dragões de Komodo.

 

Em jakarta, eu tive duas ótimas surpresas. A primeira delas é que eu cheguei justamente no último dia do Ramadã, mês sagrado para os muçulmanos, então o país estava em festa. Segunda, que reencontrei Lirón da Dinamarca que havia conhecido no Egito, 8 meses antes. Sem combinar nada, nos encontramos à noite em uma das milhares de ruas da capital. Santa Sincronia. Fomos celebrar juntamente com Ferry, holandês que também tinha acabado de chegar no país. Mas não perdi muito tempo por lá, logo segui de trem para o interior da ilha, em busca dos vulcões. Yogyakarta foi minha próxima parada. Apesar de ter ido só, reencontrei Ferry por lá, Lirón ficou em Jakarta.

 

Na manhã seguinte eu fui de bicicleta até Borobudur, templo budista Mahayana do Século IX. A trip rendeu no total 100 quilômetros feitos em aproximadamente cinco horas. Valeu a pena. O templo é realmente interessante, apesar de uma multidão visitá-lo todos os dias. De volta à cidade, fui a um restaurante tomar um café e escrever um pouco. Então comecei a conversar com Devi, que trabalhava por lá. Eu disse que era brasileiro e para minha surpresa na mesma hora ela me convidou para sair. Perguntei se ela não estava em horário de serviço, mas ela disse que o trabalho era bem flexível hahaha. No dia seguinte eu sai do hotel e me “mudei” para a casa dela.

 

Nós fomos então conhecer o famoso vulcão Merapi, o mais ativo da Indonésia, com 2968 metros. Eu fui dirigindo a scooter dela e Ferry foi com sua namorada em outra moto. Saímos dez da noite da cidade para uma trip de 3 horas até a base do vulcão, de onde então começaríamos a caminhada. Nos perdemos várias vezes pelo caminho e o frio só ia aumentando conforme íamos subindo pela estrada. Ferry estava congelando. Chegamos por volta das 2h da manhã e nenhum dos três teve coragem de começar a subida. Eu fui sozinho. Eles ficaram dormindo lá na base. Após 3 horas em um forte ritmo alcancei o topo do vulcão. Uma dezena de pessoas já estava por lá. O visual é inacreditável e é possível ver a lava borbulhando no meio do vulcão. Não pareceu muito seguro hehe, mas como experiência valeu muito a pena. Desci em uma hora e reencontrei Devi sonolenta me esperando por lá. Ferry e sua namorada já tinham se mandado. Eu estava morto de sono e como voltei dirigindo, paramos em um café para descansar. Após recuperar o fôlego, voltamos então para Yogyakarta.

 

A cidade é bem peculiar: conta com uma avenida central estilo 25 de março repleta de lojas, com milhares e milhares de pessoas dia e noite vagando por lá. Sem moto é difícil se deslocar na cidade, como Devi tinha duas eu consegui visitar alguns pontos turísticos enquanto ela estava trabalhando. Nós também aproveitamos o calor para ir à praia que fica há duas horas de lá. Confesso que nem me arrisquei na água, nunca vi mar tão revolto como aquele. À noite fomos ao Ramayana Ballet que conta a história do casal mais famoso do mundo oriental: Devi e Rama, mesmos nomes nossos, Devi e Rama, como eu custamava ser chamado por lá. O curioso foi que choveu durante o espetáculo e como era a céu aberto todos continuaram assistindo o show de guarda-chuva, inclusive a gente. No total fiquei oito dias em Yogyakarta, apesar de ter planejado apenas dois. Devi tinha que retornar para Brunei onde trabalhava e eu então acabei seguindo viagem para Bali. Nossa despedida foi em um show de Reggae que rolou no Rasta bar, no centro da cidade. Antes de chegar à Bali, fiz uma visita a Ijen Crater, famosa pelos trabalhadores que coletam enxofre das paredes da cratera. Ganhando cinco centavos por quilo coletado, eles vivem em regime de quase escravidão. Há também um grande lago de enxofre na base da cratera famoso pelo fenômeno do fogo azul, gás sulfúrico inflamado que aparece durante a noite e atrai milhares de visitantes.

 

Bali é uma ilha exótica, mas super turística. De maioria budista, os habitantes mantém as tradições de longa data. Suas praias são convidativas para surfar, logo aluguei uma prancha e fui me aventurar na praia central. Ocorre que o mar é sempre traiçoeiro e as correntes de retorno (rip currents) me levaram quase para alto-mar. Sem conseguir voltar, comecei a acenar para os últimos surfistas que já pareciam bem longe. Esperei um pouco e não tentei ir contra a corrente, apenas relaxei. Depois de alguns minutos, comecei a voltar vagarosamente e por sorte consegui chegar até a beira. Alguns surfistas me ajudaram no retorno. Eu já estava quase com hipotermia. Mar é coisa séria.

 

A ilha conta infelizmente com muitos policiais corruptos. Eu dirigia uma scooter quando um policial se aproximou dizendo que eu havia cometido uma infração: virei à esquerda e depois voltei para a principal já que eu tinha errado a rua. Me mostrou um desenho de uma moto fazendo isso com um X dizendo que não era permitido. Logo me pediu dinheiro, creio que 20 dólares. Ele segurou a minha carta e eu me recusei a pagar. Então ele disse que eu teria que ir até o juiz para pegá-la de volta. Como não queria enfrentar esta burocracia, ele disse que eu poderia ter a carta de volta caso pagasse. No fim das contas, deixei 10 dólares com ele, mas tratei logo de sair daquela ilha. Fui para Lombok.

 

A ilha é bem mais interessante que Bali e atrai menos turistas. Fui fazer um trekking no segundo vulcão mais alto do país, Monte Rinjani. A 3726 metros, ainda está ativo e acidentes fatais não são raros. Geralmente se recomenda 3 dias para chegar ao topo com 2 pernoites na base dele. Porém eu resolvi subir em apenas uma noite e mesmo os guias se recusaram a ir comigo dizendo que era impossível. Então comecei às 20h guiado apenas pelo GPS. À meia-noite encontrei dois indonésios perdidos ainda no platô, eles tinham ligado para os seguranças que logo chegaram de moto. Eu disse que estava indo rumo ao pico e eles então decidiram me seguir após uma conversa com os seguranças. Mas logo ficaram para trás, já que estavam num ritmo muito mais lento e aparentemente relembraram o caminho. A trilha é bem árdua sobretudo se for fazer em apenas uma noite. A última parte é realmente desgastante. Como a trilha até o topo é de pedras soltas misturadas com areia e cinzas vulcânicas, cada passo acima é dois abaixo. Mas eu fiz isso e às 7h da manhã cheguei finalmente ao pico. A paisagem é fantástica e também é possível ver o vermelho-fogo da lava no núcleo. Após fotos e um lanche rápido, voltei até o início, dessa vez em apenas 3 horas. Não recomendo obviamente que alguém vá sozinho e em apenas uma noite, a não ser que saiba muito bem o que está fazendo, até porque é comum mortes de estrangeiros por acidentes nessa montanha.

 

Feito isso fui para Gili, famosas ilhas cuja circulação de motos e carros é proibida. Um paraíso, porém completamente lotado, estilo Guarujá. Fiz um mergulho, porém a visibilidade não estava muito boa. Mas valeu a pena o pôr do sol, que é fantástico. Voltei para Lombok e logo me dirige a Lakey Beach, paraíso dos surfistas no meio da ilha. Fui como sempre com um francês, Gil. Dividimos uma pensão e no dia seguinte fomos tentar surfar. De longe, as ondas não pareciam tão grandes, porém in loco eram imensas para um surfista iniciante. Gil foi na frente e quando eu entrei no mar, ele estava branco. Ele apenas me olhou e disse: elas são muito grandes, cara. E realmente eram. Tentamos por uma hora mais ou menos, mas eu só engoli água e levei caldo. Em uma delas fiquei quase 1 minuto submerso, não conseguia subir de jeito nenhum e quando voltei à superfície, outra onda veio e mais um minuto submerso. Realmente é preciso ter peito e respeito para surfar.

 

A última parte da trip foi na Ilha das Flores, pertinho da Ilha de Komodo, do famoso dragão. Mergulhar por lá é divino. Em um dos mergulhos que fiz, fiquei lado a lado com 3 tubarões. Realmente incrível. Fui então conhecer os perigosos dragões de Komodo, que para minha surpresa ficam bem próximos das instalações dos guardas que tomam conta do lugar. Era meio-dia e eles estavam deitados embaixo da estrutura da cozinha que era elevada. Estavam tirando uma soneca. Mas não se engane, são venenosos e caso alguém seja atacado, tem 24 horas para ir ao hospital, do contrário morre. Geralmente eles evacuam a pessoa de lancha super rápida até Bali.

 

No dia 7 de setebro, dia da independência, peguei então o avião de volta ao Brasil. O avião não, cinco aviões, foram 48 horas de viagem de onde o vento faz a curva até São Paulo. Era hora de voltar pra casa depois de quase um ano e meio de aventuras. Ainda no aeroporto da Ilha das Flores, havia uma sacada no segundo andar e todo mundo que estava ali, indonésios e indonésias, acenaram para mim dizendo adeus enquanto eu andava até o avião. Eu senti como se fosse realmente o encerramento de um filme que foi filmado durante toda essa minha viagem. Valeu muito a pena e eu faria tudo novamente.

 

Viajar o mundo não é perigoso como se pensa, aliás o maior perigo é ficar preso, não em um lugar físico, mas dentro de si mesmo, da sua jaula mental, dentro de preconceitos, idéias fixas, condicionamentos e mentiras que tomamos como verdade. Não acredite na tevê quando diz que o mundo é perigoso, não acredite em seus pais quando dizem para não falar com estranhos, duvide até mesmo de você quando acha que não pode fazer algo, mesmo querendo fazer. O mundo é como uma pedra de amolar, afia-nos ou desgasta-nos conforme o metal que somos feitos. Não deixe o tempo passar sem que você faça algo com ele, não queira sentir a dor do adiamento. O mundo está aí apenas esperando para ser descoberto, dia após dia, é possível se encantar e se maravilhar com o que ele nos oferece. Sabedoria é encontrar o divino no profano, o fantástico no cotidiano e a verdade no engano.

 

Lucas Ramalho

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