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Circuito: 4 Cumes de Biritiba (Biritiba Mirim/SP)


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A Pedra do Sapo, com seus 990 metros de altitude, é a “queridinha” de Biritiba Mirim, e mesmo não sendo um atrativo de grande porte, acaba atraindo visitantes de várias áreas esportivas: caminhantes, ciclistas, escaladores. Uma vasta variação de atletas amadores. E como a visitação é livre, de acesso fácil e baixo custo, até a “turistaiada” frequenta o local. Seu formato rochoso, surpreendente, realmente lembra um sapo, e a melhor forma de se ver isto é estando sobre a Pedra da Forquilha, à oeste do Sapo.

Facilmente, conversando com os trilheiros, e praticantes de rapel, que se encontram com frequência no local, se ouve alguém comentando sobre outro pontos mais altos nas proximidades, que tem muita coisa a ser explorada na região, e blá, blá, blá. Os mais mencionados são: Pico Itapanhaú e Pico do Garrafão. Mas o povo nem faz ideia da localização, ou qual a direção tomar para chegar à esses picos. Pensando nisso, e lembrando que poucas pessoas do “mundo do trekking” dão atenção àquele cafundó, decidi fazer algo diferente por aquelas bandas, e interligar todos esses picos numa pernada só. Concluindo assim, o Circuito dos 4 cumes de Biritiba Mirim. Algo parecido foi feito no ano de 2015, quando, junto a mais 4 amigos, fizemos um circuito tríplice, excluindo da lista o Pico do Garrafão. E hoje, ano de 2016, com ambições um pouquinho maiores, a ideia foi ligar todos o pontos mais altos em uma caminhada só. Vamos ver no que deu...

 

 

Relato

 

Ferraz de Vasconcelos/SP, 25 de Maio, de 2016 - 12h20 (véspera de feriado).

 

Recebo uma ligação, e com ela a boa notícia de que eu teria os primeiros 2 dias do feriado prolongado, livres. Mas vem cá...

 

Ficar sabendo (ao meio dia e vinte, de uma véspera de feriadão) que você vai ficar em liberdade provisória, é uma boa notícia?? Pra mim é a mais pura sacanagem! Pois não dá tempo de se preparar para nada, definir um destino, organizar logística, carregar a cargueira, convidar amigos, coisa e tal. Mas, mesmo assim, eu achei bom! rs

 

Itinerários são milhares, mas com tempo pra lá de corrido entre as tarefas do dia a dia, me contive a me encaixar em alguma coisa que não fosse tão longe, nem tão caro.

O início da temporada do “montanhismo” brasileiro já vinha dando as caras, mas o meu fascínio em explorar os grandes rios da Serra do Mar não me deixavam ver isso. Acredito que essas folgas surpresas vieram para abrir meus olhos para esse lado que não exige logísticas tão elaboradas. Sendo assim, sabendo das possibilidades de não conseguir companhias, convidei geral. Criei um evento na principal rede social mais usada no momento, onde temos uma infinidade de aventureiros ávidos por um contato com a mãe natureza. Mesmo com tal infinidade, obtive uma esmagadora avalanche de NÃO. Por que? Alguns estavam doentes, outros trabalhando, e outros com viagem marcados para grandes travessias, e outros dando desculpas esfarrapadas, rs. A única pessoa que se manteve firme e forte, até o fim do propósito, foi a Ana Caroline, que, desde que leu o relato do CIRCUITO DOS 3 CUMES, demonstrava interesse em percorrer tal caminho. Caso ela não fosse, eu já estava conformado com tanto não, e me preparava para ir sozinho se fosse o caso. Pois já não aguentava mais ficar, incríveis 15 dias, sem percorrer os caminhos que tanto me atraem na Mata Atlântica.

 

Como eu já conhecia a região e o tempo estimado de caminhada até os primeiros pontos de interesse, programei o encontro às 09h20, na Estação Estudantes da CPTM. Pois o próximo ônibus com destino a Manoel Ferreira sairia do terminal rodoviário às 09h35. Quando bateu esse horário, a Ana desembarcava do trem, e eu, na plataforma, esperando há pouco mais de vinte minutos, já estava crente que perderíamos busão e teríamos que aguardar mais 1h30 até a saída de outro ônibus com destino a Manoel Ferreira. Ao atravessar a rua, depois de sairmos da estação, vi o ônibus recebendo o embarque de um último passageiro e se preparando para partir. Corre que dá tempo, Ana - disse à ela. Corremos mais que o Claudinei Quirino, assobiei feito um louco, e fiz sinal para que nos esperasse. E pouco depois de partir, fez um retorno fora de seu itinerário, só para não perdermos aquele Bus. Eeeita, Motorista gente fina da moléstia. rs

Depois de 50 minuots dentro daquele latão que chacoalhava mais do que cintura de rainha de bateria, saltamos no ponto final. E enquanto ajustámos os últimos detalhes, uma prosa amistosa com o Motô, só para retribuindo a gentileza.

 

Demos início a caminhada, às 10h40, pela Estrada de terra que acompanha a tubulação de água que a SABESP usa para interligar o reservatório Rio Claro, que fica entre Biritiba Mirim, Salesópolis e Casa Grande, à outra extremidade, à oeste, em Taiaçupeba. Essa estrada segue por cerca de 3 quilômetros sem oferece qualquer dificuldade ou risco com carros passando em alto velocidade, assaltos ou qualquer anormalidade que encontramos na capital. Sem sobe e desce, por enquanto, serve como um preparatório aos “cambitos,” e um ótimo palco para reforçar os vínculos de amizade de quem a percorre. Sítios e fazendas em ambos os lados são os adornos típicos de área rural. Inclusive, uma plantação de pimentão nos chamou a atenção, pois estava à beira da estrada e sem nenhuma proteção, cerca, ou cuidador por perto. Não resistindo à tentação, peguei dois que estavam caídos no chão, um vermelho e outro verde, para incrementar nossa janta. hehehe

Depois disso ignoramos as vias que seguiam a esquerda, chegamos na porteira grande de madeira, que barra o caminho de quem chega de carro, e assusta os mais medrosos com uma placa que avisa sobre a presença de CÃO BRAVO. Ainda bem que é alarme falso.

A porteira barra os carros, mas deixa suas laterais abertas para quem passa à pé. Assim, se chega na propriedade por um corredor cerca de mata e marcas de pneus no solo. A chácara está sempre vazia, pois a dona deixa o lugar aos cuidados do caseiro (Sr. Raimundo), que quando está presente até permite a passagem, mas se flagrar alguém entrando sem aviso prévio, e estando de mau humor, vai falar até não querer mais. Por isso, passamos a falar baixo, na intenção de não chamar a atenção. Pois havia um carro parado na porteira, e isso trouxe o receio de que os donos estivessem por lá. Mas pude sanar a dúvida quando olhei a placa do carro, que registrava ser de Suzano.

 

A trilha começa logo ao lado da casa principal, subindo entre um caminho estreito, e pouco notável, na mata fechada. O bom de ir até a Pedra do Sapo por essa trilha, é isso: estar sempre sob a sombra da mata fechada, enquanto por outras trilhas e estradas nos arredores levam ao cume da pedra sob céu aberto. Estando sol, amigo, vai fritar.

O peso que a Ana carregava era bem maior do que o meu. Ela carregava uma mochila cargueira de 60 litros, enquanto a minha era de apenas 35 litros. Ela levava 3,7 litros de água, enquanto eu levava 500 ml, fora a quantidade exagerada de comida que ela costuma carregar, enquanto eu prefiro racionar um pouquinho para ganhar leveza na mochila. Claro, como cavalo que sou (ops, cavalheiro), me propus a levar sua mochila inúmeras vezes, mas a bicha é carne de pescoço. Não se sentiria digna de estar levando um peso, e deixar para outro carregar. Ela encarava todo esse sofrimento como um treino para travessias de maior porte. Que bom. rs

Não deu nem 10 minutos de subida leve, e ela já parava para descansar e beber água. Logo que continuamos, ainda subindo, passamos por um bambuzal à nossa direita, e em seguida, viramos em uma bifurcação no mesmo sentido. Até ali, tudo bem, eu estava reconhecendo o caminho no qual passei há 2 anos atrás, quando estive na Pedra do Sapo pela primeira vez.

Depois de continuar, a partir dali em terreno plano, pouco depois passamos por uma picada à canhota, observei, mas só olhei e decidi seguir a caminhada em linha reta. Comecei a suspeitar que estivesse num caminho diferente do desejado, e logo que começou a descer muito e a mata fechar bastante, tive a certeza de que não era para ignorar aquela entrada minutos antes. Chegamos em um ponto onde um pequeno riacho, tímido e sem barulhos, correndo lentamente aos pés do morro. Uma pequena barragem foi improvisada, com sacos plásticos empilhados e recheados com terra, para que algum frequentador da região fizesse proveito. Isso fez com que a gente desse meia volta, e retornasse até a parte plana novamente, pois em todo o trajeto de ida da vez anterior não haviam pontos de água. Retornamos e entramos pela picada que ignorei.

O caminho também faz uma leve descida, nivela e toma a direção oposta da desejada, vai se afastando cada vez mais, só pra aumentar o pontinho de dúvida que surgiu na cabeça. Depois de termos andado um bom pedaço de trilha, um novo barulho de água aparece mais forte, e a dúvida triplica. Cheguei ao ponto de pensar: nossa, Vagner, que lixo. Se enfia nos ambientes mais hostis da Serra do Mar desbravando rios caudalosos, pra se perder aqui!? Francamente, que vergonha, viu!? O caminho continua sempre bem batido, sempre bem pisado e sombreado pela densa mata, segue em direção suspeita, Mas quando aponta novamente no rumo certo começa a subida.

 

“anda, para e descansa;

sobe, para e mija.

anda, para e descansa;

sobe, para e bebe água.”

 

Assim foi nosso passo a passo durante a insistência de permanecer no mesmo caminho, e não voltar atrás.

Pouco depois de passar por uma grande rocha que escorria água, paramos em uma “encruzilhada” que me refrescou a memória e me fez voltar o ânimo. Dei uma olhada na via da esquerda, mas o que vi foram apenas rochas paralelas formando um pequeno vale seco. Depois disso descemos uma leve inclinação, para depois subir de vez e chegar até o topo da Pedra da Forquilha, que dá a visão perfeita da Pedra do Sapo. Isso, duas horas depois de termos iniciado a caminhada lá no ponto final do ônibus.

Havia um pequeno grupo praticando rapel, e com eles, um cachorro preto, grandão e bonito. Se tratava do Buddy, um cachorro de um dono que mora ao lado do início da trilha, e vez ou outra acaba subindo até a Pedra do Sapo junto com os trilheiros.

Lá, ficamos por um bom tempo admirando a vista sob tempo aberto, descansando, conversando com a galera da equipe Sentido Obrigatório e tentando comer alguma coisa, mas o Buddy não deixava, rs. Em qualquer vacilo, ele já dava um bote, e lá se vai um lanche, iogurte, bolacha. Tudo ele devora. Até banana com casca.

Quando fomos subir no sapo, Buddy foi com a gente. Outro grupo comia às escondidas, mas o canino esfomeado tratou de achá-los rapidinho, e deu um trabalho para eles conseguirem comer sossegados. Nossa permanência ali não foi tão longa, e quando bateu 14h10, já estávamos nos pirulitando no primeiro lance de corda da face leste do Sapo. Um trechinho que requer atenção, pois é úmido e escorregadio demais.

Já com os pés em solo firme, passamos a andar na trilha que segue aberta e sem dificuldades. com 5 minutos caminhados, entramos na discreta picada à esquerda, fomos ao mirante ver as duas pedras por um ângulo diferente, tiramos algumas fotos e logo voltamos à trilha principal. Mais 5 minutinhos de trilha, e começa um grande lance de cordas que auxiliam a grande demanda de pessoas que usam aquela via para acessar o cume. São mais de 50 metros de corda, de 6mm, que servem como corrimão de apoio. Quando esse lance de cordas acaba, ainda temos uma bom trecho de ladeira pra descer, com o peso das mochilas e o impulso que se toma, fica até difícil para em alguns pontos.

Terminado o episódio das corridinhas ladeira abaixo, a trilha encontra com uma tangente, onde pegamos a esquerda sobre um curto trecho de terreno plano, para depois voltar a descer e correr sobre a piramba, rs. Não tem como se perder por esse caminho, está tudo, visivelmente, bem pisado, e não é necessário sair entrando nas bifurcações que estão quase apagadas pelo caminho.

Levamos meia hora para descer até o fim da trilha, que acaba numa estradinha de terra, onde pegamos a direita e seguimos até a próxima bifurcação à direita. Nesse trecho há três riacho que passam por baixo da estrada, sendo possível abastecer as garrafas, ou cantis.

Tudo que se vive até esse ponto é um passeio no parque. Mas, quando chega a bifurcação das estradas onde devemos começar a subir, dá até medo de encarar. A segunda maior parte de esforço físico do circuito está, entre o início dessa subida e o cume do Pico Itapanhaú. O próximo objetivo.

Por cerca de 300 metros ainda é possível captar água no riacho que desce pela marginal direita da estrada. Deve-se pegar o suficiente para beber e cozinhar, já que é ali sua última fonte de água até o dia seguinte. Quando não ouvir mais a água por perto, prepare-se, o bicho vai pegar.

A estrada começa a ganhar uma inclinação absurda, que se esconde a cada curva que serpenteia o trajeto sinuoso. A energia começa a esvaecer a cada “fungada” buscando o ar para aguentar o tranco. A Ana sofreu nesse trecho! teve que parar por várias vezes, pois a bronquite, o peso, a subida, e o calor faziam com que andássemos 3 minutos e parássemos 10. rs. Eu seguia um pouquinho à frente para conseguir registrar a perspectiva da piramba em fotos. Parece um ascensão interminável, que apontar na direção do céu e toma seu rumo, tem uma breve pausa em terreno nivelado, e volta a subir, subir e subir. Logo que se faz uma curva bem fechada para direita a estrada volta a ganhar terreno plano novamente, e antes de voltar a subir, do lado esquerdo tem a entrada da trilha que leva até a Pedra da Esplanada.

Quando fiz uma pausa para mostrar a picada que entraríamos à Ana, vi que 3 homens desciam no sentido contrário. só deu tempo de dizer:

 

- poucas ideias. A gente só cumprimenta e continua.

 

Quando foram chegando mais perto, deu para reconhecer o J. Augusto, um dos maiores caminhantes desse Brasil. E o que era para ser apenas um cumprimento cordial, se tornou uma longa prosa com trocas de informações sobre trekking. Foi muito gratificante! E como não poderíamos retardar nossa caminhada, seguimos.Pouco depois batalha contra aquela subida vai chegando ao final. O terceiro, e último, lance nivelado dá lugar a uma descida e volata a subir de maneira menos agressiva, ziguezagueando o entorno do pico.

 

De frente para a Torre de Telecomunicações deu para ver que o reforço com a segurança havia aumentado referente a visita que fiz anteriormente. Cercaram todo o lugar com cercas elétricas e arames ouriço (altamente cortante), mas não adiantou muita coisa. Deixaram o portão aberto. kkk

Ainda era 16h50, e ao subir em um pilar de concreto já deu para ver um imenso tapete de nuvens vindo do leste e cobrindo a parte mais baixa da região montanhosa. E com o sol em alto clarão, ainda. Foi energizante sermos recepcionados por uma cena como aquela. Só deu mais gás ao meu plano: escalar a torre de 60 metros para poder ver o pôr do sol lá do alto. A Ana topou de primeira.

Largamos as mochilas no chão, espalhamos as tralhas e montamos acampamento. Já era hora de subir, mas a esfomeada queria comer alguma coisa, e resolveu fazer um macarrão instantâneo. Até que eu esperei um pouco, mas percebi que não sobraria tempo suficiente para escalar toda aquela estrutura de metal e ver o sol se pôr. Iniciei a subida, degrau pós degrau, segurando apenas nas finas barras e sendo amparado por arcos de ferro que fazem a segurança de quem sobe.A cada lance de escada (são 12 lances), o cenário se mostra surpreendente, a massa de nuvens já toma quase por completo o que se vê de lá de cima. Quando cheguei no topo, cansado e ofegante pelo desgaste, rapidez e esforço (idade mesmo, rs), ainda consegui ver meia bola de cor alaranjada se escondendo no horizonte branco. Um patamar abaixo já estava Ana, assistindo o espetáculo do sol. Assim que se pôs por completo, se juntou a mim, e ali pudemos ver uma das coisas mais incríveis que já vi estando em “montanhas.”

O céu ainda estava claro, as nuvens haviam coberto tudo que despontar acima de suas camadas. Apenas o pico que estávamos, e um raio de 2 quilômetros, estava visível. Ao olhar para o leste, a única coisa que se via eram nuvens a perder de vista. A sensação de encanto era de estranheza ao mesmo tempo. Pois aquela imensidão nos fazia crer que estávamos em um cenário de contos infantis, onde não tinha chão, não tinha teto, ou qualquer matéria. Tudo parecia tão palpável, tão próximo e seguro, que dava vontade de se jogar, deitar sobre as nuvens. Foi algo inexplicável.

 

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Mas nada é tão bom que não dure para sempre!

 

Logo chegaria a noite, e com ela o perigo de descermos aqueles degraus no escuro. Esse pensamento acelerou nossa retirada. Mas antes disso, uma massa mais espessa de nuvens chegou rápido até o ponto em que estávamos e complicou um pouco a situação. Aquela infinidade de micro gotículas que vagam com o nevoeiro abraçaram a torre, fazendo com que cada degraus ficasse ensopado de água, escorregadio e gelado feito gelo. Perigo total.

Não demorou muito, e enquanto descíamos, chegamos na metade da torre e fomos pego pela névoa que foi capaz de nos fazer sentir o choque térmico com a queda brusca de temperatura. Era difícil ver o quanto nos restava descer.

Quando pisamos em solo firme, uma luz estava acesa. Tensão total. Várias indagações invadiram a mente...

 

Será que havia chegado alguém? Um guarda noturno? Algum bando de arruaceiros que usam o lugar para uso de drogas, crimes ou coisas do tipo?

 

Quando se tem uma mulher como sua única companhia, várias preocupações atormentam a mente. Até porque, se aparecem 3 homens, em um lugar onde ninguém ouve um grito de socorro, já se imagina uma futura cena de barbárie.

Não demorou muito, a luz se apagou. Nessa hora o coração parecia uma bateria de escola de samba em ritmo acelerado, pois o cenário era sombrio, feito Sailent Hill, com uma neblina densa que nos permitia ver, no máximo, 5 metros à nossa frente. A luz se acendeu novamente, fiquei mais apreensivo do que já estava, peguei meu punhal e fomos dar um giro ao redor da casa de máquinas para ver se tinha alguém querendo nos assustar (e estavam conseguindo). Fomos “pisando em casca de ovos" e sem dar nenhum piu. E pra nossa sorte, não tinha ninguém. Mesmo assim eu fiquei arisco, olhando para todos os lados a todo instante, e isso fez com que a Ana ficasse assustada. Voltamos ao ponto de acampamento, retiramos a barraca da reta do facho de luz, mudando para debaixo da torre, comemos alguma coisinha e entramos para não sair mais. A janta ficou para ser feita no café da manhã. rs

 

Mesmo com todo aquele susto, tivemos uma noite tranquila. A não ser pelas goteiras que caiam da torre bem em cima da barraca.

Levantei às 05h40 para subir novamente ao topo da torre, com a intenção de ver o sol nascer, mas não tive sucesso. Estava tudo encoberto, não deu para ver quase nada. Sorte a da Ana que preferiu ficar dormindo. Quando voltei, me propus a fazer o almoço/café da manhã, enquanto ela tentava acordar. Ainda arisco com a situação da noite passada, fiquei com os ouvidos em alerta, pois havia uma enorme antena de telefonia largada no chão, ainda embalada na caixa, e algo me dizia que funcionários viram para montá-la. Dito e feito. Ao longe escutei algum barulho e parei para prestar atenção...

 

- o que foi, Vgn? - perguntou, Ana.

- pensei ter ouvido algum barulho de carro. - respondi.

 

o barulho sumiu, mas em poucos segundos ressurgiu. Mas só eu quem escutava ele indo e voltando em curto intervalo de tempo. Quando reapareceu mais próximo, a Ana escutou e concordou com a minha suspeita: era um veículo subindo em nossa direção.

Já fiquei imaginado o quanto iriam pegar no nosso pé por estarmos acampando em área privada, e um monte de ladainha que não dá em nada. Homens quando estão em grupos, e se sentem superiores a um grupo menor e menos ofensivo, gostam de se aparecer.

Já tínhamos começado a guardar nossas coisas, mas não daria tempo de sair dali antes da chegada deles (eu estava pensando nisso). Mas quando olhei pra Ana, vi que ela estava a milhão, toda acelerada jogando as coisas na mochila. Enquanto isso o barulho se aproximava.

Quando pegamos as mochilas e saímos correndo em direção ao portão, o veículo já estava virando a última curva, há uns 50 metros perto de nós. Eu saí primeiro, a Ana tentando sair, enganchou a mochila no portão, e a adrenalina à mil. Conseguindo desprender a alça enroscada, nos escondemos no mato e o trator passou rebocando uma carroceria com 4 homens dentro. Ufaaa... foi por pouco! coisa de 40 segundos. srsrs

Voltamos à estrada sem eles perceberem, começamos nosso retorno ladeira abaixo, e logo em seguida o trator fazia barulho de que estava retornando. Como não estávamos mais em propriedade privada, continuamos a andar calmamente, como se nada estivesse acontecido, rs. A Ana ainda queria que eu pedisse uma caroninha até a nossa próxima entrada na trilha. Apenas cumprimentei o motorista e continuamos a caminhada. rs

Pisado os primeiros passos na trilha que leva até a Pedra da Esplanada, não teve erro. O chão ainda tinha rastros de pneus da galera do MOTOCROSS que passam rasgando mata a dentro. O caminho segue óbvio e objetivo, e acaba terminando na estrada principal. Mas, como nosso rumo não era o da estrada ainda, abandonamos a principal logo que ela fez uma curva para esquerda. Uma picada nascer bem discreta, quase imperceptível em meio ao mato alto, mas não passam 5 metros que ela se abre feito mala véia.

Essa trilha ganha uma descida acentuada até alcançar uma área bem aberta, onde pegamos para direita, e sobe, sobe, sobe...

Em meia hora chegamos na parte mais alta da Esplanada. Uma pena que estava tudo tomado por neblina, e não dava para ver quase nada. Por isso, não demoramos ali, e tocamos morro abaixo para chegar até a estrada. Quando chegamos novamente na área que citei acima, pegamos a direta, e começamos a descer forte mais uma vez. A trilha segue aberta, e de repente sai da mata densa e desaparece no meio de uma imensa área de “calipal.” Mas dá para farejar o que restou do caminho que desce bastante, volta a ser trilha e tem seu fim na estrada. Fui pedir um pouco de água e buscar algumas infos de qual seria o caminho certo para se chegar ao Garrafão. O senhor que me deu água, de início foi “pé atrás,” explicou o que eu pude entender, e somando suas infos como o pouco que eu sabia sobre o caminho deu para quase se perder. rs A pernada é cansativa a partir desse ponto, pois, a estrada faz um contorno que parece querer fazer um circulo, e sempre segue com o mesmo cenário hipnótico: reflorestamento de pinos. Uma vastidão sem fim.

Com os pés rumo a uma eternidade de chão batido e pedras, serpenteando aquela fazenda passamos por algumas bifurcações, mas mantivemos sempre a direita, passamos por baixo de uma ponte, sobre/entre os aquedutos, e quando topamos com a trifurcação que confunde por onde se deve seguir, em frente a porteira amarela, escolhemos o caminho do meio. Mas, o chão mal pisado denunciava que não era por ali que iríamos conseguir alguma coisa. Só se lascar, rs.

Com a certeza de estar na direção correta, e nas terras de alguém, seguimos devagar e desprovidos de gana. Eramos apenas duas almas que vagavam por instinto, ouvindo nada mais do que os próprios passos.

Não tardou muito, ao nosso lado esquerdo, passamos por uma pontezinha às margens do “desejado.” Onde um riacho que rodeia o maciço foi o nosso companheiro. Descia borbulhando à contra fluxo, enquanto nos esforçávamos para vencer o cansaço. A cara da Ana era de quem já queria entregar os pontos, mas, a determinação de alcançar o 4° Cume e concluir o objetivo era uma questão de honra. Como o tanto que andamos poderíamos ter chegado no litoral. Mas o fim de sua base não chegava nunca. Eu ouvi conversas de que a trilha que sobe para o topo do Garrafão tem início em um descampado na face sul. Ignorei esse descampado, que estava quase todo coberto por mato alto, preferi contornar e subir a estradinha que vinha da esquerda. Quando vencemos a subidinha, e da direita veio outra estradinha oblíqua, encontramos a marcação que aponta onde deveríamos entrar. Pronto, era hora de saber o quão de inclinação tem aquele pico.

Logo de cara se tem uma trilha super inclinada, que segue nítida e estreita. E ao pensar que não encontraríamos uma alma viva pelo caminho, decidimos esconder as mochilas na mata e subir com menor sacrifício. Foi uma ótima escolha! Pois tivemos que encarar, 200 metros de desnível em uma subida que não dá trégua para descanso. Sobe, sobe, sobe e, no intervalo de 40 minutos de subida, parece que nunca vai acabar. O suor cai, mesmo em temperaturas mais amenas, falta o ar, as pernas estremecem, e só a determinação é capaz de fazer um ser humano chegar ao topo da grande rocha, que tem em seu ponto culminante uma pequena área para acampamento (se necessário), 1 pilar de concreto com as marcações topográficas, e não oferece vista para qualquer lado que se olhe. Foi ali, naquele momento, que dei o golpe de misericórdia nos ânimos de Ana. Eu havia comentado de subirmos um 5° cume na região, e que eu havia deixado de fora da lista por não haver tempo suficiente para 5 cumes em 2 dias). E como um tiro no coração, sepultei tal ideia. Realmente, estava fora de alcance subir o Peito de Moça (Pico do Gavião), que não tem uma trilha óbvia e segura para ser acessada pela face sul. Teríamos que escalaminhar outra piamba infernal, e sem saber se chegaríamos no topo ainda com a luz do dia. O melhor seria adiar a ideia para uma outra data. E assim foi feito.

Deu apenas meia hora de descida, e já com as mochilas nas costas, nos jogamos, largados, no meia da estradinha para comer o que tivesse e tomar o caminho de volta, que, em 10 quilômetros de pura lentidão, deveria ser finalizada ao cair da noite.

 

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Além dos incômodos com o peso da mochila, Ana passou a reclamar com mais fervor por conta das dores que o Coturno causa depois de 2 dias andando feito camelo, subindo e descendo os morros feito Sherpas Andinos. E passou a andar com um cajado (galho de árvore) que encontrou jogado pelo chão.

Estávamos mais do que cientes de que não encontraríamos qualquer veículo circulando por aquelas bandas! Mas o clamor interno, e individual de cada um, implorava por uma carona que nos levasse até o ponto de ônibus. Mas o cansaço era extremo, e com ele, Ana se arrastava pela estrada, quase rastejava na tentativa de dar um passo após o outro. E se tivéssemos a oportunidade de uma carona naquele fim de mundo, ela foi-se embora. Chegamos a ouvir, por duas vezes, barulho de carro e caminhonete, saindo de dentro de alguma propriedade para acessar a rua. Mas o nosso avanço não era o suficiente para pegá-los antes de saírem.

Faltavam pouco mais de 2 quilômetros para chegarmos no ponto de ônibus, quando, na grande reta que acompanha o aqueduto, vimos uma pickup, prata, cabine dupla, vindo vagarosamente oscilando sobre as depressões da via. Quando chegou perto, fiz sinal de carona, o carro parou, e o motorista disse: só vou ajudar por que são dois velhinhos andando de bengala. Entrem aí.

Com a abordagem descontraída do motorista, Senhor Mariano (Bira), que estava acompanhado por dois vizinhos adolescentes, começamos um conversê danado, aliás, ele começou a falar ininterruptamente por toda a viagem. Mas a conversa era agradável, respeitosa e com boas histórias para se ouvir.

Quando chegamos perto do ponto de ônibus, Sr Mariano já sabia onde morávamos, e com todo bom coração que aquele homem tem, se propôs a nos levar por mais alguns quilômetros, até a estação de trem de Mogi das Cruzes, deixou o casal de irmãos em Biritiba-Ussu, e seguimos.

Era notável que se tratava de um senhor carismático, simples e de coração aberto. Que confia demais na humanidade. Expôs tantas particularidades, que a chegada até Mogi foi pouco tempo. E como seu destino era o centro da cidade de Suzano (passaríamos por lá), ele quis nos levar junto. A conversa era incessante, mas por um momento teria um fim. E esse fim se deu após de mais de 30 quilômetros de carona, com aquela pessoa que apareceu para nós como um anjo salvador.

Finalizamos nossa aventura extasiados com tamanha sorte, e dando graças por tudo que aconteceu.

Viva ao Sr. Mariano. \o/\o/\o/\o/\o/

 

Vgn Vagner.

 

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Estatísticas

 

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Altitude:

Pedra do Sapo: 990 metros

Pico Itapanhaú: 1080

Pedra da Esplanada: 1020

Pico do Garrafão: 1030

 

Distância percorrida: 36 km

Área de acampamento: em todos os cumes

Pontos de água: entre Sapo+Itapanhaú (bastante), Itapanhaú+Esplanada (só em época de chuva), Pico do Garrafão (bastante na base).

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