Membros de Honra Jorge Soto Postado Maio 15, 2009 Membros de Honra Postado Maio 15, 2009 TUTÓIA-BARREIRINHAS: O MELHOR CAMINHO PROS LENCÓIS A idéia era chegar aos Lençóis Maranhenses da forma + interessante possivel a partir da cidade piauiense de Parnaíba. E q não fosse pelo tradicional e tedioso busao interestadual. O 1º trecho* de 150km havia sido vencido singrando os meandros do Delta do Parnaíba no balanço das aguas - deitado numa confortavel rede - da barca carinhosamente apelidada de "Cidade Tutóia". O 2º trecho, Tutóia-Caburé-Barreirinhas, demandaria 2 dias e td sorte de transporte disponível devido tanto à acidentada e diversificada geografia local, tanto como ao isolamento e ausência de qq transporte regular na região. Só assim, na base do espírito aventureiro, pra conhecer plenamente este trecho + selvagem da pitoresca costa entre o Piauí e o Maranhão. Levantamos cedo, as 7:30, e fomos direto tomar o farto desjejum da simples - porem acolhedora - pousada q arrumamos às pressas a noite anterior. A necessidade favorece a união de tipos diferentes. Era o nosso caso: em Parnaíba conhecera a paulistana Dani; e na barca, a mineira Rosa e uma dupla de mochileiros suícos. Juntos, nossa meta era alcancar Barreirinhas via Caburé, e unimos força$ afim de atingir tal objetivo. Somente assim p/ arrumar uma Toyota - conhecido aqui como pau-de-arara, c/ bancos de madeira na caçamba - cujo dono, o Edílson, alem de motorista providencial mostrou-se um cara mto gente fina. Como éramos apenas um quinteto coubemos nos bancos "normais" da cabine, dispensando os incômodos bancos da caçamba. Rebati o café c/ um gole cor-de-rosa do adocicado Guaraná Jesus e lá fomos nós, partindo as 9hrs daquela manha quente. Inicialmente tomamos a retidao de uma estrada de areia interminável, em meio a horizontalidade da restinga rala. Cruzando trôpegamente alguns rios no caminho, e do nada surgem ao longe alguns focos de mata maiores - palmeiras e carnaubeiras - onde havia sinais de civilização, no caso, vilarejos bem simples. Em todos eles, uma placa na entrada dos mesmos despertou a atenção: "Proibido usar capacete". "É q teve uns tempos q apareceram uns motoqueiros num rally q andaram aprontando, mas a gente deu um jeito neles dando um pau e jogou no rio", explicou o Edilson, na maior tranqüilidade do mundo. Entao ta. Após 35km rodados aos solavancos - q nos deram a impressao de trafegarmos sobre um purê de batatas - chegamos por volta das 10hrs em Paulino Neves, um vilarejo um pouco maior q os anteriores. Cruzamos o largo e manso Rio da Fome por precária ponte de madeira ate a outra margem, ate cair no vilarejo de Rio Novo, pelo qual passamos batido. Tomamos outra estrada (ou seria areiao?) nas mesmas condições anteriores e rumamos sentido litoral, isto é, norte, onde o translado é + agil e rápido q na areia fofa. Aos poucos, em meio à restinga rala, no horizonte vão despontando elas, as alvas e onduladas dunas dos Lençóis Maranhenses. Isto é, dos "Pequenos Lençóis", pq a altura de seus morros de areia são + acanhadas q às de sua contrapartida + ilustre. Uma paradinha pra fotos, claro. Ao ganhar a praia, larga, plana, enorme e de chão duro, a Toyota de fato pegou + velocidade q nas estradas anteriores. E la foram quase 25km q so não foram monótonos pelo visu das dunas à esquerda, mas tb pelas manobras radicais q o intrépido motorista fazia no trajeto perante o cenário surreal q se descortinava à nossa frente. Explico: a praiona deserta estava salpicada por pequenos tocos emergindo do chão, tal qual pequenas esculturas; resquícios do q outrora fora um exuberante mangue soterrado pela areia e q a Toyota tinha q desviar. Enfim, são as nossas boas-vindas aos "Pequenos Lençóis", um preview do q seriam os "Grandes". As 11hrs chegamos em Caburé, vilarejo localizado na foz do Rio Preguiças. Vilarejo é gentileza de chamar pq Caburé não passava de um vila-fantasma, literalmente 70% engolida pelas dunas! Onde quer q se olhasse via-se apenas o teto de palha do q outrora foram "residências". O q não tava soterrado tava ate a metade, ou quase lá. Os únicos casebres (palhoças de folha de buriti, uma palmeira local) q se mantinham ilesas do capricho das areias eram algumas q estavam proximas à margem do Rio Preguiças. E as poucas casas q ainda lutavam contra a fome das areias tinham uma espécie de anteparo, uma barreira feita de folhas de buriti entrelaçadas. O ambiente é realmente desolador, quase de outro mundo; alem da ver a força obvia da natureza se impondo, não se vê ninguém ali. Um lugar onde os sinais da presença humana eram efêmeros, pois o vento e a areia apagavam td. Dessa forma, o Edilson nos deixou num dos poucos pousos em atividade ali, a Pousada Mirante, q so não tava soterrada pq a td hora tinha alguém varrendo areia em seu entorno. Pexinxamos o pernoite e nos juntamos aos únicos hospedes q havia, um casal de jornalistas de sampa. A pousada por sua vez é de uma rusticidade acolhedora de tao simples, e lembra apenas uma palhoça de maiores proporções. Os quartos eram pequenos chalezinhos perfilados no entorno do "quiosque-mor". A energia é racionada, fornecida por um gerador ligado em determinados horários, e os quartos estavam repletos de areia, razão pela qual recomendavam sempre manter as janelas fechadas. Vimos tb q as crianças eram bastante exploradas pelo rústico "comercio" local; recebiam mixaria p/ varrer a areia do entorno e acessos aos mesmos, alem de carregar enormes e pesados carrinhos-de-mao transportando a dita cuja p/ bem longe. O resto do dia ficamos à toa e demos um tchibum no Rio Preguiças, cujo nome não poderia ser + sugestivo. Não sei se por causa do bicho ou pelo próprio rio, q corre pros dois lados conforme a maré, mas às vezes pára de td, p/ descansar. Após um árduo rolê - andar na areia fofa não é fácil! - pelo pitoresco vilarejo, fomos nos informando de alguma lancha q nos levasse ate Barreirinhas o dia sgte. No final da tarde, fizemos um passeio pela barra do Preguiças e quem sabe, esticar até Atins, vilarejo na outra margem. Saimos entao de voadeira, passando por inúmeros meandros de igarapés e mangues, observando a vida pulsando ali, na forma de vistosas garças e elétricas tainhas pulando na agua. Estávamos a procura do famoso guará, uma ave de coloração vermelha típica daqui. Ao ganhar de fato o mar, chegamos praticamente no final da praia de Caburé, onde se tem uma bela vista de Atins e do imponente farol de Mandacaru, ao longe. Retornamos pelo mesmo caminho, ate finalmente ver os danados dos guarás voando sobre a gente em meio aos igarapés. Após observar um maravilhoso espetáculo do astro-rei pousando no horizonte limitado pelo Rio Preguiças e q tingiu o firmamento c/ tds as gradações de escarlate, jantamos uma deliciosa tainha frita, especialidade da pousada. Td isso bebericando uma pinga de mandioca chamada tiquira. Conversando c/ o casal jornalista de sampa (o cara era editor da Folha), tomamos conhecimento q o nome do lugar (Caburé) vinha de uma coruja q as vezes costumava dar as caras ali. Enqto isso, a dupla de suíços mochileiros reclamava na "diretoria" da pousada pela gde qtdade de areia acumulada no quarto deles. Na sequencia, p/ fazer a digestão tds fomos dar um rolê na praia, iluminada pelo belo luar q conferia às dunas ao redor uma resplandescência quase onirica. O céu estava coalhado de estrelas, cenário apenas maculado pelos esporádicos flashes do farol de Mandacaru. Exaustos pela breve caminhada na areia fofa, logo a seguir retornamos a nossos aposentos p/ descansar, as 21hrs. Afinal, o dia sgte teríamos q levantar cedo p/ singrar o Preguiças rumo Barreirinhas. Dormimos feito bebês, embalados pelo hipnotico som do vento acoitando as dunas e pelo "tuc-tuc-tuc" do gerador local. O dia sgte amanheceu radiante, como sempre. Levantamos as 6:30hrs preguiçosamente, tal qual o nome do rio ao lado. Na gde varanda da pousada, tomamos o farto e delicioso desjejum da casa, enqto td sorte de passarinhos vinha s/ ceremonia beliscar as migalhas q sobravam do café. Pois bem, após muita negociação (tds aqui querem enfiar a faca!), arrumamos uma lancha q nos levasse ate Barreirinhas. Contudo, tivemos q esperar um tempão pois a negociação era c/ uma local e o transporte era do seu marido-pescador, q so voltaria de alto-mar + tarde. Mas pensando bem p/ q a pressa? O balanço das águas e o próprio nome do rio já impõem um novo ritmo de vida aqui. Resumindo, so deixamos Caburé as 10hrs, espremidos na pequena embarcacao e devidamente trajando colete salva-vidas. E la fomos nos em nossa ultima fase de trip rumo a cidade-base dos Grandes Lençóis. A lancha lançou-se rio acima c/ relativa velocidade, deslizando suavemente pelas águas mansas do largo Preguiças, c/ uma paisagem q se manteve inalterada por um bom tempo: à direita emaranhados extensos de verdejantes manguezais e igarapés, contrastando c/ a paisagem à esquerda, tomada inteiramente de dunas douradas. De repente, surgem rústicas choupanas de palha de buriti às margens do rio. São as moradias provisórias de pescadores seminômades q são obrigados a estar em constante movimento devido as duas estações climaticas bem definidas na região. E la pescam tainhas, corvinas, robalos e td sorte de sustento q suas redes fisgarem. Um tempo depois deixamos as dunas pra trás pra mergulharmos definitivamente num labirinto dos sinuosos meandros do rio, ladeado de verdejantes igarapés onde a vida pulsava c/ bastante intensidade, fosse de brancas garças descansado nas raízes aéreas da mata ou dos elétricos tralhotos, pequenos peixinhos saltando da água a td instante. As 11hrs surge um pequeno povoado na margem esquerda, onde a lancha faz uma breve parada. Seu nome é Vassouras e é uma vila de pescadores composta de algumas choupanas e várias embarcacoes espalhadas aqui e ali, nem tds na água. Abraçada por uma enorme duna e cercada de mangue nas extremidades, o local parecia + uma ilha perdida no tempo. Sensação reforçada qdo inúmeros macaquinhos aproximavam-se da gente s/ receio algum, a procura de comida. Não era de se estranhar q nas proximidades havia o Igarapé do Macaco. Porem, a proximidade da mata não so assanhava os primatas mas tb os pernilongos, q la havia em qtdades industriais. Estavam tb na mesma condição nossa outros turistas de Barreirinhas, c/ os quais tenho uma breve prosa num pequeno e improvisado quiosque vendendo açaí fresquinho. Um deles me fala das trocentas lendas q os ribeirinhos costumam contar, geralmente envolvendo dunas engolindo jegues e sucuris papando bois. A viagem pelo rio prosseguiu s/ maiores intercedencias no mesmo ritmo. Sempre riscando um traçado sinuoso - q remete os rios amazônicos - em meio à paisagem labiríntica e verde de mangues e igarapés, eventualmente quebrada por alguma duna dourada q avança e se debruça às margens do rio. Este, por sinal, é a verdadeira riqueza fértil dos lençóis, dividindo-os me gdes e pequenos, se estende por cerca de 50km e é alimentado por + de 40 afluentes. Passamos batido por Alazão, outro pequeno povoado de pescadores q não parece mto diferente do anterior, ate q se comeca a avistar cada vez + embarcacoes no rio, sinal da proximidade c/ nosso destino. Dito e feito, por volta das 13hrs chegamos em Barreirinhas, mas não s/ antes serpentear o rio de tal maneira pois este abraça a cidade de quase tds os lados q se tem a impressão de q se esta numa ilha. A lancha não nos deixou no cais local e sim na margem da única gde duna q parece ter se desgarrado dos vizinhos lençóis e foi parar ali, p/ fazer de balneário local. Pedimos infos aos turistas e rapidamente rumamos pelas ruas da pequena cidade em busca de pouso, à sombra de mangueiras centenárias da rua principal. Encantadora e preguiçosa como o rio, Barreirinhas tem a hospitalidade de sua gente outro predicado irresistível, pois pergunta aqui e pergunta ali, acabamos logo permanecendo na aconchegante Pousada Colonial - ou Solar dos Carvalho - onde qq recém-chegado viajante sente-se em casa. Só assim percebe-se q é a franqueza e a sinceridade das relações humanas, qualidades q marcam esse lugar, q são ainda o melhor acesso à quem tenciona se aventurar nos ptos + interessantes e menos conhecidos da região. E a trip propriamente dita através dos Lençóis já é outra historia, ainda na cia daquele mesmo quarteto de viajantes temporarios. Dessa forma, essa aparente falta de rumo de uma trip dividida e marcada por fases bem diferentes, traduz o espírito aventureiro de quem decide percorrer esse labirinto de natureza localizado na costa entre o Piauí e o Maranhão. Pois há algo de bíblico, selvagem e primitivo neste exotico recanto q mistura a fertilidade esmeralda de Tutóia, o calor humano da pacata Barreirinhas, o cenário mutante de Caburé e a vastidão agreste dos Pequenos Lençóis. São lugares em q não se sabe ao certo a q tempo pertencem, embora o calendário teime em marcar os dias atuais. E seguindo essa tradição atemporal, estas pérolas q correspondem às dobras entre os Lençóis, merecem ser explorados à moda antiga, s/ pressa alguma. Tal qual a serenidade fértil do plácido Rio Preguiças. * a 1ª parte da trip ta no link navegando-pelo-delta-do-parnaiba-t19967.html Citar
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