Membros Sávio Pacífico Postado Agosto 20, 2015 Membros Postado Agosto 20, 2015 (editado) José Saramago, escritor português, ganhador do prêmio Nobel de literatura, disse certa vez, que a maior tragédia do homem é ele não saber o que fazer com a vida. Você, eu, todos nós, em algum momento da vida nos perguntamos: Para onde eu vou? O que fazer? E agora? Tantos sonhos, tantos planos, tantas ilusões, afinal o que é de fato uma felicidade real, pois cada um de nós com o livre arbítrio que temos, construímos ela conforme as experiências e os aprendizados que vamos acumulando. Cada um tem a sua própria ideia de felicidade. A minha felicidade, escolhi brincar com ela, viajar com ela, filosofar com ela. Nesse relato de viagem tento mostrar que uma viagem pode se tornar mais do que câmera na mão e facebook em ação. Uma verdadeira busca pelo autoconhecimento. E nesse caminho, vou me aprimorando, particularmente na chamada cultura backpacker ou simplesmente cultura mochileira. Ser um viajante alternativo é ser um cidadão consciente e aberto, consciente de sí e do mundo ao seu redor, das maravilhas naturais até as mazelas do ser humano. É viajar, interagir, experimentar, compreender, compartilhar (experiências), aceitar diferenças, enxergar mais além do que a natureza, o homem, você próprio. Viaja-se não para procurar o belo, mas para despertar o belo em você. O escritor francês Marcel Proust dizia que a verdadeira viagem não está em sair por aí a procura de novas paisagens, mas em possuir novos olhos. A viagem na qual realizei, tive o prazer em primeiro lugar de contar com um grande parceiro, meu irmão e amigo “gema”, aliás muito obrigado mano pela parceria. Não posso negar que participei de uma profunda experiência de vida, afinal não é todo dia que você tem a oportunidade de testemunhar as paisagens mais belas do seu continente, e até do planeta. Cada uma delas teve a sua poesia, a sua graça, e a sua história. Salar de Uyuni (Bolívia), considerado o maior salar do mundo, um verdadeiro mar de sal, todo aquele branco sem fim, cactos gigantes, rochas de cores e formas distintas, juntos nos levam a um quadro surrealista de Salvador Dali. Senti alí o quanto somos frágeis diante da natureza que te castiga por desafia-lá. Enfrentei o frio demasiado; o desconforto térmico; o ar que parecia faltar aos pulmões; passei pelo mal da altitude, sentindo fortes dores de cabeça, forte cansaço, em lugares que chegavam há cerca de 4.000 e 5.000 metros de altitude acima do nível do mar. Tal sensação sofrível repetiu-se novamente só no Parque Nacional Torres Del Paine no Chile, pois, passei pelos extremos da Patagônia, ressaltando que essa região é conhecida pelo seu humor instável. Naquele dia poderia estar fazendo um lindo dia de sol, porém, a natureza tratou de me recepcionar de outra maneira. Ventava e chovia muito - aquela chuva que caia quase deitada, empurrada pelo vento irascível, metralhava o meu rosto, enquanto eu caminhava contra ela -, até granizos enfrentei, e claro, àquele frio que pesava sobre a face. Era difícil dar um sorriso com aqueles ventos gelados e paralisantes. Os dentes eram socados pelo ar gelado. Os músculos do rosto não obedeciam a minha vontade, contudo, não há vitória, sem luta, e ela veio com aquela vista cheia de vida, de guanacos (parentes das lhamas) em bando, de azul no lago, de montanhas que agigantavam, de raios solares que rasgavam o céu negro e tempestivo. Mas não pensem que uma viagem dessas é só feita de um certo desconforto físico, porque houve sim, experiências não tanto castigantes, San Pedro de Atacama, foi uma delas, uma cidadezinha aconchegante, cheio de gente alternativa, simples e com uma áurea pacífica. O lugar é cercado por belas montanhas e pelo maior deserto seco do mundo, o Atacama. Naquele lugar, presenciei os céus mais incríveis da minha vida: azul, laranja, amarelo, invariavéis e magicamente harmonizadas. Aquile céu era tão cheio de cor, nitidez e vida num ambiente extremamente seco. Não é à toa que o lugar abriga o ALMA, o telescópio mais poderoso do planeta. E temos ainda o charme e o encanto de Santiago, a capital chilena, tão moderninha quanto educada, afinal os chilenos se mostraram um povo gentil e de muita educação. Não se escuta praticamente buzinas alucinadas no trânsito. E em Santiago também você se sente mais seguro, afinal lá se vê muitos "carabineros", espalhados por todos os cantos, esses aliás são considerados os policiais mais honestos da América do Sul. E o metrô? Rápido e fácil, usei-o bastante nas minhas andanças, por exemplo, indo degustar um vinhozinho no refinado Vinhedo Concha y Toro - o segundo maior vinhedo em extensão do mundo - ou ir tirar o véu da “noiva do oceano” do poeta Pablo Neruda, Valparaíso, o lugar do seu recanto e fonte de inspiração de muitos dos seus poemas, e não esqueçamos da “hermosa” vizinha, Viña del Mar, um balneário de muito requinte, um “pouquinho” mais caro, mas valeu a pena, descobri afinal um lugar especial para os brasileiros, o estádio, no qual o Brasil jogou a 1ª fase na Copa de 62 no Chile e se sagrou bi-campeão mundial, além de ver uma estátua genuína da Ilha da Páscoa. Depois tive o deleite de conhecer a gélida cidade do fim do mundo, Ushuaia (Argentina). O lugar é considerado a cidade mais austral do continente americano, usa-se muito o marketing de ser “El Fin Del Mundo” pela sua localização geográfica, mas não é nenhum exagero, uma vez que ela fica há cerca de 1.000 km do continente Antártico. Nesse cantinho do mundo, fiz uma aventura 4x4 num jipe muito louco fazendo trilhas muito loucas com paisagens “loucamente” espetaculares, sem comentar a experiência de remar num bote pequeno, cabendo (apertadinho) 05 pessoas em meio ao lago “escondido” (não é ficcional, o nome do lago é esse mesmo), e nessa experiência, acabei dando de cara com o “mau humor” da Patagônia, o tempo mudou rapidamente, e começou a ventar muito. Agora para quem não remou num lago, enfrentando os fortes ventos patagônicos, imagine 05 pessoas inexperientes no remo em meio a um grande lago, enfrentando marolas (pequenas ondas)? Pois é, a situação se tornou empolgante e um pouco tensa, além de cansativa, afinal remar contra a marola não era fácil, mas com paciência e dedicação dos tripulantes, chegamos em terra firme. Também conheci a história dos Aborígenes da região, os Yámanas. Sendo eles canoeiros e nômades do mar, essa tribo não usava qualquer roupa contra o frio, porque molhariam, e eles sentiriam mais frio, mas em virtude desse estilo, a expectativa de vida dos aborígenes eram de apenas 35 anos, sem contar as crianças, essas não recebiam nenhum nome nos primeiros dois anos de vida, porque era uma fase muito crítica para elas, e 50% delas acabavam morrendo. Hoje, infelizmente, há apenas uma Yámana, Cristina Calderón, moradora da Ilha Navarino no Chile, que depois dela, imaginem, haverá apenas histórias para contar de um povo que uma vez existiu, e habitou durante 6 mil anos o arquipélago da Terra do Fogo. Outra experiência memorável foi fazer trekking em El Chaltén (Argentina), realizei caminhadas exaustivas, subindo e descendo trilhas tortuosas, porém, a recompensa veio através daquelas paisagens que mais pareciam “mirações” de um paraíso perfeito ou quadros pintados por divinas mãos, e ainda tendo naqueles meus passos intermitentes, a bença do sobrevôo de um condor. E o glaciar? Caminhar sobre o gelo é uma sensação sem igual, você ver diferentes formas no gelo, passa por perigosas fendas na geleira, e passeia nesse paraíso branco e azul da Patagônia, tendo o lago Viedma como testemunha. E falando em glaciar, não podemos esquecer do Perito Moreno, que fica na região de El Calafate (Argentina), visitando-o, você poderá observar a sua frente, o ponto onde a massa de gelo com mais de 80 metros de altura encontra um dos braços do lago Argentino. Através de passarelas de madeira, é possível chegar, com segurança, a pouca centenas de metros das suas majestosas paredes de tom azulado e escutar seu rugido, isto mesmo, o glaciar ruge, pois diferentemente de outros glaciares pelo mundo que retrocedem, o Perito Moreno avança, e esses imensos blocos de gelos acabam se chocando entre si, racham, terminando por provocar barulhos ás vezes monstruosos que nos dão a impressão que o glaciar está vivo. E se tiver sorte, poderá ver a queda de blocos enormes de gelo caindo no lago Argentino. Agora, mudando dos mares de gelo aos mares do Atlântico, vamos a Puerto Madryn (Argentina), berçário de muitas baleias, particularmente as francas austrais. A avistagem desses mamíferos gigantes foi o ponto alto do meu passeio. Ver o maior mamífero da Terra de pertinho, e ainda mais com filhote, foi emocionante, sem contar outros tantos animais da vida marinha como pinguins, elefantes-marinhos, orcas, lobos-marinhos. Na vida terrestre temos também muitas outras espécies como por exemplo, o simpático guanaco, animal da mesma família das lhamas, alpacas e vicunhas. Ouviu-se também narrativas interessantes nesse lugar. Segundo relatos locais, uma ilha chamada “Isla de los Pajaros”, serviu de inspiração para que o francês Antoine de Saint-Exupéry escrevesse o livro “Pequeno Principe”. O autor, conforme a história, trabalhou na Patagônia, e teria assim, conhecido a tal “Isla de los Pajaros” e se inspirou nela para fazer o mundinho do seu princepizinho. Verdade ou mito? Fica aí um bom causo. Editado Agosto 20, 2015 por Visitante Citar
Membros Sávio Pacífico Postado Agosto 20, 2015 Autor Membros Postado Agosto 20, 2015 Que mundão, né mesmo? Uma viagem dessas certamente não foi para descansar e gozar de sombra e água de coco, mas foi um cansaço meritório, recompensador, pois pude testemunhar o divino em cada canto dos pássaros, cada assobio do vento, cada verde dos vales, cada deserto sem fim, cada vida que pulsava naqueles magníficos animas marinhos ou terrestres. Em transe, ficamos ali tão quietos, tão pequenos, a mente vazia, e os olhos tão cheios de cor e plenitude. A Terra é mesmo uma dádiva divina de belezas incríveis. Viajar para mim sempre foi uma busca. Busca pela aventura. Busca pelo novo. Busca pelo mistério. Busca pelo autoconhecimento. É o encontro de você com o divino em você. É o avançar sempre. Uma epígrafe brilhante de Santo Agostinho, dizia o seguinte: “Não vês que somos viajantes? E tu me perguntas: Que é viajar? Eu respondo com uma palavra: é avançar! Experimentais isto em ti. Que nunca te satisfaças com aquilo que és, para que sejas um dia aquilo que ainda não és. Avança sempre! Não fiques parado no caminho.”. Avançar. Eis a sua palavra de redenção. Venha descobrir ou redescobrir um mundo diferente, seja ele gelado, com ventos fortes, chuvas temerosas, caroa fina, lagoas verdes ou azuis, uma praia paradisíaca, um calor danado, areia nos pés, brisa nos cabelos, ou seja ele, o seu próprio mundo, onde ali estão alojados as suas incertezas e inquietudes. Lao-Tsé, um influente mestre do Taoísmo, já dizia que uma longa viagem começa com um único passo. Venha então conhecer lugares, sabores e pessoas desconhecidas, experimentar o novo, ousar sair da sua zona de conforto, e tudo isso poderá ser possível com esse único passo. Não dê mais justificativas e lamentos o por quê não poder viajar. Não tem tempo? Uma viagem pode ser feita tanto em um mês como em um pedacinho de tempo das suas férias, vale até trancar uma matrícula na faculdade, afinal o que irás aprender, você não encontrará em sala de aula alguma. Não tem grana? Organize-se, planeje-se, a viagem dos seus sonhos pode custar bem menos do que imaginas. Está velho demais para viajar? A única restrição que conheço é a saúde, o resto é disposição e coragem. E o maior risco que você pode correr é morrer lentamente, porque não viajou, não leu, não ouviu música, não encontrou graça em si mesmo, lições sábias do poeta Pablo Neruda. Um certo filósofo ateniense do século IV a.C. chamado Epicuro de Samos, defendia a ideia de que para ser feliz, o homem necessitava de três coisas: liberdade, amigos e tempo para filosofar, sem querer copia-lo, mas pegando apenas emprestado a ideia e readaptando um pouco ao universo de um viajante, ressalto aqui que o ser humano precisa sentir o prazer da liberdade. Nascemos geralmente já com uma vida programada: nascer, crescer, estudar, trabalhar, formar família, criar filhos. Entretanto, talvez estejamos esquecendo que a vida tem mais coisas a nos oferecer, claro, ter uma família, por exemplo, é importantíssimo. Haverá quem não nasceu para esta missão, bem como haverá quem a usa como uma eterna desculpa para não avançar, viajar, conhecer lugar algum. Lembro-me de uma família francesa na cidade de El Calafate, àquela família composta pelos pais e mais três filhos, sendo duas crianças, e a outra ainda uma adolescente, entretanto, o que me chamou mais atenção é que eles eram pessoas super simples, e se tinham alguma riqueza, certamente era aquele espírito de conquistadores deles, sempre em busca de um lugar novo. Um outro ponto importante do epicurismo é ter amigos e conhecer novos amigos. Tive o privilégio de conhecer pessoas formidáveis, testemunhar distintas pessoas unidas, como por exemplo, o caso de um ancião basco e uma jovem catalã, compartilhando do mesmo quarto e ideal, defendendo a liberdade da Espanha, que persiste em continuar tolhendo a independência dessas regiões, afinal são territórios riquíssimos. E assim, continuei conhecendo e colecionando seres humanos ímpares. A generosidade de um argentino, a gentileza de um indiano, a simplicidade de um italiano, a coragem de uma carioca, a esperteza de uns mineiros, o charme de umas argentinas, a simpatia de um chileno, a amorosidade de um casal de bascos. São tantos, mas suficientes para dizer que un gran viaje no se hace sólo con grandes paisajes, también se hace com personas que magnifican el viaje. Cada um de nós, penso, precisamos sim de um tempo para refletir sobre a nossa vida, o rumo que ela está tomando. Há tantas indagações, dúvidas, e uma viagem poderia ser a sua grande oportunidade de recolocar os trilhos no lugar, aliás os europeus, os estadunidenses, israelenses e tantos outros, que já possuem a cultura do mochileiro mais bem difundida em seus países, usam as viagens como períodos sabáticos que é uma opção para quem quer se descobrir e revigorar suas vidas. E o viajar de um mochileiro é isso, tantas cores, fotos, poses, paisagens, mas o que deve perdurar no final é o seu espírito renovado e reinventado. Segundo os ensinamentos do Buda, ninguém externo ao nosso ser pode governar nosso interior, e quando descobrirmos isso, encontraremos a liberdade. Sendo assim, o jogo está e sempre esteve em suas mãos. Costumo dizer aos meus amigos que antes de saber o que querem, precisam saberem do que eles são feitos. Então, faça a sua escolha como bem entender, e que ela seja consciente e livre de qualquer convenção social. E sejam bem-vindos os novos viajantes, preparem as suas mochilas ou malas, afinal ser um mochileiro apesar do nome, não significa carregar uma mera mochila, o importante é o ser mochileiro. Venham cair nessa jornada. Tantos homens fizeram grandes feitos, viajando. Exploradores como o norueguês Roald Amundsen, que foi o primeiro a desbravar o Polo Sul ou o veneziano Marco Polo, um verdadeiro viajante em busca de descobertas pelo mundo. E Paulo de Tarso? Viajou por inúmeras cidades da Àsia à Europa com a missão de propagar a fé cristã. E todos eles, esqueceram do conforto, viajaram ao extremo dos seus limites com a única finalidade da descoberta, da realização pessoal. E você? Qual será o seu grande feito? Certamente a resposta está lhe esperando em algum lugar fora do seu lugar comum, e não precisa ser um grande explorador ou um apóstolo devoto para isso. Busque apenas outras cidades, outras distâncias, outras culturas, outras esquinas, mas salte desse penhasco, porque o paraquedas será sempre a sua própria fé. A minha aventura por hora terminou, mas a sua está começando já nas suas imaginações. Organize-se, planeje-se, caso precise de alguma ajudinha, umas dicas básicas estarei aqui ou se não tiver nenhuma aptidão para planejamentos, então cunho aqui uma nova profissão, serei um “personal- backpacker” ou “personal-viagem” para você, que ao invés de lhe oferecer pacotes de viagens, irei ofertar um planejamento completo com dicas e tudo mais, mas, claro, será você o único comandante dessa nau mochileira. Lembre-se somente de duas coisas básicas e importantes que você deve levar consigo em sua bagagem: o desapego e a coragem. Enquanto ao resto, deixe acontecer, e se torne de vez um mochileiro sem alça, não havendo mais nada para lhe segurar. Boa viagem! Citar
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