Membros Caixa Postado Julho 15, 2011 Membros Postado Julho 15, 2011 Santiago de Compostela - Dez 05 / Jan 06 Cheguei em Salamanca na Espanha no dia 27 de dezembro de 2005 as 20:00 e fui até a escola buscar a chave do meu apartamento. Arrumei minhas coisas e fui dar uma volta pela cidade. No dia seguinte não fiz nada de especial, apenas andei pela cidade para conhecê-la. No dia 29 de dezembro pela manha decidi começar o Caminho de Santiago. Um amigo havia me contado, em novembro de 2005, que tinha feito o Caminho de Santiago e que era uma experiência única. Eu disse que ele era louco por ficar vários dias caminhando por horas sem parar. Mas depois que ele me contou algumas de suas experiências fiquei interessado e resolvi fazer o mesmo por alguns dias, apenas para ver como era e para passar o tempo, pois eu iria à Espanha fazer um curso de espanhol e teria alguns dias antes do início do curso. Como não conhecia o Caminho e nem as cidades por onde ele passava decidi ir a Ponferrada, ao norte de Salamanca, a única cidade que eu sabia que o Caminho passava pois um outro colega meu tinha dito. Arrumei minha mochila e parti. Cheguei em Ponferrada no final da tarde, procurei o refugio (albergue municipal onde os peregrinos passam a noite gratuitamente), fiz minha credencial (ou "passaporte do peregrino") e fui dar uma volta no centro da cidade. La comprei um tênis novo (meu pior erro), um tênis impermeável de montanhismo, pois tinha somente um tênis normal, ruim para caminhadas longas e que não era a prova de água. DIA1- Acordei cedo na manha do dia 30 de dezembro. Encontrei um grupo de espanhóis acompanhados de um alemão e mais duas suíças que caminhavam sozinhas. Resolvi acompanhar os espanhóis, pois eu não conhecia o Caminho nem os sinais e assim poderia praticar meu espanhol. A partir de Ponferrada eram 202,5 km ate Santiago de Compostela. No primeiro dia caminhamos até Villafranca Del Bierzo. Passamos por rios, riachos, vinícolas e alguns vilarejos. Cheguei muito cansado em Villafranca, pois meu tênis estava me machucando muito e minha mochila estava muito pesada (eu tinha levado muitas coisas desnecessárias) e também por ser meu primeiro dia e estar despreparado. Quando chegamos no refugio de Villafranca eu vi que eles tinham Guaraná, foi muito bom poder matar a saudade, pois nem na Holanda (onde eu estava morando) tinha guaraná. No refugio tínhamos que dormir no sótão, sem aquecedor e com água fria para o banho. Aproveitei para ir ao centro da cidade para comprar um poncho e uma calca a prova de água pois no dia seguinte iríamos subir a montanha e provavelmente encontrar chuva e neve. DIA 2- As 5:00 da manha acordamos, um dos espanhóis e eu, assustados com o barulho de algo batendo forte na madeira e de vidro quebrando. Descemos correndo para ver o que era e acabamos por assustar alguém que estava tentando arrombar a porta do refugio. Quando subimos novamente ao sótão, estavam todos acordados e assustados. Um deles já havia ligado para a policia. Duas horas depois quando acordamos fomos ver o estrago que tinham feito na porta. Ela estava arrombada, mas nada havia sido roubado. Foi então que conhecemos o famoso “Jesus Jato”, uma figura famosa e que ajudava a cuidar do refúgio. Ele nos preparou umas torradas para o café da manhã como agradecimento por termos assustado os vândalos e a mim ele presenteou com uma vieira (concha que identifica o peregrino) e um cajado que se tornou um companheiro inseparável e que mais tarde ainda me seria muito útil. Alguns dias depois o batizei de “Svenja” em homenagem a uma das duas suíças. Como agradecimento e também como pedido de desculpa pelo transtorno da noite anterior, Jato disse que levaria nossas mochilas de carro ate O Cebreiro, o próximo refugio. Essa foi a melhor coisa que nos poderia ter acontecido, pois naquele dia teríamos que caminhar 27 km e subir de 500 m de altitude a 1800 m, sem contar a previsão de neve e chuva forte pela frente. Foi um dia muito cansativo, mas compensador. A paisagem era fascinante. Montanhas com neve no topo de um lado, montanhas com chuva do outro, montanhas com sol para traz e a nossa própria montanha pela frente. O final da caminhada foi o mais difícil, pois já estávamos cansados de subir a montanha, o vento era forte assim como o frio que era intenso e chovia quase o tempo todo, quando não chovia tínhamos que enfrentar uma neve grossa e molhada. Quando chegamos a O Cebreiro, no alto da montanha, fomos buscar nossas mochilas e seguir ao refugio para nos preparar para o jantar de ano novo. O jantar foi em um barzinho típico dos vilarejos desta região (cidades medievais ainda muito bem conservada, com casas de pedras e, muitas vezes, menos de 500 habitantes). Tomamos uma sopa galega de entrada, um bife gordo com batatas fritas de principal e torta de Santiago de sobremesa. Vinho tinto acompanhava o jantar. No meio do jantar chegou Monica, uma espanhola que iria passar a noite em O Cebreiro e começar a caminhada no primeiro dia do ano. Depois do jantar fomos a uma taberna da cidade para comemorarmos o ano novo. Lá dançamos, bebemos e nos divertimos muito. A meia noite comemos 12 uvas como manda o costume espanhol, cumprimentamos todos e aos poucos todos começaram a se despedir. Eu, Henrico, Nina e Svenja fomos os últimos a sair, mais ou menos as 2:00 da manha. Quando saímos para fora da taberna percebemos que o vento estava ainda mais forte e que tinha começado a nevar forte. DIA 3- No dia seguinte Miguel e José planejaram caminhar 40 km, o que era muito para mim, novato, despreparado, com tênis novo e mochila pesada demais. Henrico iria passar um dia em O Cebreiro para descansar pois estava com problemas nos pés. Então resolvi acompanhar as suíças ate Triacastela (19 km). Monica resolveu fazer o mesmo, pois não tinha certeza se poderia caminhar sozinha. Pela manhã nos surpreendemos com tanto vento e os mais de 15 cm de neve. No Caminho encontramos a estatua de um peregrino, estava coberta de neve. Tiramos fotos pois a estatua expressava cansaço e sofrimento, exatamente o que sentíamos no momento. Alguns quilômetros adiante Monica quase desmaiou pois estava se esforçando demais em uma subida muito íngreme sem ter tomado café da manha. Por sorte de Monica havia um bar aberto no topo da montanha, onde tomamos café e comemos algo. O resto do caminho foi tranqüilo apesar da neve e neblina o que nos impedia de apreciarmos a paisagem. Mas no final da tarde o sol resolveu sair um pouco e mostrar sua graciosidade. Chegando em Triacastela descansamos um pouco e fomos jantar na cidade. Depois de uns bocadillos voltamos para o refugio e fomos dormir pois a neve, chuva e vento havia nos cansado demais, apesar de termos andado apena 19 km naquele dia. DIA 4- Na manha seguinte, Monica, se sentindo melhor, resolveu seguir sozinha. Esse dia eu caminharia sozinho com as suíças e as conheceria melhor. Elas saíram da porta de casa, no dia 16 de setembro, para fazer o Caminha de Santiago de Compostela, sozinhas. Depois de quase 4 meses e mais de 2400 km estão quase chegando e planejavam voltar para casa dia 18 de janeiro. Atravessaram a Suíça, Franca e agora a Espanha. Dormiam apenas em refúgios de menos de 10 euros ou então em barraca. Na Espanha era mais fácil, pois quase todos os refúgios eram gratuitos. Foram roubadas na Franca e tiveram que comprar roupas, equipamento e mochilas novas. É de se admirar a braveza, a coragem, a forca, a vontade, e a alegria destas duas “Chicas Locas”, como costumávamos chamá-las. O caminho por Sarria a Barbadelos foi ainda mais bonito, com caminhos entre as pedras e riachos temporários por causa da neve que se derretia no alto da montanha. Pelo caminho encontramos Monica algumas vezes e a encontramos novamente em Barbadelos. Estávamos apenas Nina, Svenja e eu no refugio de Barbadelos quando inesperadamente chegou Monica. Monica iria dormir em Sarria, 5 km antes, mas disse que tinha um tipo estranho no refugio e estava com medo. Também nos disse que um repórter havia entrevistado ela mas que achava que as suíças é que deveriam ser entrevistadas. Ligou para o repórter do jornal “O Progresso”, um jornal de grande importância na Espanha. O jornal foi publicado no dia seguinte e dizia, entre outras coisas, sobre Monica que estava fazendo o caminho dos peregrinos pela segunda vez; Nina e Svenja que estavam no caminho por quase 4 meses e William, um brasileiro que se apaixonou pelo caminho da peregrinação. DIA 5- No meu quinto dia de caminhada chegamos a Portomarin, uma cidade nova, pois a antiga Portomarin estava embaixo da água pois havia sido inundada pela construção de uma represa. Por ser meu último dia de caminhada com este grupo, resolvi fazer uma macarronada. Todos adoraram, inclusive outros 3 peregrinos que encontramos no albergue. Como presente de despedida recebi um doce típico espanhol de Nina e Svenja. Como agradecimento preparei umas bananas com calda de chocolate para nós no café da manha Infelizmente tive que me despedir de todos para ir a Barcelona encontrar um amigo que na semana seguinte também iria a Santiago. Na segunda feira, dia 9 de janeiro minhas aulas de espanhol começaram, mas resolvi não assistir as aulas por uma semana para poder terminar a peregrinação, não apenas a Santiago, mas ate o Finister, somando mais ou menos 300 km. Cheguei a conclusão que algumas experiências de vida trazem mais conhecimentos do que estudos. Por isso então, ao invés de ir às aulas de espanhol resolvi tentar aprender o máximo que poderia com o Caminho. DIA 6- Alguns dias depois do 5° dia de caminhada... Voltei a Portomarin às 11:30 da noite, por sorte a porta do refugio estava aberta, pois não havia ninguém lá, nem peregrinos nem atendentes, preparei uma sopa e fui dormir. Já tinha caminhado 113 km e ainda faltavam 89 km a Santiago e mais 97 de Santiago ao Finister. Parti as 10:00 da manha, pois teria que percorrer apenas 22 km e teria tempo suficiente para descansar. Por ser uma cidade a beira de uma represa, Portomarin é uma cidade muito fria. Pela manhã pouco se pode enxergar por causa da neblina, os campos estavam cobertos por uma camada de orvalho congelado e as poças de água pelo caminho também estavam congeladas. Logo cedo encontrei com alguém que acho que seria um peregrino, ele caminhava com um cachorro que ficava na maioria do tempo deitado em cima da mochila do peregrino e com sua cabeça apoiada na de seu dono. Passei por ele rapidamente, pois caminhava lentamente. A impressão que tive é que carregava peso demais, sem contar um cachorro que parecia bem jovem e que com o passar dos meses ficaria tão grande e pesado que ele não poderia mais ser carregado pelo seu dono. Depois de passar por ele pensei que deveria ter tirado uma foto com seu cachorro nas costas, mas a oportunidade já havia passado. Cheguei em Palas Del Rei as 3:00 da tarde, estava sozinho novamente. Saí para comprar pão para o jantar e para o almoço do dia seguinte e fui logo dormir. Parti de Palas as 9:00 da manhã, teria que caminhar apenas 4 km a mais que o dia anterior, o que não seria muito difícil. DIA 7- Aproximadamente na hora do almoço encontrei com o peregrino e seu cachorro novamente. Não sei como ele me passou pelo caminho. Imagino que tenha caminhado boa parte da noite, pois caminhava muito mais lento que eu e estava a minha frente novamente depois de um dia. Também não havia visto sinais de sua passagem por albergues ou refúgios, pois por todo lugar por onde passava eu entrava para recolher o carimbo no passaporte e olhar o livro de visitas, mas as únicas pessoas que encontrava eram 3 franceses e um português que viajavam juntos. Aproveitei para, então, tirar uma foto. Ao continuar pelo caminho me sentia cada vez mais cansado e sentia cada vez mais o peso da mochila. Desta vez estava bem mais preparado, com roupas mais leves e próprias para o esporte e sem peso desnecessário, mas mesmo assim sentia como se carregasse mais de 100 kg nos ombros. Meus pés pareciam que não cabiam mais no tênis, minhas pernas travavam e meu ombro esquerdo doía muito, sem contar o sol forte nos olhos. Cheguei em Arzua as 3:45 da tarde, não entendia o porque, pois havia saído uma hora mais cedo que o dia anterior, andado mais rápido e chegado 1:30 horas mais tarde. No refugio encontrei com um casal impressionante, Herb e Tina. Ele tinha o cabelo e a barba compridos e os dois tinham o jeito meio largado, pareciam mais com dois mendigos. Ele era francês e ela espanhola, vivem pelo mundo mas atualmente estão morando perto de Sevilla, na fronteira com Marrocos. Ela faz artesanato de couro para vender a turistas e ele toca uma bateria rústica para ganhar uns trocados. Fazem isso porque gostam e não precisam de mais nada para viver, estão muito felizes com o que tem. Já fizeram o caminho 4 vezes e estão fazendo novamente. Quando disse a Herb que vinha de Palas Del Rei naquele dia ele ficou impressionado, disse que eram mais de 40 km. Eu não entendi, pois as pedras pelo caminho com a distancia marcada diziam apenas 26 km. Foi então que ele explicou que não podemos confiar nos marcos de distância espalhados pelo caminho pois a quilometragem foi feita baseada na rodovia e que o caminho faz ziguezague, ou seja, é mais longo. Ele disse também que os franceses haviam mapeado todo o caminho por satélite e que na parte espanhola o erro era de mais de 200 km, e que as maiores diferences estão no final. De Ponferrada até Santiago, ao invés de 202km, ele acreditava que eram quase 300 km. Isso me explicou o porque eu me sentia tão cansado naquele dia, pois não havia caminhado apenas 26km como pensava, mas aproximadamente 40km. Isso também me deixou decepcionado com o Caminho, pois estava andando mais do que pensava estar. Gostaria de saber, no final do Caminho, quantos quilômetros andei exatamente. Agora sabia que quando chegasse ao Finister teria andado não 300km, mas sim quase 400km. Ele me disse também que para o próximo dia teria quase 50km pela frente. Jantamos juntos e durante o jantar conversamos sobre varias coisas, como economia, política, imigração, o caminho, drogas, a vida... Como estava muito cansado e teria quase 50 km para caminhar no dia seguinte fui cedo para a cama, às 8:30 já estava deitado e acordei também no mesmo horário mas pela manhã. Parti às 9:00 já sabendo que teria um dos dias mais duros de minha peregrinação pela frente. DIA 8- Esta parte final da caminhada ate Santiago não era das mais belas mas sim das mais longas e pesadas. Nunca havia caminhado tanto sem ter chego a lugar nenhum, parecia que Santiago ainda estava a 2 dias de viagem, mas nada me faria parar tão perto de meu objetivo. Faltando em torno de 10 km achei outro cajado pelo caminho e resolvi usá-lo também, pois tinha muita dor no joelho direito e tinham varias subidas pelo caminho. Quando cheguei ao Monte do Gozo, a 5 km de Santiago, fui a procura do maior refugio do Caminho, com capacidade para mais de 800 peregrinos. Chegando as portas do refugio senti, como que de repente, do nada, uma necessidade enorme de tirar água do joelho, então o fiz, ali mesmo, a 100m do refugio. Quando terminei e fui pegar meus cajados no chão para continuar até o refugio atrás, senti muita dor no joelho esquerdo que ate então não tinha me incomodando nem uma vez se quer. E também senti uma fisgada no joelho direito. Foi uma dor fora do normal, algo que jamais havia sentido antes. Estas dores vieram de repente, como se fosse um sinal para passar a noite no refugio de Monte do Gozo e descer a Santiago pela manha, como a maioria dos peregrinos faziam. Levei muito tempo para conseguir chegar da entrada ao pátio do refugio, por sorte eu tinha dois cajados para me apoiar, tamanha era a dor que sentia. O refugio era impressionante, enorme, com restaurante, lavanderia, cafeteria. Imaginei como deveria ser aquele refugio no verão, cheio de peregrinos de todos os lugares do mundo, festejando os últimos 6 km para a catedral. Deveria parecer mais com um acampamento de ferias do que com um refugio de peregrinos. Após alguns minutos de descanso continuei o Caminho, ainda com muitas dores, mas com uma gana imensa de chegar à catedral. Já no centro de Santiago, mas ainda a alguns quilômetros da catedral um rapaz chega correndo e me chama a atenção, eu meio que assustado atendi. Era um repórter que estava escrevendo sobre os peregrinos para o jornal da região. Pela segunda vez apareci em jornal espanhol como peregrino, mas desta vez eu estava sozinho, fui assunto de primeira pagina com foto colorida e outra foto preto e branco na entrevista. A melhor coisa da entrevista foi que pude descansar por alguns minutos. Continuei os últimos quilômetros, mas sempre em duvida se estava no caminho certo ou não, pois as setas amarelas que haviam me guiado desde Ponferrada tinham desaparecido, encontrava uma ou outra perdida pelo caminho, mas que eram o suficiente para me dar a certeza que ainda estava no caminho certo. Ao chegar na catedral, fiquei completamente pasmo, sem palavras, e a única coisa que consegui e pude fazer foi sentar em um banco de pedra onde poderia contemplar a catedral por completa, fiquei sentado e paralisado por mais de uma hora. Não existem palavras que expliquem o sentimento e a sensação de se completar a peregrinação a Santiago. Foi uma sensação única, melhor do que qualquer coisa que já senti, melhor do que qualquer bebedeira que já tive, melhor do que qualquer droga que já usei, melhor do que qualquer sexo que já tive, e, talvez, melhor do que todas estas experiências juntas. Só se pode sentir o que senti naquele momento alguém que passe por tudo o que passei. Vou deixar para vocês descobrirem o sentimento de chegar a Santiago de Compostela pessoalmente... Tirei o dia seguinte de folga para descansar o corpo e a mente e também para encontrar com um amigo para continuarmos até o Finister. Encontrei com ele a noite e assim como eu, mal podia andar direito por causa de dores no joelho. Acompanhei ele no jantar e colocamos nossas estórias em dia, muito em comum por sinal, apesar de ele ter encontrado mais gente pelo caminho nos últimos 3 dias do que eu. Nós fizemos as contas e chegamos a conclusão de que ele não teria tempo de fazer a caminhada de 3 dias ate o Finister, pois necessitaria de um dia para voltar a Salamanca para pegar sua bagagem que estava no meu quarto e mais um dia para ir de Salamanca a Sevillha onde sairia seu vôo para Itália. Um total de 5 dias, mas só tinha 4 dias disponível e ainda queria assistir a missa dos peregrinos em Santiago. E também achou que seu joelho não agüentaria. Nos despedimos então, pois não nos veríamos em alguns meses, até que eu voltasse ao Brasil ou que ele voltasse para a Europa em julho. DIA 9- Como teria que andar pouco e depois de um dia de descanso ainda sentia dores no joelho, dormi ate tarde e comecei a caminhada a Negreira às 10:00 da manhã. Na noite em que cheguei em Santiago e no dia seguinte tive uma diarréia que já não me incomodava mais pois comprei remédios. Por outro lado logo pela manha comecei a sentir-me mal, com náuseas e cólicas, a medida em que os quilômetros iam passando as cólicas iam aumentando. Fazia longas pausas para descansar pelo caminho e cheguei no refugio de Negreira as 5:00 da tarde. A única cousa que pude fazer foi cair na cama e dormir por aproximadamente 2 horas para ver se melhorava. Acordei com a responsável do albergue entrando no quarto. Quando me levantei para descer e carimbar minha credencial, mal pude mexer minhas pernas, estavam duras como pedras e doloridas como se alguém tivesse amarrado varias cintas a elas, como se os músculos tivessem sendo comprimidos, amassados. Avisei a responsável que talvez passasse um dia a mais no albergue pois me sentia muito mal. Passar mais de uma noite no albergue só e permitido em caso extremos, como este. Ela entendeu minha situação e disse que não havia problemas. Depois de selar minha credencial fui tomar um banho quente. Por alguns momentos tive a impressão de não sentir mais cólicas, mas fui enganado, pois somente me sentia melhor por causa da água quente da ducha. Logo depois do banho as dores no estomago voltaram, e sentindo que meus joelhos não agüentariam os últimos 75 km resolvi voltar a Salamanca. Assim pouparia meu corpo e alguns dias de curso de espanhol. Resolvi que não iria ao Finister nem de ônibus, assim como meu amigo, pois ainda queria terminar a caminhada a pé e gostaria que a emoção de chegar ao Cabo Fistera fosse como a de chegar em Santiago, pela primeira vez, como se nunca tivesse estado lá. Na mesma noite voltei a Santiago onde no dia seguinte tomaria um ônibus a Salamanca. Achei que minha estória tinha acabado por ali, no restaurante da estação de ônibus de Santiago, enquanto acabava de escrever meu diário. Mas para minha surpresa encontrei com o meu amigo que também resolveu voltar para Salamanca ao invés de ir de ônibus ao Finister. Sentamos e tomamos algo juntos. Para surpresa maior ainda, encontramos com Herb e Tina também na estação de ônibus, sentamos os quatro na estação de ônibus e conversamos por algumas horas. Meu colega me disse que o padre havia me usado como “exemplo de peregrino” durante a missa, falando de mim durante todo o sermão, pois ele e todos os outros haviam me visto no jornal do dia anterior. Imaginem se não fiquei orgulhoso e emocionado!! Depois de 9 dias de caminhada e quase 300km andados, do que me valeu a pena esta peregrinação? Bom, aprendi a amar ainda mais a natureza e a enxergá-la com outros olhos e a gostar ainda menos da civilização contemporânea. Vejo como algumas futilidades são tão importantes para algumas pessoas e isso me irrita. Aprendi a respeitar diferentes opiniões. Agora conheço os meus limites e os de meu corpo e sei que sou muito mais forte do que pensava ser, e que posso fazer tudo que quiser, respeitando os limites do meu corpo. E o principal: a simplicidade me traz muito mais felicidade e satisfação do que qualquer luxo! Citar
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