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Sim, já eram 6h00 da manhã, do dia 15 de Maio, de 2016, quando começamos a caminhar, na contramão, pelas beiradas da Rodvia SP-047 sem acostamento, em São Bernardo do Campo/SP. Foram dois quilômetros de pernada, naquela manhãzinha de brisa gélida no rosto, até chegarmos na ponte que passa sobre o Rio Marcolino. Descemos pela canaleta de escoamento, cheia de pedras, galhos e armadilhas que derrubam os que gostam de cair (né? Jota. rs). Ali, no trecho de planalto, ele se mostra quase sem volume, tímido e com aparências de que em breve secará. Mas há menos de cinquenta metros, na primeira curva à direita, ele ganha corpo se represando em um poção de água avermelhada que, misturado ao reflexo verde escuro da mata, acaba formando um espelho dágua de coloração verde oliva. Como é inevitável seguir sem molhar as calças, ou melhor, sem molhar “os bagos,” que quando tocaram aquela água congelante, a sensação de infertilização é imediata. rsrs. Sem conta a dor nos ossos das coxas, causada pelo choque térmico. Aff

 

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Todo o desafio que se tem antes de começarmos a descer a serra é apenas caminhar no leito do rio, que há todo momento é formado por margens bastante enraizadas, com aproximadamente 4 metros de altura, fundo arenoso e sucessões infindáveis de poções que cobrem nossas cinturas. O que resta do lixo, e muitos pneus trazidos pela correnteza quando forte muito forte, ou quando abrem as comportas da represa local, ficam presos nas raízes mais altas. Isso trouxe aquela sensação assustadora de que não escaparia um caboclo para contar histórias, caso isso acontecesse de forma repentina.

Tantos pés revolvendo o fundo do rio fizeram com que a areio subisse fácil e entrasse nas botas, chegando até o solado dos pés. Isso é chato demaaais quando mistura aos pés imersos em água gelada. Parece que está tudo esfolado. O bom era que, com todo esse incômodo, restavam apenas uma sucessão de três pequenas gargantas até a cabeceira do Salto Marcolino. Onde a câmera fotográfica do Pimentel decidiu fazer um mergulho (que merda). Ali, onde o cenário da Baixada Santista se escancarou aos nossos olhos, emoldurada por mata atlântica ao redor, pudemos fazer a primeira e demorada pausa do dia. Uma longa parada para contemplação se fez necessária.

Retornamos ao início das gargantas, onde há um vão que já não passa mais água, subimos o “rio seco” e tocamos em direção ao Ribeirão Cágado. A subida é leve, nivela rápido e segue entre paredes rochosas de uns 4 metros de altura ziguezagueando a serra e trazendo à mente flash’s de labirintos pré históricos mostrados em filmes das década de 90. Um degrau de 1,60 mts mais ou menos, aparece para dificultar a passagem do grupo, e lógico, fazer alguém cair e virar chacota no meio da rapaziada. Logo a frente surge uma rampa, com mata fechada, que despenca morro abaixo com direção certa ao Ribeirão Cágado. O caminho natural é tiro certeiro em nosso objetivo, e fitas zebradas amarradas nas árvores reforçam isso. Obra de dois meses atrás, quando Daniel Trovo e Jota Carlos exploravam o entorno.

Com os pés no Ribeirão, começamos uma breve descida, não tardou, paramos para um lanchinho. Nesse momento a conversa comia solta, todos ficaram avontê, e dessa vez, foi minha câmera quem decidiu se suicidar. Escapou da minha mão e desceu uns 6 metros quicando na cachoeira. Quando fiz o resgate dela, não quis ligar de imediato, começou a travar e executar comandos involuntários, rs.

 

Como o “plano A” era alcançar a base da Cachoeira do Marcolino, quando decidimos continuar, começamos um vara mato para esquerda, mas foi em vão. Paredes apareciam a nossa frente de repente, coisa de ser vencida através de um “BOLDER” arriscado.

 

- VOLTAAA. Esse era o comando que se repetia a cada vez que um paredão barrava nosso caminho. Retornamos ao Cágado e optamos por um vara mato mais acima. Só assim, acima dos paredões, estaríamos livres para seguir. Só que não! O vara mato seguia intenso, numa ascensão considerável, quando de repente, um precipício surge à beira de nossos pés e nos obriga a gritar mais uma vez: VOLTAAA (rs). Palavra que marcou essa etapa da travessia.

 

Como perdemos um tempo precioso nessa tentativa de ataque à cachoeira, a decisão mais coerente foi retornar ao Ribeirão e continuar descendo até o encontro com o rio principal. E não demorou muito, já chegamos na cabeceira de uma enorme garganta que antecede o confluência com o Marcolino. Um lugar impossível de se descer sem equipos de segurança, mas que, com tanta oferta de perigo, impressiona com tamanha beleza se estreitando entre os grandes paredões. A única saída foi se enfiar à esquerda e varar mato na direção que nos colocaria nas águas do “Marcola” novamente.

Era meio dia e meio quando chegamos lá e fizemos uma parada para discutir o seria feito a partir daquele momento. De um lado, a maioria decidia tocar rio abaixo e ter tempo disponível para sair da mata às claras, sem passar um perrengue dos “brabos,” já que alguns estavam sem lanterna e o cansaço do grupo, misturado às dores no joelho do Ricardo, poderiam não render uma subida bem sucedida rio acima. Do outro lado, Eu e minha teimosia mantínhamos o plano inicial de chegar na base do Salto Marcolino. Isso fez com que que o grupo se dividisse (com consentimento de todos) em dois. O Trovo decidiu ficar por ali mesmo, junto com: Ricardo, André e Ailton, enquanto eu decidi subir junto com: Adilson, João, Jota, Paulo e Rafael. O combinado foi de termos um tempo cronometrado para ir e vir (45 min ida, 45 min volta), enquanto eles nos esperavam na próxima cachoeira mais abaixo.

 

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Um tiro pro alto, cronômetro acionado...

Valenduuu... Umba, Umba, Umba, Hey. rs

 

E lá fomos nós, subindo em disparada como se estivéssemos numa gincana de caça ao tesouro. Tanta euforia de início me fez cair duas vezes logo no começo, em menos de 5 minutos. Isso por que decidimos subir pelo rio, ao invés de escalaminhar as rochas laterais da esquerda, que estavam secas e se mostravam um caminho melhor. Seguimos em um ritmo aceleradíssimo pulando pedras, escalando as cachoeiras que surgiram, contornando poções e varando mato. O Jota ia anunciando o tempo gasta a cada cinco minutos, talvez, isso trazia aquela pressão, aquela pergunta: será que vamos conseguir? vai dar tempo? Sem ter o que desanimar, quando coloquei os olhos acima de um patamar a frente, em 37 minutos conseguimos chegar em uma cachoeira que fechou nosso caminho. Com aproximadamente 15 metros, essa cachoeira, com poço em formato de piscina (quadrada), está encravada entre dois paredões que impedem qualquer avanço, e acima dela, uma curva para direita revela outra cachoeira bem maior despencando entre paredões maiores que os primeiros. Mesmo sem ter tempo para tentar vencer esse gigantesco desafio em forma de cânion, peguei minha corda e subi todo afoito, me espremendo pelas agarras e vãos da esquerda, e tentei ver algum lugar para prender a corda e dar uma via segura ao grupo. Sem sucesso. O jeito foi abaixar as orelhas, recolher o rabinho que chacoalhava feito vara verde, e reconhecer aquela derrota momentânea. Pois não tínhamos tempo pra mais nada. Apenas voltar.

Voltando rio abaixo, fomos pisando mais no freio do que no acelerador. Não por estarmos abatidos por conta de não acessarmos a base cachoeira desejada, mas, sim, por não haver motivos para tanta correria. E, mesmo sem pressa, chegamos no local onde nos dividimos em dois grupos. O combinado era nos reunirmos ali, mas o pessoal não estava lá. Havia uma cachoeira em seguida, mas, ao invés de desescalar sua lateral, o mais seguro a ser feito foi se enfiar na mata novamente, em direção ao Cágado, e retornar ao rio exatamente na confluência. O que não contávamos era que um degrau de três metros negativasse sobre as águas e travasse nossa passagem. O Rafa foi quem teve a maior dificuldade em descer, e claro, alopração não faltou por conta disso. rs Descemos mais um pouco, e nada da galera. Totens em pontos estratégicos mostravam que haviam continuado sem nós, mas, por pouco tempo. Depois de atravessarmos o rio para a margem esquerda e começar novo vara mato, ouvimos à distância a voz da rapaziada, e logo na sequência já pudemos vê-los de boa, esperando por nós. O problema era que por onde íamos seguindo, muitas pedras soltas rolavam piramba abaixo, e facilmente poderia acertar um deles. Aliás, a que rolou depois que eu passei era de tamanho considerável, e quando caiu chegou a passar pertinho do Ailton. Se pega... era estrago na certa!

 

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Grupo consolidado novamente, tocamos a descer a entranhas do vale, que, como disse o Trovo: há todo momento trás a sensação de estarmos emparedados. É muito trepa pedra pelo caminho, e como se não bastasse, a cada obstáculo deixado para trás, aumenta a dificuldade do trajeto. Teve um momento em que para prosseguir tivemos que andar com água na altura do umbigo, em um canto onde o rio afunila e puxa com voracidade a água que forma uma cachoeira/corredeira. O único meio de avançar é se agarrar ao bico de uma pedra, abraçá-la e fazer um giro com o corpo em 180°. Só que nesse giro pra direita não tem apoio para os pés, a corredeira se lança furiosa entre as rochas, e se alguém cair ali, se não morrer, se arrebenta todo. Foi o trecho mais técnico, mais tenso e mais demorado de toda a travessia. O Aílton disse que se compara com o “cavalinho” da travessia Petrô x Terê, no Serra dos Órgãos. Sem dar tempo de tempo de nos recuperarmos dessa batalha, atravessamos o rio novamente e nos pusemos a andar e arrastar o rabo sobre a inclinação de uma rocha molhada e cheia de limo que forma uma garganta duas vezes mais extensa que a “Garganta do Diabo” no Vale da Morte. Cair ali também não seria uma cena bonita de se ver. Para vencer essa garganta varamos mato pela direita, subindo bastante. Quando voltamos a pisar no leito do rio, o Trovo lembrava que o final de nossa travessia não estava tão longe. Teríamos pela frente a “cachoeira da ilha,” com sua linda queda d’água (dupla), e depois de isso subir muito morro pela esquerda para contornar um buracão, detentor de uma grande cachoeira, que dá trabalho e impede a continuação por ali. A subida do morro não é tão diferente! Somos obrigados a subir, subir, e subir muito, até chegarmos no alto de uma crista. Lá, começamos a ouvir o barulho dos carros que sobem a Rodovia Imigrantes em alta velocidade, e em alguns pontos era possível avistar uma das pontes que que ligam os túneis da serra. Para sairmos dessa crista , tivemos que descer, descer, e descer muito. Mas quando chegamos no leito do rio o mesmo já estava quase nivelado e bem pedregoso. Recheado de velas, pratos, panos e tudo o que artigo destinado à macumbaria. Aquele lugar, o Poço das oferendas,” foi nosso ponto final da travessia, nas exatas 17h e 45 minutos, no portal do Túnel Joelmir Betting (Pista norte- Rodovia dos Imigrantes).

Ali, tiramos tudo o que era areia de dentro das botas e tênis, tiramos uma “foto oficial” e saímos “vitoriosos” por tudo ter corrido tão bem, sem lesões e/ou acidentes graves com nenhum de nós.

 

Travessia concluída, mas, outra jornada tão perigosa quanto, se iniciava a partir dalí. Vencer a subida da Rodovia Anchieta sob o breu da noite, e à pé.

 

Atravessamos a rodovia correndo entres os carros que subiam a todo gás, e começamos uma longa caminhada de 10 quilômetros subindo a Serra do Mar.

Boa companhia e conversa sem grau de seriedade não faltavam (rs). Assim fomos figurando o crepúsculo antecessor de uma linda e agradável noite de lua crescente que nos iluminaria nas próximas horas. Preocupação naquele trecho? apenas com os piores seres que poderíamos encontrar, vindos das favelas próximas, pois o bairro Cotas não estava tão distante. Ultimamente (infelizmente) aquela região tem sido palco de inúmeros assaltos e latrocínios contra trilheiros e/ou turistas que passam na redondeza. Outro perigo seria algum veículo descer a estrada de manutenção, mesmo não sendo permitido, em alta velocidade entre aquelas curvas fechadas. E foi o que aconteceu.

No silêncio que fazia a mata, só se ouvia nossas vozes. De repente, uma Van clandestina aparece deslizando na curva, quase ficando sobre duas rodas apenas, e vem com tudo pra cima de nós, que seguíamos descontraídos com o falatório. Corremos para os lados da pista, na tentativa de escapar, mas quem escolheu o lado direito, como eu, passou um belo de um susto. A Van parecia estar fora de controle. Até pensei em me jogar no mato.

Assim que ela passou, pensamos logo nos amigos que vinham depois de outra curva, uns cinquenta metros atrás da gente. Mas também apareceram todos bem.

Quando conseguimos sair da estrada de manutenção e ingressamos na rodovia novamente, o perigo já era mais presente. Mais assustador. A pista não possui acostamento, e o que nos separava entre as carretas carregadas com toneladas de carregamentos e o alambrado de concreto era nada mais do que 2 metros de largura. Nas curvas, entradas e saídas dos túneis, as marcas de arranhões no concreto anunciavam que, não tão raro, alguns daqueles grandalhões esbarravam nas paredes, e que poderiam nos esmagar fácil, fácil, caso isso acontece.

Os pés, as pernas, as costas, ou melhor, o corpo todo já doía devido ao cansaço acumulado ao longo do dia. A pressão psicológica também não era das mais amigáveis. Ficar vendo dezenas e dezenas de caminhões e carretas, jogando farol alto no meio da cara, e que a qualquer vacilo dos motoristas poderiam a ceifar nossas vidas, não era nada amistoso. A única cena recompensadora, espetacular, e de encher os olhos desses homens que se arrastavam pela pista norte, foi a Baixada Santista, envolta à moldura negra da noite, reluzindo o brilho de milhões de lâmpadas fazendo daquele momento, um momento impar.

 

Finalmente, depois de cruzas inúmeros túneis e pontes, chegamos no trecho de planalto de São Bernardo do Campo. Com a goela seca, não resisti, fui até o posto policial para pedir um gole de água. Ainda bem que esse gole não foi negado, apenas causou estranheza no “Mike” que questionou de onde estávamos vindo, e se era a pé. Seguimos até a área de descanso, onde deixamos os carros, que por fim, acabou gerando um pequeno transtorno aos “patrulhas” do local. Disseram que até a Polícia Rodoviária foi averiguar o porque daqueles carros estarem parados ali, tanto tempo, e sem ninguém saber quando foi o início da ocorrência. Não é pra menos, a placa do carro do Pimentel é de Diadema (rs).

Passado um tempo de conversas amistosas, e “explicações” do motivo de estarmos ali, colocamos um ponto final naquela aventura dominical e voltamos, cada um às suas casas, com a alegria estampada no rosto (exceto um joelho zuado, uma canela inchada e duas câmeras em fase terminal), e um elo de amizade reforçado para futuras explorações na nossa linda, “Muralha,” Serra do Mar.

 

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Participantes:

Adilson Silva

Ailton Jonas

André Pimentel

Daniel Trovo

Jão Paulo

Jota Carlos

Paulo Potenza

Rafael Soares

Ricardo Soares

Vgn Vagner

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