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Como se perder de todos os seus amigos e arrumar outro mil (sem barraca, pra ajudar) em Ilha Grande.


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Era 7:30 da noite e eu estava no cais de Angra dos Reis, tensa, tentando arrumar um barco para a praia de Abraão. Eu estava tentando contato com a primeira parte do grupo que tinha ido mais cedo para confirmar que eles estavam em Parnaioca, mas que só havia barcos saindo para aventureiro, que é a praia mais próxima de lá, porém somente em Abraão eu conseguiria paddar a noite sem barraca. Além do mais, uma amiga mexicana havia me dito que estava no cais principal lá, para me recepcionar e irmos ao ancontro do restante do grupo no dia seguinte. Ela ligou de um orelhão, depois de um celular desconhecido, onde um menino que provavelmente a coitada, no desespero, pediu para me ligar.

 

"Alo? É... quem tá falando?"

"Aloha"

"Aloha mesmo? Desculpa, é que tem uma amiga sua aqui, mexicana, que me pediu para te ligar e avisar que ela vai ficar aqui no cais principal de abraão te esperando"

 

Ri quando um barqueiro recém chegado de Abraão contava para o outro: "Aí, tinha uma maluca no cais principal recepcionando todo mundo que chegava lá falando 'Alohaaa', acho que ela tava bêbada, sei lá, mas todo mundo respondia 'Aloooha' de volta. Esses gringos acham que aqui no Brasil é tudo festa mesmo". Logo depois fiquei com pena dela, mas acho que deveria mesmo era ter ficado com pena de mim.

 

Agora já era 8:30, e as últimas pessoas estavam fechando um barco para ir para aventureiro, e armava um toró preeeeto sobre Angra. Era agora ou nunca: ou eu ia, sem barraca mesmo, me arrumava em algum canto de aventureiro e no dia seguinte pegava um barco para parnaioca, ou dormia em angra onde com certeza eu iria ter um canto para dormir e no dia seguinte arrumaria um barco para Abraão ou mesmo direto para parnaioca.

 

Tomei a decisão mais lógica: FUI PARA AVENTUREIRO!

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Quando o barco desatracou, até tentei em pensar na loucura que estava fazendo: uma praia que nunca fui, totalmente isolada, e sem barraca. Um lugar totalmente rústico e de campings, e eu sem barraca. Um monte de gente que eu nao conhecia, não conhecia ninguém, e eu sem barraca. Mas a nuvem preta com raios e mais raios vinha foooorte, e eu nao sabia se tinha medo disso ou da ventania jogando agua dentro do pesqueirinho levando a gente, 18 pessoas e um mundo de coisas para acampar. Só observei, durante uns 40 minutos, sem saber direito no que pensar.

 

Surpreendentemente, o temporal correu para a lateral, e o barco conseguiu sair da zona de perigo. Eis que uma luz branca forte da lua cheia apareceu, iluminou a ilha grande e o mar ficou de um azul muito escuro lindo o suficiente para a palavra BARRACA sumir da minha barraca. tinha estrela, tinha ilhota, tinha peixe pulando e um ventinho morno batendo na cara, fiquei puxando a música do filme "A praia" na cabeça para compor a cena que eu via, casava perfeitamente. Era a Ilha Grande mostrando pq veio ao mundo.

 

Chegando no cais de Aventureiro, já 22:50 da noite (é demora isso tudo e a viagem nao é lá muito confortável, apesar de vc nem lembrar disso ao ver toda a paisagem) eu voltei a realidade dos sem-teto. As pessoas começaram a desembarcar e 2 garotos puxaram papo comigo desprenteciosamente, até que perguntaram em que camping eu ficaria

 

"É, sei lá... nem barraca tenho"

"Como assim, nem barraca você tem?"

"É isso: meus amigos estão na Parnaioca, e eu só consegui barco pra cá. Meu irmão está com a nossa barraca, e amanha de manhã vou arrumar um barquinho pra lá"

 

Pausa dramática...

 

"tá falando sério?"

"tô sim, mas sem problemas, é só eu não dormir hj, e pela quantidade de gente que tá chegando aqui, vou ter cia até amanhecer"

"Olha... eu e ele viemos com 2 barracas, a gente pode dormir hj na dele e você usa a minha então, certo?"

"É... assim você me salva"

 

Gente... como ainda tem gente legal no mundo.

 

Montamos as barracas, pegamos a minha amada Gabriela Cravo&Canela, cangas, meu celular e fomos para o canto esquerdo da praia, com muitas pedras grandes na areia, onde tinham algumas pessoas, uma em cima de cada pedra, deitadas olhando para o céu-estrelado-enluarado, bem como o clima da praia pede, nos intalamos num canto, coloquei um pink floyd baixinhos e ficamos ali quase sem conversar só olhando aquilo tudo fazendo um bem danado pra alma, munidos do bom pilequinho de cachaça. Noite linda, com meus 2 novos amigos. Afinal de contas, tudo havia dado certo até ali.

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No dia seguinte pela manhã, fui cedo para o cais para tentar arrumar um barquinho para Parnaioca. Já de cara encontrei um casal mineirinho, simpatia só, que estavam dando a volta na ilha, e também buscavam mais gente para fechar um barco pra lá. Em uma hora e meia arrumamos mais 3 pessoas para lá e um bom preço para o transporte (20 reais por pessoa) (sim, isso é um bom preço pra lá), porém, nesse tempo em que fiquei no cais literalmente "a ver navios", observei as toneladas de pessoas que eram derramadas ali, na sexta-feira Santa: era como pau-de-arara que traziam multidões, e isso não seria problema se elas não viessem de calça jeans, sandalias de salto, laptop e mala de rodinha. Mala de rodinha? Céus, tem gente aqui pensando que em Aventureiro tem calçadão? Apesar da agua tranparente e esverdeada perfeitinha ali a volta, a areia branca, o coqueiro que faz 90º graus e o pedido dos meus novos amigos para que eu ficasse, fiquei foi muito aliviada de sairdo meio daquela avalanche de gente que nada tinha a ver com o lugar.

 

No caminho fui conversando com as pessoas: era uma menina e um menino amigos, uma menina sozinha e o casal mineiro. De cara já demos muito bem, todos pensavam como eu sobre a avalanche humana de aventureiro, e riram dos meus apertos bem-sucedidos por lá. Falei que apresentaria ele para o meu pessoal que estava em parnaioca me esperando, e lá sim ia encontrar o lugar paradisíaco que procurava. Pelo menos era o que parecia pelos artigos que li por aí. Saltamos na água (lá nao tem cais) e fomos nadando para a areia, enquanto o barqueiro trazia o resto das coisas numa canoazinha. A praia nao tinha ninguém, e nem dava para ver muitas construções, porém era linda de doer! Lá vinha a minha de "A praia" de novo na minha cabeça;

 

Em parnaioca tem 2 campings. Andamos até o primeiro e..... nao! meu pessoal nao estava por lá.

Fomos para o segundo, onde alguns amigos do menino que estava com a gente estavam acampados. E lá sim:

 

NÃO TINHA PORRA NENHUMA DE NINGUÉM!

 

Eu simplesmente não soube o que fazer. Mais uma vez em lugar que não conhecia ninguém, sem barraca, sem sinal de celular, sem barco para me tirar de lá. Sentei na areia. Olhei aquela praia linda. Eu tava presa.

 

Foi quando o pessoal veio conversar comigo: a aquela altura todos já sabiam dos meus "causos". Muito simpaticamente me disseram que nao sabiam pq eu estava me preocupando, pois era com eles que eu ficaria. Em seguida o dono do camping, o seu Sílvio, me ofereceu de graça uma barraca que algum viajante havia deixado para tras, e o filho dele prontamente a armou para mim. Era o começo de uma das viagens mais gostosas que eu já havia feito.

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A parnaioca nao estava absolutamente vazia, porém somando todas as pessoas nao havia 30 turistas lá. O engraçado é que quanto menos pessoas há em um lugar, maiores as chances de você conhecer muito mais gente. Todos se falavam, tomavam café juntos, paravam pra um papo fiado nas entradas de um dos campings com balanço e rede, bem paradise assim mesmo. Tem um riozinho que desagua no canto direito da praia que forma uma piscina de agua doce um pouco antes de chegar no mar, o que torna perfeito passar os dias jogado pela praia. Para quem mergulha, como eu, o canto oposto é um verdadeiro aquário, cheo de estrela do mar, tartaruga e um arco-iris de peixes. Levei umas duas manhãs para explorar tudo.

 

Seu Sílvio era um paizão: pela manhã pegava vários ovos da granja para incrementar nosso café, e se deixássemos, ele dava logo era o café da manhã completo. Todos do camping me alimentavam, sabiam que eu tava perdida, e inexplicavelmente eram todos muito, mas muito legais. Talvez seja o espírito da parnaioca mesmo, nao é modinha, é paradisíaca e ponto. Lá só há 5 moradores, uma igrejinha e um cemitério bem simpático (para um cemitério) feitos pelo Sílvio, um PF da Marta e o camping da janete que mora com a mãe, a qual n tive muito contato. O ultimo e mais misterioso morador é o João bulé, que segundo os moradores de aventureiro, é lobisomem, pois atravessa as 7 praias em uma noite, é feiticeiro pois encanta meninas novinhas para dormirem com ele, se teletransporta e tem 90 anos, 2 dentes e só anda de sunga. Só vi essa ultima parte, apesar de meu celular ter sumido na porta da casa dele e nixplicavelmente aparecido no barco dele. Enfim... o pessoal de aventureiro diz nao dormir lá de modo algum. Eu durmo a minha vida lá.

 

A noite, todos do camping iam para a praia beber e jogar papo fora a luz da semana de lua cheia, enquanto um dos integrantes tocava no cavaquinho adivinha? PINK FLOYD! Era como se todos que estavam ali tivessem sido escolhidos a dedo por afinidade. Eu me sentia extremamente bem de conhecer tantas pessoas novas num lugar tao lindo, e extremamente mal por estar bem longe dos meus amigos, os quais havia convencido um por um de viajar comigo pra lá, e naquele momento deviam estar preocupados comigo.

 

BEM FEITO!

Como eles mudam de praia e não me avisam? provavlelmente abriram mão de mim pq um grupo de estrangeiros deve ter decidido se juntar a nós e ficariam perdidos para chegar a parnaioca, logo, to nem aí!

 

Uma das noites eu estava andando na praia deserta, sozinha, matutanto sobre a vida e vi vagalumes na areia. Demorei um pouco para chegar a conclusão que era a propria areia que emitia aquela luz quando a gente agitava ela, e era numa faixa bem específica: nem na molhada, nem na seca, naquela meio termo. Mais tarde seu Sílvio nos explicou que se tratava de planctons e que se olhássemos de baixo dagua durante a noite, íamos ver as pessoas com rastros que nem fadas. Era verdade. Era mágico. Era o filme "A praia" de novo. ARRR!

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Voltando:

 

Os dias foram passando nesse feriado de semana santa, e nem que eu tivesse planejado por um ano, as coisas sairiam tão do jeito que eu queria. Chegou o domingo, último dia do feriado prolongado, e logo pela manhã o barqueiro veio buscar o pessoal com a desculpa que o tempo iria virar. Sei. Minhas duas novas amigas iriam ficar, e me fizeram o convite baixo de ficar mais tempo por lá, por conta delas. Gente, os meus amigos mesmo fariam aquilo? Não sei, mas elas fizeram, estávamos todos numa sintonia sem fim. Ficaríamos só nós e mais um casal que também se tornaram grandes companhias, e ainda assim tudo continuaria o melhor possivel. Nesse meu primeiro dia bonus, fizemos a trilha parnaioca x dois rios, já que o era o dia mais ensolarado desde quando chegamos. Andamos, andamos, subimos, descemos, aí subimos de novo, ouvimos o mar bem de perto, perdemos ele vista, e no relógio marcava 1hr de caminhada: de acordo com a placa no começo da trilha, isso significava mais 1hr e meia de trilha pela frente. Acho que todas pensamos em voltar dali mesmo, mas já que ninguém se manifestou, fomos continuando, continuando, eu comecei a filmar o caminho, e do nada surge o presídio e a vila militar quase deserta. Missão cumprida.

 

Dois Rios é realmente linda de doer, tem um riozinho bacaninha no final, um extensa faixa de areia e uma agua clara de filme, meio caribenho. Passamos umas 5hrs por lá e tinhamos que voltar antes de escurecer. começa a caminhada com o psicológico mais tenso, pois sabíamos que o que vinha pela frente cansava, e muitas vezes doía. Andamos, andamos e quando eu tava perto de me jogar no chão vi que estava na frente da Toca das Cinzas, lugar onde os escravos eram acorrentados até literalmente virarem cinzas. Bom seria se eu não acreditasse nessas coisas, mas acredito demais e corri até o final, cheguei de quatro na parnaioca e rolei até o mar, DESAFIO COMPLETO!

 

Ao voltarmos para o camping, descobrimos que havia mais um companheiro para integrar o grupo, mais um que estava dando a volta a ilha a procura da parnaioca. Ele pescou robalos que fizemos frito e passamos nossa última noite mais uma vez estirados na praia até morfeu chamar de vez para a barraca.

 

No dia seguinte, uma segunda chance para aventureiro.

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muito bom mesmo! já passei por perrengues parecidos, só não tinha a praia, e também já ajudei uma vez um mochileiro que estava na mesma situação! isso a gente leva de recordação para a vida toda! parabéns pela coragem, e pela experiencia de dar quase tudo certo! até porque se não tivesse dado certo tu não estaria postando aqui para nós! parabéns guria!

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Numa segunda-feira pós-feriado, aventureiro volta a ser o que eu realmente esperei de aventureiro: um vilarejo tranquilo, com um povo bem simpatico, natureza dispensando comentários e poucos turistas, mas o suficiente para interargimos bem. Era a Aventureiro com pessoas que realmente amavam estar lá, e não simplesmente procurando altos flertes, noitada frenética, dormir o dia inteiro e usar aventureiro para tirar fotos para o facebook.

 

Fomos para o camping da Lais, ótima estrutura com jambos gigantes cheirando a rosa caidos no chao, de noite era o point das pessoas por la que iam tomar cerveja e tocar violão. Era o "point". Conheci vária pessoas que foram passar ano novo/carnaval/ feriado qualquer por lá e ficaram de vez. Eram os que mais amavam tudo aquilo,e nao tem maneira melhor de conhecer um lugar que atraves de pessoas que largaram tudo para ser feliz lá. Eles nos levaram na espia, uma pedra enorme bem na ponta de aventureiro onde dá para ver longe a cerca, e lá ficamos até ficar completamente escuro, descemos pela escadinha que eles construiram, pulamos pelo pier e voltamos para a areia, a noite tocamos violao e aprendemos toda o "Xote do Aventureiro" que eles fizeram, conversamos infinitamente, e em 12 hrs eu ja me sentia completamente em casa. Nos dias que se sucederam, foram campeonatos de jacaré na praia do demo, de salto ornamental do pier, loooongas pestanas na praia, papo fiado horas a fio com as pessoas que passavam pela gente, comida boa a noite, noites lindas, até o dia de dizer adeus aos meus novos amigos que me levaram até o pier, voltar para a minha casa e minha realidade. Como vivi tanto tempo longe de um lugar a 120km de mim como esse?

 

Segue o link com o vídeo que fiz de parnaioca:

(com a música do "A praia" por que será né?

 

E a de aventureiro:

 

 

 

E pra quem quiser saber: meus amigos foram para palmas, não gostaram, e acharam que por eu nao ter conseguido falar com eles, tava entendido que era pra ir pra lá. Vai entender, né?

  • 4 meses depois...

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