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Travessia da Serra Fina - Camelos de Mochila - Julho de 2009


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Caros amigos. Resolvi compartilhar com vocês este "breve" relato da Travessia da Serra Fina, realizada pelo Grupo Camelos de Mochila em Julho de 2009.

Trata-se de um Relato Fotográfico com 61 fotos e informações relevantes para aqueles que pretendem fazer a travessia da Serra Fina pela primeira vez e também uma fonte de recordações para todos aqueles que já estiveram por lá.

Somos um grupo de amigos do Rio de Janeiro, apaixonados por Montanhismo e Cicloturismo e que de vez em quando se reúne pra fazer umas doideiras por aí.

 

Visitem o nosso site e entrem em nossa comunidade:

http://www.camelosdemochila.com

camelosdemochila@yahoogrupos.com.br

SERRA FINA

A SERRA QUE CHORA... E QUE FAZ CHORAR

As passagens estavam compradas, hotel reservado, mochila pronta e previsão do tempo na internet ameaçador..

Meu último email para o grupo foi as 22:00as de Domingo, sob muita tensão, já que a previsão do “Clima Tempo” dava tempo ruim para Segunda, pior para Terça, horrível para quarta e melhora apenas para quinta, com sol para Sexta. Ou seja, Serra fina debaixo de chuva, era a previsão ameaçadora e aterrorizante.

 

1º Dia – 13/09/2009 – Segunda-Feira – DÚVIDAS, PARTIDA E ALEGRIA

Acordei sem vontade de ir, mas, para minha surpresa, havia sol no Rio de Janeiro.

- Que nada, lá em MG deve estar a maior chuva e vamos nos ferrar.

Cheguei à rodoviária cedo, ainda as 9:15h, já que havia conseguido uma carona com um amigo do trabalho. A passagem estava marcada para as 10:30h.

Logo após, chegaram a turma de Magé – Dinho, Jackson e Jorginho – Me recuso a chamá-lo de Dauguinha (eita apelido ridículo...).

Café, papo, telefonema preocupado do Jamiu (pai do Jackson), telefonema de boa sorte do Carlos Papel e chegada do Alê e o Oteb.

 

Esse Oteb é um grande chapa. Estava lá para se despedir e nos desejar boa sorte.

Me senti o Leonardo de Cáprio entrando no Titanic, rumando para uma viagem sem volta.

 

 

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13/07/09, segunda-feira, 10:57as – Oteb; amigo inseparável, nos dando adeus. “Good bye Rose....”

 

Esse Oteb é um pé de coelho mesmo, pois quando estávamos saindo ele me afirmou que todas as previsões do tempo iriam errar na semana que iniciava, já que iria desenhar aquele já famoso sol no quintal de seu prédio.

Quem o conhece já sabe, que aquele solzinho é infalível. Foi responsável por três anos consecutivos de travessia Petrópolis/Teresópolis com tempo bom. Fiquei mais tranqüilo e confiante, afinal, aquela era a previsão do nosso Ogro de estimação.

Chegamos a Cruzeiro (SP) por volta das 14:15h e logo fomos comprar as passagens para P. Quatro.

Passagem comprada para 15:30h e longos 30 minutos de espera. Resolvemos almoçar...

Aquele almoço foi brabo, pois foram alguns minutos para procurar o pé sujo decente para comermos, outros minutos intermináveis para a senhora nos servir os PFs e apenas 10 minutos para engolir a comida, pagar, trocar a passagem extra que eu havia comprado por engano, embarcar e sair. Ufaaaaaaaaaa. No final, deu tudo certo. Estávamos a caminho de Passa Quatro (MG).

Após quase uma hora de viagem, entramos na cidade.

 

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13/07/09, segunda-feira, 16:30h - Chegando a Passa Quatro as 16:30h de 13 de Junho/09.

 

Aqui, vale abrir um parágrafo para descrever um pouco sobre esta maravilhosa cidade:

Remonta ao tempo da bandeira de Fernão Dias Pais em 1674 a origem dessa cidade encravada na Serra da Mantiqueira no sul do Estado de Minas Gerais. Situada logo após um marco geográfico bastante notável na Serra, a Garganta do Embaú, por onde passou a expedição liderada por aquele bandeirante, teve sua localização descrita em documentos que dão origem ao nome da cidade. Constam também expedições de Jacques Felix, fundador de Taubaté, e seu filho de mesmo nome, em expedições anteriores, datadas de 1646, pela região que podem ter dado origem ao povoamento mais antigo. Este caminho ficou conhecido, mais tarde, como Caminho Velho da Estrada Real. No caminho descrito por André João Antonil, consta o nome do Ribeirão do Passa trinta, logo após a descida da serra da Mantiqueira, mas segundo nota de Andrée Mansuy Diniz Silva, o nome atual desse afluente do Rio Verde é Passaquatro, ou Passa Quatro.[5]

 

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13/07/09, segunda-feira, 17:08as - Eu, na estação de Passa Quatro

 

Geografia

 

 

Cachoeira na Floresta Nacional em Passa-Quatro. Fonte: Wikpedia.

Apesar de não ser a cidade brasileira situada em altitude mais elevada, o município se encontra entre as regiões mais altas do país, apresentando o quarto maior pico brasileiro, a Pedra da Mina (2.798 m), localizado na Serra Fina e ponto culminante da Serra da Mantiqueira e do Estado de São Paulo, com o qual o município faz fronteira. Aliás, nos limites do município também se encontra o Pico dos Três Estados, marco geodésico da divisa entre os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro e muitos outros picos elevados a mais de dois mil metros de altitude, tornando-a uma localidade onde se pratica o montanhismo. O relevo montanhoso é presente em 90% do município, sendo considerado ondulado em 8% e plano somente 2%, onde se encontra a maior parte do centro urbano.[7]

O município é cortado pelo Rio Passa Quatro e pelo Rio das Pedras que são parte integrante da bacia do Rio Grande.

Inúmeras paisagens cênicas naturais, como cachoeiras e matas nativas, além das montanhas, preenchem a região que se encontra praticamente equidistante (cerca de 270 km) dos dois principais pólos geradores de fluxo turístico do Brasil, as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.

Por este motivo, atualmente, a cidade tem apresentado forte desenvolvimento no setor turístico, notadamente com o ecoturismo, o que vem mudando sua vocação tradicionalmente agrícola e de criação de gado leiteiro.

Fonte: Wikpedia.

 

Voltemos para o que interessa:

Chegamos à cidade já eram quase 17:00h e corremos para nos acomodar.

Logo em seguida encontramos o Rodrigo Cury, que já havia chegado à cidade há algumas horas.

O restante do dia foi só turismo e preparação para a nossa jornada do dia seguinte.

 

 

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13/07/09, segunda-feira, 17:37as - Os Camelos e a Igreja. Buscando forças para a aventura que viria.

 

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13/07/09, segunda-feira, 17:30h - Só alegria na véspera da grande aventura do ano.

 

 

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13/07/0 , segunda-feira, 18:21h - Na pracinha à noite. Nosso hotel é este sobradinho à direita.

 

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13/07/09, segunda-feira, 18:5h - Alê, Rodrigo e eu, curtindo o friozinho da noite.

 

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13/07/09, segunda-feira , 19:59h - A turma toda tomando um café antes de se recolher. Da esquerda para a direita: Alê, Alberto (eu), Rodrigo, Jorginho, Jackson e Dinho.

 

 

Aqui vale abrir outro parágrafo que para relatar um fato que seria de suma importância para a nossa excursão.

Já íamos nos recolher, quando estávamos entrando no hotel e, de repente um homem em uma bicicleta nos interpelou perguntando se éramos do grupo que iria fazer a S. Fina no dia seguinte.

Confirmamos e ele se apresentou como sendo o Guto – guia local que iria também fazer a S. Fina no dia seguinte com um ciente de S. Paulo.

Conversamos um pouco e ele nos deu algumas dicas sobre o nosso resgate e outras coisas, além de dizer que iria sair um pouco mais tarde que nós.

 

 

2º Dia – 14/07/2009 - Terça-Feira – COMEÇA A AVENTURA RUMO AO CAPIM AMARELO

 

 

Acordamos as 6:00as e fomos tomar nosso café.

 

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14/07/09, terça-feira, 6:27h – Tomando café da manhã antes da partida para a Serra Fina. Observe pela janela, que ainda é noite na cidade e o frio é intenso.

 

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As 7:00as já estávamos embarcando na Kombi do Celso – nosso resgate –e a caminho da tocado Lobo.

 

FOTO 11 (NO SITE DOS CAMELOS)

14/07/09, terça-feira, 7:16h - A turma embarcando na Kombi, rumo à Toca do Lobo.

 

O dia estava maravilhoso, limpo e sem chances aparente de chuva. A mandinga do Oteb havia dado certo, mais uma vez.

Abastecemos-nos com 4 lts de água cada um, pois sabíamos que a próxima fonte de água seria apenas no Vale do Ruar, apenas na Quinta-feira. Ou seja; água para dois dias de caminhada.

A minha mochila era a maior, pra variar, e parecia que pesava uns 30kgs com aquela carga adicional de água.

 

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14/07/09, terça-feira, 8:15h - Abastecemos as garrafas na Toca do Lobo. Foram mais 4kg de carga em cada mochila.

 

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14/07/09, terça-feira, 8:10h - Ainda na Toca do Lobo. Observe a esquerda da foto uma pequena gruta. Ela é bastante rasa, mas deu o nome ao local.

 

Cruzamos o Riacho e começamos a subir por uma trilha pouco marcada, ao contrário do que havia lido nos relatos.

Uma hora depois, a trilha abriu e a navegação ficou mais fácil.

 

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14/07/09 , terça-feira, 9:01h - Após uma hora de caminhada, a vegetação começa a mudar sua característica para a forma tradicional de montanha.

 

A essa altura do campeonato, nosso maravilhoso, fabuloso, fantástico e excepcional GPS, já estava me apresentando suas credenciais – margem de erro média de 10 metros, com céu claro.

Imediatamente coloquei nosso “batedor” (Jackson) na vanguarda da coluna e segui logo atrás, navegando, ou melhor, tentando navegar com o nosso trombolhudo GPS (GARMIM LEGEND = NÃO COMPREM).

Após o primeiro trecho, meio confuso, a trilha se apresentou até tranqüila, apesar da subida ser sempre constante. Os visuais não tardaram a aparecer e alguma hora depois estava no Quartzito a mais de 2.000m de altitude.

 

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14/06/09 , terça-feira, 9:00h – Eu e Dinho rumo ao Quartzito. Seria um dia muito difícil para o meu amigo.

 

Foi então que a S. Fina começou a se mostrar em todo o seu esplendor e magnitude.

Caminhamos sobre a crista das montanhas, em um incessante descer e subir, com o Monte do Capim Amarelo Ameaçadoramente a nossa frente.

 

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14/07/09, terça-feira, 10:44h – Foto tirada do quartzito. Grandiosidade que imagens não são suficientes para expressar. É preciso estar lá para sentir.

 

A cada pequena descida, sucedia uma subida maior ainda e neste ritmo fomos ganhando altura, até que chegamos à base do Capim Amarelo.

A essa altura do campeonato, o Dinho já estava “estragado” e se tivesse na Tropa de Elite, ele ia “pedir pra sair”. É sempre assim. No primeiro dia ele sempre demora a metabolizar e fica ruim.

 

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14/07/09, terça-feira, 11:40h – A caminho do Capim Amarelo, o Dinho estava quebradão. Ruim de marrédessí.

 

Por outro lado, o Alê disparou na frente, já que a trilha estava muito bem demarcada. Logo, ele havia sumido da nossa vista.

O restante da turma ia bem e pra variar, os garotos (Jackson e Jorginho) estavam loucos pra seguir o Alê. Coisas da idade e da saúde em excesso.

A subida do Capim Amarelo foi duríssima.

 

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14/07/09, terça-feira, 13:46h – A caminho do Capim Amarelo. Um dos muitos trechos em que tivemos que utilizar as mãos para escalaminhar.

 

O interessante é a diferença singular entre o PARNASO e a Mantiqueira.

No PARNASO, após uma determinada altitude a vegetação passa a ser composta de capim de anta baixo, com pequenas áreas de vegetações maiores, entre uma montanha e outra.

Já da Mantiqueira, a coisa é diferente. No meio de uma subida com uma vegetação tradicional de campo de altitude, a gente acaba se deparando, em plena subida, com uma mata bastante densa, de árvores altas, bem parecidas com aquela mata da subida da Pedra da Gávea, via Estrada das Canoas, próxima à Geladeira.

Neste ponto, tivemos, eu, Jackson e Jorginho, que parar pra esperar o Dinho, que estava muito ruim lá atrás. O Rodrigo, que estava sobrando e cheio de gás, acompanhou o Alê e seguiu.

Após a chegada do Dinho, descansamos um pouco e seguimos.

Subida dura, com uso freqüente das mãos para vencer a vegetação densa e a lama escorregadia e constante.

Quase caí. O Jackson, que estava atrás de mim, presenciou e levou um susto. Escorreguei em uma subida de mais de 70 graus de inclinação e me segurei com a mão esquerda em uma raiz.

Esta manobra me custou uma luxação no ombro que iria me perturbar silenciosamente por toda a travessia.

Logo após, encontramos os dois vanguardistas (Alê e Rodrigo) e descansamos um pouco mais.

Energético, granola, água (sempre contida), papo, fotos e seguimos para o último esforço no intuito de vencer o Capim Amarelo.

Após seis horas e meia de caminhada, chegamos ao cume do Capim Amarelo.

Quando chegamos lá, o Alê já havia montado a sua barraca. O cara deu um gás inacreditável no final. Comemoramos muito, pois certamente havia sido o maior esforço de subida que eu havia feito nesses meus nove anos de montanhismo.

O Alto do Capim Amarelo:

 

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A direita está o Quartzito e caminhando pela crista, lá no canto superior esquerdo, o Pico do Capim Amarelo, com o interminável sobe e desce até chegar ao seu cume. Fonte Wikpedia

 

São 2.500m de altitude encravado na Serra da Mantiqueira.

O seu cume é plano, coberto de capim de anta com dois metros de altura.

No meio destes capins existem diversas clareiras excelentes para montar acampamento, tornando todo este capim do entorno, uma ótima proteção dos ventos cortantes do local.

O visual é esplêndido e logo tratamos de montar nosso acampamento e preparar o almoço/jantar.

 

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14/07/09, terça-feira, 14:58h – No alto do Capim Amarelo. Enfim, acampados e descansando.

 

Logo depois chegaram o Guto e o seu cliente (André).

A partir deste momento, o Guto nos “adotou” como caronas e se tornou fundamental para o sucesso de nossa expedição.

Logo ele nos deu a primeira dica, que eu jamais havia lido em qualquer relato sobre a Serra Fina.

Existe na Serra Fina uma praga de ratos silvestres:

Pois é, podem acreditar: Todos os picos da Serra Fina, freqüentados por montanhistas, estão infestados de pequenos camundongos silvestres que chegam perto da gente, sem a menor cerimônia, assim que começamos a esquentar a comida.

Eles já estão acostumados conosco e ficam aguardando a gente dar bobeira ou dormir, para assaltar nossos alimentos.

O Guto recomendou que colocássemos os alimentos dentro de sacos plásticos e dentro da mochila fechada, para não exalar cheiro, pois eles são capazes de roer a barraca, roer a mochila e pegar a comida no meio da noite.

A saída é deixar um “suborno”, ou seja, um pouco de comida, ou embalagens usadas a certa distância da barraca, para que eles se fartem de comer e nos deixem em paz.

Assim eu fiz. Deixei uma lata de feijão suja a uns 5 metros da barraca e acordei várias vezes durante a noite com o barulho da bendita lata sendo revirada e, pela manhã, a mesma estava brilhando de lustrada e cheia de coco de rato.

Que M.....!!!

Depois disso, todas as noites foram um misto de cansaço, dor no corpo, torpor e alerta, para que os ratos não furassem minha preciosa barraquinha Manaslú, comprada com tanto sacrifício.

A vítima dos ratos, no nosso grupo foi o André (o paulistano), que teve sua barraca furada por um desses “Jerris” famintos.

Deixando os ratos de lado, e voltando para o Alto do Capim Amarelo, assistimos a um por do sol esplendoroso e um nascer do sol fantástico.

 

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14/07/09, terça-feira, 16:21h – Visual do alto do Capim Amarelo. Observem no centro da foto, dentro daquilo que parece uma cratera, uma formação rochosa parecendo uma caveira. Chama-se Pedra da Caveira. A direita da foto há um pequeno ponto branco e brilhante que se destaca. Trata-se de destroços de um bimotor que se chocou com a montanha. Piloto e co-piloto morreram com a colisão.

 

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14/07/09, terça-feira, 16:25h – Eu, Rodrigo e Dinho, contemplando a beleza do lugar. Recompensa merecida após um dia de muito esforço.

 

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14/07/09, terça-feira, 18:07h – Jackson apreciando o belo por do Sol no Capim Amarelo.

 

Segundo alguns relatos, o primeiro dia, até o Capim Amarelo, é o pior, com a subida mais exaustiva.

Isso me confortava e eu coloquei esta observação para o grupo, principalmente para animar o Dinho, que já alimentava a idéia de voltar pela rota de fuga do Paiolinho.

A verdade é que eu estava enganado, pois os desafios estavam apenas começando...

 

3º Dia – 15/07/2009 – Quarta-Feira – RUMO À PEDRA DA MINA

Tomamos nosso café e partimos animados, por volta das 9:00h, em direção à Pedra da Mina; o 4º maior pico do Brasil ficando atrás apenas do Pico da Neblina, Monte Roraima e Pico da Bandeira.

 

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15/07/09, quarta-feira, 8:53h - A caminho da Pedra da Mina. Turma reunida no Alto do Capim Amarelo, pronta pra partida. Da esquerda para a direita: Em pé: Alê, Jorginho, Rodrigo, André e Guto. Agachados: Eu (Alberto), Jackson e Dinho

 

Ocorre que o acesso a Pedra da Mina é infinitamente mais difícil do que o Pico da Bandeira, conforme iríamos sentir na pele.

Neste dia, fomos logo cedo apresentados ao famoso Capim de Anta de mais de dois metros e aos insuportáveis e quase intransponíveis bambuzais da Serra Fina.

Foi uma sucessão infinita de desce e sobe, por um terreno que oferece aos amantes do Treking, uma variedade enorme de dificuldades, que coloca o PARNASO no nível de um parque de diversões.

As 10:20h demos uma parada em um local descampado chamado Maracanã e o Guto pediu que aguardássemos ali. Ele sumiu no mapa e voltou, logo depois, com um punhado de mantimentos.

É que os guias costumam ter os seus locais secretos, onde armazenam mantimentos para o caso de emergências.

Isso me lembrou o Arones lá nas matas de Magé, com os seus depósitos secretos de mantimentos e tralhas.

 

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15/07/09, quarta-feira, 10:22h – Este local é chamado de Maracanã. Ponto de repouso e ótimo lugar para acampar. Paramos por quinze minutos e seguimos.

 

Voltamos logo para a trilha e logo caminhávamos entre touceiras de capim de anta, bambuzais, mata fechada e trepa pedras, quando de repente, a Serra Fina resolveu dar o ar da graça.

Este lugar pode ser comparado a uma misteriosa e volúvel mulher:

Por alguns momentos o explorador tem a sensação de estar caminhando nas nuvens, tamanha a sua beleza.

Quando menos se espera, estamos embrenhados em uma floresta fechada ou quase escalando trechos completamente inesperados, pelo seu grau de dificuldade e beleza recompensadora.

Em outros momentos, cruzamos extensos campos de capim de anta, que nos cobrem até a cabeça, nos massageando e arranhando ao mesmo tempo, como uma mulher repleta de volúpia e pronta a nos devorar até a nossa essência.

Quando acreditamos que temos o domínio da situação, ela se revela, em toda a sua plenitude, aridez e crueza, nos dominando e subjugando, para provar que tem todo o domínio da situação e quem manda é ela.

Foi assim que a Serra Fina se comportou neste dia...

Paramos para lanchar as 11:00h e de repente o Guto nos aconselhou a colocar os agasalhos e, num piscar de olhos, as nuvens se aproximaram com uma velocidade espantosa, carregadas com um vento forte e agonizante, nos empurrando para o lado oposto do que caminhávamos.

 

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15/07/09, quarta-feira, 11:08h – Nesta parada, o Guto nos preveniu para o tempo que iria virar dali em diante. Observem o “russo” subindo entre eu e o Guto (de camiseta preta).

 

A neblina tomou conta de tudo e caminhar exigia um enorme esforço.

As 14:00as, chegamos a uma pequena queda d’água chamada Cachoeira Vermelha.

Não nos abastecemos, porque a água é intragável, pelo alto grau de minério de ferro na sua composição.

Tiramos algumas fotos e seguimos.

 

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15/07/09, quarta-feira, 14:04as – Parada em frente à Cachoeira Vermelha. Observem atrás de minha mochila uma pequena queda d’água. É ela! A água não é boa, pois tem muito minério em sua composição.

 

Chegamos à base da Pedra da Mina e nos abastecemos, depois de mais de 36 horas do último abastecimento na Toca do Lobo.

Valeu à pena, pois a água deste riacho é pura e cristalina.

Fartamos-nos de beber e enchemos as nossas reservas, que já estavam em um nível crítico.

Mais pesados, em virtude da carga de água, retomamos a subida e o ataque final ao Cume da Pedra da Mina.

Não preciso dizer que a subida foi terrível.

O vento açoitava as capas das mochilas, de forma que elas pareciam velas de navios.

A neblina era densa e fria e nossas forças, cada vez menores.

 

 

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15/07/09, quarta-feira, 15:16as – Último ataque à Pedra da Mina. Os totens de lá, são sempre amigos.

Observem o tempo fechado. Pena que a foto não registrou a ventania.

 

Finalmente, depois de mais de 8 horas de caminhada muito pesada, chegamos ao topo da Pedra da Mina, em meio a muita emoção, gritos de entusiasmo e euforia.

Foi uma subida e chegada inesquecível.

Tocar aquele marco com a indicação geodésica da Pedra da Mina foi um momento de muita emoção para todos nós.

Assinamos o livro do cume e tiramos muitas fotos.

 

 

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15/07/09, quarta-feira, 16:11as – A poucos metros do cume da Pedra da Mina. Momento de emoção e glória pessoal para todos.

 

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15/07/09, quarta-feira, 16:16as – Emoção da chegada após três anos de planejamento. O Dinho tinha que estar comigo nessa. Valeu amigo!

 

 

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15/07/09, quarta-feira, 16:16as – A emoção da garotada também foi grande. Grandes garotos!

 

 

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15/07/09, quarta-feira, 16:16as – Marco geodésico do IBGE na Pedra da Mina.

 

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15/07/09, quarta-feira, 16:22as – Jorginho assinando o Livro de Cume. Não reparem na meleca congelada, nem nos dentes imundos hehehe.

 

Não preciso dizer, que dormir no cume seria impossível, em virtude do mal tempo e do pouco espaço para montar barraca.

Só há um pequeno ponto abrigado e com espaço, onde só cabe uma barraca pequena.

O restante do espaço é composto de terreno rochoso e irregular.

Mais uma vez, por intervenção do Guto, descemos uns 10 minutos até um local chamado Cratera, onde o vento não batia e havia muitos pontos excelentes para se montar barracas.

Acampamos, comemos e ficamos na expectativa de como o tempo iria se comportar, pois havia grande possibilidade de termos que retornar pelo Paiolinho, caso o tempo continuasse ruim.

Por falar nisso, o nosso guia emprestado (Guto), iria retornar à Toca do Lobo, de qualquer forma, pelo Paiolinho no dia seguinte, pois já havia tratado com o André, em virtude de um compromisso com a sua filha no dia seguinte.

Com isso, um grande dilema pairou sobre o grupo e fiquei com a responsabilidade de definir se seguiríamos ou não, no dia seguinte.

A situação, ao final do dia era a seguinte:

• O Dinho estava quebrado e estava pensando em retornar com o Guto pelo Paiolinho.

• O Rodrigo queria seguir de qualquer jeito, mesmo caindo tempestade.

• O Alê estava cauteloso, porém, queria seguir.

• O André queria seguir conosco, mas estava muito preocupado, já que não nos conhecia bem e duvidava da nossa capacidade de navegação.

• Os garotos – Jackson e Jorginho – estavam sobrando no grupo e queriam é mais.

• O Guto voltaria de qualquer maneira pelo Paiolinho.

• Eu estava:

o Quebrado e cansado, com uma puta distensão no ombro e uma dor insuportável.

o Com um GPS que não funcionava bem, nem com tempo bom. O que não dizer com tempo fechado.

o Às vésperas de encarar o pior trecho de navegação da travessia (Vale do Ruar). Sem GPS, sem guia e com um monte de malucos comigo.

o Desapontado, com a possibilidade de ter que abortar esta travessia, planejada durante três anos e sem nenhuma vontade de retornar, em caso de fracasso.

Só nos restava orar e esperar o amanhecer.

No meio da noite, veio a boa notícia.

O Dinho acordou para ir ao banheiro e ficou comemorando, pois o céu estava limpo e estrelado, anunciando um lindo dia.

Aquilo me animou e nem saí da barraca para ver, pois naquele momento, tive a certeza de que iríamos concluir a travessia da Serra Fina.

Dormi que nem uma pedra!

 

4º Dia – 16/07/2009 – Quinta-Feira – RUMO AO PICO DOS TRÊS ESTADOS ENFRENTANDO O TEMIDO VALE DO RUAR

 

Acordamos cedo e muito felizes, pois o dia estava favorável.

O sol voltou a brilhar e os ânimos se acenderam.

Dinho estava recuperado, otimista e pronto para seguir.

Eu estava melhor, em virtude da virada positiva do tempo.

O restante da rapaziada estava afiando os cascos e prontos para seguir.

Subimos pra ver o nascer do sol e ficamos eufóricos com o visual e o tempo bom. Tiramos muitas fotos e descemos para a cratera, a fim de levantar acampamento.

 

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16/07/09, quinta-feira, 7:10h – Amanhecer no topo da Pedra da Mina. Enfim, tempo bom de novo

 

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16/07/09, quinta-feira, 7:12h – Comemoração e euforia, celebrando o novo dia que chegou

Lanchamos, colocamos o equipamento para secar, levantamos acampamento e nos despedimos do Guto, que estava retornando pelo Paiolinho, conforme previsto.

 

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16/07/09, quinta-feira, 7:34h – A cratera da Pedra da Mina. Ótimo ponto de camping, protegido das intempéries do topo e com o chão macio e plano

 

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16/07/09, quinta-feira, 9:06h – Eu e Rodrigo nos despedindo do Guto, que iria retornar pelo Paiolinho, em virtude de um compromisso familiar. Agora era por nossa conta e risco apenas

 

Agora era por nossa conta e risco.

Embora o Guto tivesse passado dicas preciosas do caminho a seguir, nos apontando a rota, do cume da Pedra da Mina, a apreensão era visível, já que sabíamos que não poderíamos mais contar com o GPS, principalmente, se o tempo resolvesse virar.

Mas não havia retorno para nós e resolvemos seguir.

O Guto havia nos instruído a descer por 40 minutos pela pedra e, ao Chegar ao Vale do Ruar, deveríamos encarar a “floresta de Capim de Anta”, sem trilha, procurando a direção de um cânion que ficava entre duas montanhas.

Ao achar um córrego, deveríamos pulá-lo e segui-lo, mantendo-o a nossa esquerda, até que o Vale começasse a fechar entre duas montanhas.

Daí então, deveríamos quebrar 90º à direita e procurar um único Tóten localizado no cume de uma montanha próxima. Achado o Tóten, deveríamos seguir ziguezagueando o capim de anta, já que é impossível encará-lo de frente, até o tal Tóten, que nos indicaria a saída do Vale do Ruar.

A teoria parecia fácil, mas, pra variar, se mostrou muito diferente na prática.

Partimos as 9:15h, com uma hora de atraso. Porém, era preciso, pois necessitávamos secar o equipamento.

A descida até o vale do Ruar foi previsível. Bastante íngreme, porém, sem maiores dificuldades.

Logo estávamos de frente a uma imensa floresta de capim de anta com mais de 2m de altura e quase sem trilha.

Logo achamos o córrego e tratamos de pulá-lo, conforme instrução do Guto.

 

 

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16/07/09, quinta-feira, 10:52h – Guto se preparando para decolar e pular o córrego no Vale do Ruar

Daí em diante, nossos problemas começaram, pois, de repente, a trilha que já era ruim, desapareceu e perdemos a referência do Rio.

Neste ponto o grupo se dividiu, pois o GPS marcava o caminho pela direita, subindo diretamente por um morro com o capim de anta muito fechado. O Rodrigo insistia que deveríamos quebrar para a esquerda e procurar o rio, conforme indicação do Guto, mas eu, em um ataque de liderança desenfreada, achei que deveríamos seguir as instruções do maldito GPS.

Ainda vinha em minha cabeça a experiência na Serra dos Órgãos a dois anos atrás, quando não confiamos no GPS e acabamos tendo que descer uma ribanceira de pedra, que quase nos levou a um acidente.

Eu estava errado, pois o caminho por mim escolhido era impossível de seguir, além de nos levar, caso insistíssemos a ficar sem água e fora da rota.

Parei, refleti, dei razão ao Rodrigo, que a essa altura já estava puto e me chamando de teimoso, com razão, por sinal e propus ao grupo, se dividir em dois.

Enquanto fiquei parado no local, mais elevado, com parte do grupo, o Rodrigo seguiu com o Dinho e o André em busca do Riacho.

Não demorou e eles nos comunicaram pelo rádio que haviam achado o caminho e seguimos felizes até eles, enfrentando o capim de anta pelos peitos

Seguimos flanqueando o córrego pela nossa esquerda até que a cânion se fechou.

 

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16/07/09, quinta-feira, 11:22h – Último ponto de água da travessia. Fica no Vale do Ruar. A água mais pura que já bebi em minha vida. Água agora, só no final da travessia

 

Abastecemos-nos de água. E quebramos para a direita a procura do tóten em cima do morro.

Mas qual morro? A neblina, de repente, tomou conta do Vale e mais uma vez não se via nada!

E agora? Não preciso dizer que o GPS não marcava nada, com sua margem de erro média nunca menor do que 25 metros.

Saímos peitando aquele insuportável e quase intransponível capinzal, procurando subir o morro, completamente sem referência.

Cabe aqui, abrir mais um parágrafo para falar sobre o Jackson.

São nas horas difíceis que os heróis se apresentam e desta vez não foi diferente.

Antes de iniciarmos o dia, havíamos traçado uma estratégia para enfrentar o Vale do Ruar.

Como o terreno prometia ser muito difícil, sem trilhas e com muitos buracos, com poças escondidas de até dois metros de profundidade, conforme os relatos lidos e confirmados pelo Guto, acertei com o Jackson, que, como eu teria que navegar (ou tentar) pelo GPS, não poderia olhar a trilha. Assim ele iria um metro na minha frente, de olho no chão, enquanto eu ficava com os olhos grudados no GPS instruindo a sua direção.

Esta fórmula deu certo, parcialmente, já que o GPS não ajudou muito, ou quase nada.

O fato é que o Jackson enfrentou toda a situação como um adulto e liderou o grupo por todo o Vale do Ruar.

Quando chegamos ao cânion e a situação piorou, o garoto encarou o capim de anta pela frente, liderando o grupo, até que, numa “janela” na neblina o André visualizou o Tóten e a coisa ficou melhor, pois daí em diante, teríamos um farol para nos indicar a saída daquele lugar.

Saímos! Foi muito duro, exatamente como todos os relatos nos indicaram, Muito difícil e sofrido este trecho do Vale do Ruar.

Paramos ao lado do desejado, maravilhoso e amigo Tóten e descansamos.

 

Foi então que o Jackson mostrou a extensão de seu sofrimento, dignidade e valentia, pois suas mãos estavam todas cortadas e sangrando, em virtude de sua luta com aquele capinzal.

 

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16/07/09, quinta-feira, 12:15h – Esse garoto é um Leão. Liderou a travessia do Vale do Ruar e terminou com as mãos inchadas e com sangue. Observem a expressão de seu semblante. Grande garoto!

 

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16/07/09, quinta-feira, 12:15h – Final da travessia do Vale do Ruar. Embora não pareça, esta foto foi tirada de cima do morro logo após o Vale do Ruar. Observem o Tóten por cima da mochila do Jorginho e lá embaixo, toda a imensidão do temido Vale do Ruar, atrás do Rodrigo,com sua floresta de Capim de Anta. Embora pareça um gramado, o Rodrigo está na beirada do morro e aquela visão atrás dele está a uns 20 ou 30 metros para baixo

 

Outro parágrafo importante que preciso abrir é para falar sobre a maior dificuldade que encontrei e vocês observarão a seguir. A falta de água.

Em toda a travessia da Serra Fina existem quatro pontos de abastecimento, sendo que apenas dois estão no meio do caminho e muito próximos um do outro.

São eles:

1. Toca do Lobo, no início da trilha;

2. Base da Pedra da Mina, só no final do segundo dia;

3. Base oposta da Pedra da Mina, no Vale do Ruar, ou seja, muito perto do ponto anterior. O que causa uma falsa sensação ao montanhista, que não precisará de muita água para o restante da travessia. Este foi o meu maior erro!

4. No final do quarto dia, já próximo ao Sítio do Pierre.

Como vocês podem observar, na prática, são apenas dois pontos de reabastecimento muito próximos um do outro.

Durante estes dias, o montanhista sofre muito com a escassez de água, já que as subidas são inúmeras e a necessidade de água é muito grande.

Como não podemos atender a esta necessidade, o corpo sofre com a desidratação e o rim começa a reclamar.

A urina fica muito amarela, viscosa e com um odor muito forte.

Nos relatos lidos por mim, recomendava-se que nos abastecêssemos a cada vez, com quatro litros de água, mas a experiência mostrou-me, que, ao menos para mim, que o ideal seriam seis litros por vez.

Acreditem. O esforço em carregar um excesso de peso será muito recompensado no final.

Durante o abastecimento no Vale do Ruar, subestimei minhas necessidades e me abasteci apenas com 3 litros de água. Foi um grande erro, que me faria sofrer no dia seguinte.

Após o Vale do Ruar, descansamos um pouco e seguimos por um interminável sobe e desce de montanhas.

Eram tantas que o GPS marcava pico um, pico2, pico3, etc.

Durante este trecho nos deparamos com um grupo de “montanhistas” que vinham em sentido oposto. Parecia ser um grupo muito heterogêneo, com alguns casais e composto por pessoas bastante jovens.

Eles pareciam estar meio perdidos e o seu “líder” nos informou que haviam pernoitado no Pico dos Três Estados e pretendiam pernoitar naquele dia na Pedra da Mina e descer pelo Paiolinho no dia seguinte.

Aquilo me preocupou, pois já era tarde e eles não tinham referência, apenas um GPS, sem os tracklogs marcados, ou seja, o mesmo que um relógio sem ponteiros.

Estavam perdidos e não sabiam que ainda enfrentariam o Vale do Ruar em pleno cair de tarde no meio da neblina.

Não deve ser nada agradável dormir no Vale do Ruar, pois dizem que é o ponto mais frio e certamente úmido da Serra Fina.

O André, pacientemente deu algumas dicas e seguimos o nosso caminho.

Daí em diante, encaramos um sobe e desce interminável e, quando o tempo permitia, altos visuais das Agulhas Negras. Até que as 14:00h demos uma parada para o lanche.

 

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16/07/09, quinta-feira, 14:11h – A caminho dos Três Estados, demos uma breve parada para descanso. Já estávamos muito cansados

 

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16/07/09, quinta-feira, 14:12h – Companheiros inseparáveis. Minas botas e chapéu

Embora este dia seja muito sofrido, em decorrência do esforço, valeu muito à pena, pois os visuais e a sensação de caminhar sempre pela crista das montanhas causam um sentimento de liberdade imenso.

 

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16/07/09, quinta-feira, 14:57h – A caminho dos Três Estados. Caminhando sempre pela crista e seguindo o sol

 

 

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16/07/09, quinta-feira, 15:00h – Rodrigo, sempre sorridente e com disposição de sobra

 

 

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16/07/09, quinta-feira, 15:02h – Finalmente eles sentaram. Não se cansam estes dois

 

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16/07/09, quinta-feira, 15:19h – A bromélia e a montanha no caminho até os Três Estados, com o André ao fundo. Mais uma descida com um “morrinho” à frente para ser vencido

 

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16/07/09, quinta-feira, 15:25h. Observem que na foto anterior, estávamos em um campo de altitude, descendo uma encosta. Seis minutos após, já estávamos encarando este bambuzal. Este é o encanto da Serra Fina. Terreno completamente imprevisível

 

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16/07/09, quinta-feira, 16:01h – Apenas 36 minutos após a foto anterior, já estamos de volta à crista da Serra Fina, contemplando o maravilhoso visual das Agulhas Negras e Prateleiras ao fundo

 

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16/07/09, quinta-feira, 16:22h – Rodrigo maravilhado com o visual chegando a mais uma crista

 

Por volta das 17:30as chegamos finalmente no Pico dos Três Estados. Cansados e felizes por ser o último pernoite na montanha.

Montamos o acampamento e fomos logo comer, pois estávamos todos muito extenuados.

O interessante nos Três Estados, é que lá, os ratinhos são mais abusados. Eles não esperam a gente dormir para atacar. Enquanto preparávamos a refeição, eles já iam chegando sorrateiramente para pegar o suborno deles.

A topografia do Pico dos três Estados, é muito parecida com o do Capim Amarelo. Capim de Anta alto com clareiras protegidas do vento. Muito legal e com um solo confortável e plano.

A noite nos Três Estados não foi muito agradável. Não sei se foi pela ansiedade da última noite, se foi o receio dos terríveis ratinhos, ou se foi a sede interminável que me forçava a dar pequenos goles durante a noite, a fim de poupar água. O que sei é que não dormi quase nada.

Fato curioso é que em dado momento da madrugada, acordei para fazer o número um. Como estava muito frio, resovi depositar o líquido em uma de minhas garrafas que já estavam vazias.

Até aí tudo bem. Até que eu vi o resultado na manhã seguinte...

 

5º Dia – 17/07/2009 – Sexta-Feira – ULTIMO DIA. QUEM DISSE QUE IRIA SER FÁCIL?

 

Acordamos ainda em tempo de ver o nascer do sol. Posso lhes assegurar que é muito difícil escolher a melhor vista da Serra Fina, pois em todos os picos que pernoitamos, o visual era alucinante.

 

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17/07/09, sexta-feira, 7:07as – Lê, eu e Dinho curtindo o nascer do Sol no Pico dos Três Estados.

 

Quase ninguém conseguiu dormir direito naquela noite, apesar do tempo ter colaborado e o terreno ser bem plano e macio.

Em determinado momento, o Dinho foi a minha barraca pegar alguma coisa e me perguntou se eu havia feito suco. Quando olhei, e a minha garrafa de xixi, que para meu espanto tinha uma urina com um aspecto viscoso e com cor de mostarda.

Fiquei assustado, pois tinha certeza de que aquilo era fruto de quatro dias de racionamento e meus rins já estavam dando sinais de que não iam muito bem.

Vocês se lembram que eu havia me reabastecido com apenas três litros de água no dia anterior?

Pois é. Agora só me restava um litro de água para um dia inteiro de caminhada.

Coloquei-a no meu Camelback e preparei meu equipamento para a partida.

 

 

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17/07/09, sexta-feira, 8:13as – Levantando acampamento no Pico dos Três Estados para o último dia de caminhada. Observem a ventania, apesar do céu azul. Isso voando é o toldo da minha barraca.

 

Partimos dos Três Estados por volta das 8:30as e seguimos em direção ao Alto dos Ivos.

Teoricamente, pelos relatos anteriores, este dia seria o mais tranqüilo de todos, pois O Ivos seria o último grande pico da travessia e após ele, teríamos só descida e a volta pra casa. MENTIRA !!!

Some-se o cansaço de três dias de caminhada extenuante aliado a um racionamento severo de água, o que proporciona um mal funcionamento generalizado do organismo, além de maximizar a fadiga muscular. Some tudo isso, com o desejo enorme de concluir o desafio. Nesta conjuntura, o quarto dia, pelo menos para mim, pareceu ser o mais duro de todos.

Iniciamos com uma série de descidas e subidas constantes, em direção ao Ivos, com um terreno completamente inóspito. Descidas enormes variando entre pedras, lama, capim de anta e bambuzais.

Chegamos à base do Ivos e encaramos uma subida super-hiper pesada e chegamos ao seu cume por volta das 12:00as. A esta altura do campeonato, minha água havia acabado e ainda nos restavam quase cinco horas de caminhada.

 

 

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17/07/09, sexta-feira, 11:10as – A caminho do Alto dos Ivos. A saída é por aí...

 

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17/07/09, sexta-feira, 12:38as – Descendo o Alto dos Ivos.

 

Teríamos ainda mais quatro horas de caminhada pela frente.

Após chegarmos ao Alto dos Ivos, encaramos uma descida muito difícil e somando-se à falta d'água, que já estava me causando uma desidratação terrível, não fui capaz de fazer mais nenhum registro visual, dado o meu estado de debilidade. Se arrependimento matasse, eu ficaria por lá, mortinho da silva, pois foi justamente aquele único litro de água que eu não abasteci lá no Ruar, que estavam fazendo toda a diferença.

Foi uma pena eu não ter conseguido tirar mais fotos, pois neste ponto do trecho, encaramos os piores bambuzais da travessia. Aqueles que o pessoal diz nos relatos que o montanhista tem que tirar a mochila e rastejar.

Para nossa surpresa, a trilha, neste ponto já está bem batida e, com o passar dos montanhistas, não foi preciso rastejar para vencer o bambuzal, porém a dificuldade foi imensa, pois tínhamos que nos contorcer e agachar a todo o momento para passar por aqueles terríveis bambus que se entrecruzavam como uma teia de aranha em nosso caminho.

Imagine fazer contorcionismo e se agachar depois de quatro dias na montanha, sem água e com mais de 20kg nas costas. A impressão que me dava a todo o momento é que a Serra Fina não queria nos deixar, pois foram muitas as vezes em que, após vencer um obstáculo de bambu, eu me via jogado pra traz por um bambuzinho agarrado à minha mochila, causando aquele efeito do elástico que me jogava para traz como quem diz: “Volta seu corno. Volta que daqui você não sai!”.

Agora vou abrir o último parágrafo deste “breve” rsssss relato para falar da amizade e da solidariedade:

As últimas quatro horas da travessia para mim, foram terríveis, principalmente pela falta de água, que me causou uma desidratação que tirou minhas forças neste trecho.

Eu ia na coluna atrás do Alê, olhando uma garrafinha de Gatorade que ele havia deixado do lado de fora da sua mochila, com uns 300ml de água. Provavelmente era a última água dele. De vez em quando ele sacava daquela garrafinha, caminhando sem parar, e dava aquele precioso golinho.

Aquela visão me dava um desespero terrível e a minha boca parecia que estava cheia de areia. Automaticamente, ao ver aquela cena que se deu repetidas vezes, me dava uma vertigem danada e a vontade era de sentar e ficar por ali mesmo, até que o carro pipa chegasse. Como o carro pipa não iria chegar mesmo, eu seguia em frente, com a boca cheia de areia mesmo.

O Dinho que vinha atrás de mim, notou a minha dificuldade, pois eu não havia falado pra ninguém que a minha água havia acabado, já que o erro havia sido meu em não me abastecer com os quatro litros mínimos de água lá no Ruar. Por isso, eu achava que deveria me punir por isso e não espalhar pra turma.

Mas, amigos se conhecem e aquilo não passou despercebido pelo Dinho. Foi aí que ele, também com pouca água, ficou insistindo para que eu bebesse a água dele, falando:

_ Você ta querendo dar uma de herói cara.

_ Herói morto não tem valor.

_Bebe essa água logo.

_etc, etc, etc.

Pois bem; fiz uso da sua água por três preciosas ocasiões, dando um total de seis goles, que foram a minha salvação.

Não fosse isso, teria problemas ainda maiores. Valeu Dinho. Você é irmão.

De repente e lentamente, a trilha começou a abrir e a vegetação a ficar mais densa, transformando-se gradativamente em uma estradinha apertada e com uma matinha rala, cercada por uma vegetação mais densa.

Encontramos logo uma pequena nascente, e não consigo dizer que nos esbaldamos de tanto beber água. Meus rins, se tivessem boca, estariam gargalhando naquele momento.

Bebi muuuuita água.

Além disso, enchi meu camelback com mais dois litros e termine todo o trecho com aquela mangueirinha conectada à minha boca bebendo e me hidratando. Renasci! Agora eu estava pronto pra fazer a Travessia pelo caminho oposto. Brincadeirinha hehehe.

Chegamos finalmente ao Sítio do Pierre. Super bonito, porém abandonado. Parece que aquilo já foi uma pousada, porque tem quadra, uma série de construções e uma piscina seca. Tudo abandonado. Que desperdício.

 

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17/07/09, sexta-feira, 16:00as – Acabamos de chegar ao Sítio do Pierre. Observem que a trilha termina naquele mourão à direita da foto.

 

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17/07/09, sexta-feira, 16:02as – Descendo pela estrada que nos levará à Garganta do Registro. Ainda estamos no Sítio do Pierre e são mais 3,5km de caminhada.

 

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17/07/09, sexta-feira, 16:20as – A caminho de casa. Aquela Pedra ao Fundo chama-se Pedra do Tucum e foi nosso farol desde o Alto dos Ivos. O Guto disse que este Toten natural, serviu de farol aos primeiros viajantes no período colonial.

 

Ao chegarmos à porteira do Sítio do Pierre, único local aonde vimos sinal de humanos, havia uma casinha pequena parecendo-se a casa dos caseiros. Lá havia duas crianças bonitinhas que nos receberam com um largo sorriso perguntando se gostaríamos de tirar uma foto deles. Tiramos a foto, e para nossa surpresa, o garotinho (era um casal) foi na direção do Alê pedindo o pagamento pela foto, que foi prontamente atendido com um saquinho de amendoim. É mole? Mercantilismo na Serra Fina.

Eles eram profissionais e queriam nos explorar. O moleque estava cobrando pedágio. Hehehe

 

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17/07/09, sexta-feira, 16:48as – Na porteira do Sítio do Pierre encontramos estas duas gracinhas que queriam nos cobrar por esta foto.

 

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17/07/09, sexta-feira, 16:55as – Alegria, alegria. Acabamos de encontrar o nosso resgate na Garganta do Registro. O Celso (nosso motorista) já estava nos esperando desde as 15:00as, com aquela paciência de mineirinho. Forrou um paninho na grama e deu aquele cochilo até a nossa chegada.

 

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17/07/09, sexta-feira, 16:59as – Fim de uma aventura inesquecível que deixará saudades. Eu e meu amigo e irmão Dinho, nos preparando para entrar na Kombi.

 

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17/07/09, sexta-feira, 21:59as – Comemoração merecida, regada a pizza e vinho no Hotel Serra Azul. Vitória e muita história para contar.

 

Depois foi só comemorar, com um demorado banho quente, um Prato Feito caprichado na Pensão da Filó em Passa Quatro e pizza e vinho com um bom bate papo a noite no Hotel Serra Azul.

O dia seguinte foi todo reservado para o retorno cansativo pra casa.

É isso amigos. Espero que este “breve” relato atenda a expectativa do pessoal que teve a paciência de esperar por exatos 30 dias para que eu tivesse tempo de escrevê-lo.

Agradeço a Deus por ter nos protegido durante toda a excursão, permitindo que a semana transcorresse na maior harmonia e segurança, sem que ninguém sofresse nenhuma lesão grave, pois foram muitas as possibilidades de acidentes na Serra.

Agradeço a minha esposa e minhas filhas que tiveram a paciência de me esperar por seis dias em casa, sem saber se eu estava bem e tocando a rotina doméstica enquanto eu estava aproveitando a natureza.Não vou me esquecer disso e darei a compensação assim que for possível

Agradeço aos meus amigos que me acompanharam nesta excursão, pela solidariedade, companheirismo e principalmente paciência, durante os meus rompantes de síndrome da “chefite” aguda. Em alguns momentos eu passo dos limites. Mas peço que vocês mais novos relevem este meu excesso. É tudo levado pela preocupação com a segurança de vocês. Coisas de velho mesmo.

Agradeço aos amigos Camelos de Mochila, que não foram conosco, mas ficaram aqui torcendo muito pelo nosso sucesso. Mesmo que por interesse, pois assim poderemos guiá-los com segurança no ano que vem. Não é Oteb? Kkkkkkkkkkk

Um agradecimento especial ao Fábio (Muito Doido). Amigo sincero das horas difíceis, por sua dedicação e companheirismo. Sempre pronto a ajudar e me resgatar na rodoviária, depois de uma semana intensa nas montanhas.

Para finalizar este “Brrrrrrrrrrreeeeeve” relato, gostaria de transcrever duas mensagens para meus queridos e pacientes leitores amigos, extraídos do livro Deus Contigo de Cesar Braga Said:

“Valorize suas amizades oferecendo aos amigos o calor da sua presença.

Visite-os quando possível, telefone, escreva uma carta, mande um recado, demonstrando o quanto você se importa com eles.

Não espere pelas ocasiões especiais para externar o seu carinho. Torne especiais e únicos todos os momentos ao lado deles.

Abrace ainda hoje alguém e deixe transparecer toda a alegria de estar ao lado dessa pessoa.”

 

“Solte o pássaro da alegria que está engaiolado em seu peito, privado da alegria de cantar e de voar.

Descubra o mar profundo do seu coração, onde se escondem tesouros capazes de torná-lo muito feliz.

Vislumbre o céu azul que existe em sua consciência, sem que você já o tenha divisado.

Trabalhe as dimensões do seu ser que ainda não foram despertadas. Encontre prazer em desvendar seu mundo íntimo.

Ilumine seu rosto com um sorriso e, clareando os caminhos com a sua própria luz, contagie os que se acercarem de você com a sua alegria de viver”

 

Abraços Fraternos.

 

Alberto Monte

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Olá Alberto, excelente "breve" relato!! Tenho muita vontade fazer a Travessia da Serra Fina, mas isso ainda não é p/ mim...

Eu fiz minha primeira travessia no feriado de 09 de julho, Fiz Itaguaré- Marins, debaixo de muita chuva e muito perrengue. Mas é só quem já esteve num lugar desse para saber o quanto é maravilhoso!!! Abraço, e boas travessias!!

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Obrigado Fabinho. Realmente a Mantiqueira é muito braba com tempo ruim. Tem que ter coragem.

::putz::

É isso aí Negrabela. Toma coragem e pé na trilha ano que vem. Quem sabe a gente não se encontra lá.

:oops:

Obrigado Cacius. Realmente aqueles bambuzinhos não são mole não. Parecem garras nos puchando para tráz. :roll:

Valeu Haole. Pô cara. Depois de três dias na Serra, os dentes e o nariz passam a ser secundários né? O Pior de tudo é a cueca. ::lol4::

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Parabens pela trip, relato e fotos. Ate deu uma certa nostalgia da primeira vez q fiz a SF, no inverno de 2003.. mas deu pra sacar q algumas coisas mudaram desde entao. Entretanto, se tiver disposicao, garra e tempo vc pode enveredar por travessias mto mais dificeis, selvagens e perrengosas qto essa da mantiqueira, aqui nas proximidades. E nao tao divulgadas qto a SF, pra sorte nossa. Recomendo fazer a Serra Fina Transversal (ou Trilha do Rio Branco), q faz a SF parecer passeio no bosque.Tem tb a da Garganta da Bocaina, do Vale da Ilusao, Ciri-Graciosa, entre outras..

http://www.brasilvertical.com.br/antigo/m_trek13.html

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