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  • Membros de Honra

Ao ler um relato do Quiriri aqui no mochileiros, feito pelo amigo Otávio Teixeira de Freitas, grande paranaense de origem baiana, mencionei a ele que queria conhecer aquela região. De pronto ele me convidou para ir com a turma no feriadão (7/9, que em Curitiba emenda com 8/9 Padroeira da cidade). Coincidiu o convite com uma milhagem aérea que estava para vencer em dois dias! Não foi difícil decidir.

 

Entretanto devido as chuvas e ao frio a turma cancelou a ida para o Quiriri. O tempo prejudicaria o visual. Assim acionamos o plano B: fazer o Itupava e conhecer um pouco do Marumbi, região lindíssima do Paraná, berço do montanhismo brasileiro.

 

Segue abaixo fotos e o relato. O Otávio deve em seguida colocar mais fotos e melhorar/corrigir o texto.

 

Saímos da Estação Guadalupe no Centro de Curitiba num ônibus municipal para 4 Barras, cidade da área metropolitana da grande Curitiba. Após 40 min. a uma hora chegamos no terminal 4 Barras e com mais 20 minutos de espera tomamos o busão para Borda do Campo, onde saltamos no ponto final, a poucos metros da entrada do parque. Levamos mais ou menos 1:30 hr do centro de Curitiba até lá. O ônibus estava cheio de "itupaveiros", uma tribo que frequenta a primeira metade da trilha. Uma característica deles é que gostam de usar roupas de camuflagem. Alguns já estavam bebendo aquela hora da manhã.

 

As 9:40 começamos a descida após termos feito o registro no posto de controle do IAP. O caminho do Itupava, embora predominantemente em declive, tem uma série de subidas, especialmente nos vales formados pelos rios que descem a serra.

 

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O primeiro trecho não tem mata tão fechada. É considerado o mais perigoso na questão de assaltos (especialmente até a bifurcação para a cachoeira véu de noiva), por isto seguimos em silêncio. Mas foi tranquilo. Devido ao feriadão muita gente descia. Corredores de aventura vinham no sentido inverso.

 

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O tempo estava nublado, volta e meia chuviscava. Não deu para observar o Anhangava a nossa esquerda, num ponto conhecido como Boa Vista.

 

Com 2:40 hrs de caminhada chegamos na casa do engenheiro e na roda d'água, no rio Ipiranga. A casa do engenheiro é agora uma casa abandonada, em ruínas. Nele vivia a família do engenheiro responsável pela manutenção da belíssima ferrovia que desce de Curitiba para Morretes, possivelmente a mais bela ferrovia do Brasil, e uma das maiores obras ferroviárias do País.

 

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Uma pena deixarem abandonada aquela casa bonita. Mais provavelmente era uma mansão. Restos de uma lareira, banheira e uma piscina vazia ao lado da casa, com um visual incrível para a mata. A ferrovia passa a poucos metros. Mais adiante, a beira do rio Ipiranga, uma roda d'água deveria fornecer energia elétrica para a residência.

 

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Pegamos a linha férrea subindo e com poucos metros descemos para um pontilhão que atravessava o Ipiranga, indo para a roda d'água. É possível observar ainda seus restos. Uma bonita cachoeira caia num poção metros adiante.

 

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Na margem esquerda do rio estava erguido um acampamento de itupaveiros. Uma coleção de tendas baratas com uma grande lona azul, parecendo um acampamento do MST, mas acho que o MST é bem mais organizado.

 

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O que me deixou mesmo chateado foi ver que estavam cortando árvores nas proximidades para alimentar a fogueira comunal, debaixo da lona. Não eram galhos mortos, troncos secos, eram árvores vivas. Assim aumentavam a clareira.

 

A julgar pelo som que carregavam, bebidas e possivelmente "algunas cositas mas" as noites neste acampamento deveriam ser perfeitas para meditar, relaxar e ter um sono tranquilo.

 

Ao menos vimos um grande depósito de lixo ao lado dos trilhos, mostrando que eles carregavam o lixo para um ponto onde o concessionário da ferrovia podia levá-lo. O mais correto seria eles mesmos levarem, mas enfim...

 

Os itupaveiros são na maioria pessoas jovens e humildes. As mochilas e equipamentos deles são baratos e é algo difícil descrever como carregam as coisas nas costas. Devem passar frio e perrengues na mata. Calçados inadequados. Quando eu e Otávio passamos por eles, relativamente bem equipados para a prática de trekking, a impressão é que nos viam como aliens. Ora depreciativamente, ora respeitosamente.

 

Os grupos organizados de montanha chamam este pessoal de Itupaveiros ou, jocosamente, de "malária", por causa dos estragos que fazem. Mas eles têm o mérito de querer curtir a natureza. O problema é a maneira inadequada, insegura, sem um mínimo de treinamento para trilhas e pouquíssima consciência ambiental.

 

Mas o que mais me impressionou foi o relaxamento da fiscalização do IAP - Instituto Ambiental do Paraná. No posto de controle, no começo do caminho, alguns itupaveiros estavam com machados e facões bem visíveis, presos ao lado da mochila. Por que deixam entrar estes instrumentos? Os fiscais acham que eles serão usados para cavar buracos e enterrar fezes? Sei que o IAP enfrenta dificuldades por falta de verbas e interesse do governo do Estado, porém a negligência só depõe contra o instituto e torna questionável a sua existência.

 

Embora acampar seja proibido em todo o trajeto, o governo estadual também não colabora. O camping inaugurado com estardalhaço, na estação Marumbi, está fechado por falta de pessoal do IAP. Se falta pessoal, por que não entregá-lo a um grupo voluntário? Seria uma concessão que demanda trâmites legais/licitatórios, mas com boa vontade sai.

 

Depois de um lanche na borda da cachoeira, onde conversamos sobre estes assuntos, atravessamos de volta o pontilhão, tiramos fotos numa ponte ferroviária e voltamos a descer.

 

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A mata ficou ainda mais fechada. Faz pouca diferença se está chovendo ou ensolarado. Agora a trilha é bem histórica e conservada. É feita de pedras redondas retiradas do leito dos rios, por índios ou escravos no século 18 e 19. Se não colocassem as pedras os burros dos tropeiros cavariam com suas patas o caminho, fazendo grandes valas e buracos, que seriam erodidos pela água da chuva descendo. Como as pedras estão sempre na sombra, ficam úmidas o tempo inteiro. Para escorregar é facinho, facinho...Otávio disse que nesta trilha passamos a maior parte do tempo olhando para o chão. Para curtir a paisagem tem que parar de andar. De fato as unicas vezes que levamos um escorregão estávamos distraídos, conversando.

 

O caminho de pedras lembra um pouco a Ladeira do Império, no Vale do Paty, Bahia.

 

A floresta é luxuriante, belíssima. Profusão de árvores, palmitos, xaxins, bromélias, orquídeas, enfim, a vegetação que fez os naturalistas estrangeiros que visitaram o Brasil no século XIX descreverem nossa mata atlântica como uma das mais belas do mundo. As constantes chuvas que desabam nas encostas da Serra do Mar, do qual o complexo do Marumbi é uma de suas partes mais impressionantes, mantém a exuberância de vida nesta floresta pluvial.

 

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Um momento muito bonito foi quando baixamos para o nível das nuvens, passando por uma névoa no meio da floresta.

 

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A trilha passou a ter trechos bem íngremes de descida. Algumas vezes optei por usar a lateral do caminho, de terra. Embora não seja procedimento LNT - Leave No Trace, meus joelhos agradeceram. Algumas descidas tinham escadas de metal para ajudar.

 

Após 1 a 2 hrs depois da roda d'água chegamos no Cadeado, ou melhor, no Santuário da Nossa Senhora do Cadeado, cruzando outra vez a ferrovia. Bonito lugar, com bela vista do Marumbi, bem encoberto pelas nuvens. Um esquilo comia tranquilamente uns coquinhos numa palmeira quase ao alcance da mão.

 

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Lanchamos e tirei fotos.

 

Continuamos a descida. Com cerca de mais uma hora chegamos no rio, com ponte pênsil, sobre o rio Taquaral, o ponto mais baixo de nossa travessia, não longe da Usina. Uma coisa legal são estas pontes, várias no caminho, permitindo uma travessia fácil, segura e bonita dos rios. Numa tromba d'água devemos dar valor a elas!

 

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Passamos então a rumar para a Estação Marumbi. Saímos da trilha logo depois de uma pequena descida, que terminava numa escada de madeira saindo direto numa estrada de terra feita para 4X4. Eram 17:20. Concluímos o percurso de 25 km em aproximadamente 8 horas, contando com as paradas para lanche. Não foi rápido, mas o Itupava merece cuidado e não se tratava de uma corrida de aventura. Vale muito a pena parar volta e meia para observar a mata, com o silêncio apenas quebrado pelas arapongas e outros pássaros.

 

Mal andamos 100 metros ladeira acima uma pickup parou e um casal gentilmente cedeu uma carona na caçamba. Que beleza! Economizamos 30 minutos de palhetada até a estação Eng. Lange. Eles seriam um de nossos vizinhos na casinha em que pernoitaríamos.

 

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Na estação tiramos fotos e passamos a subir para a estação Marumbi, por um caminho muito bem conservado. Chegamos na cabana de um amigo do Otávio, que emprestou a bonita casa no meio da mata. Na hora de abrir a porta descobrimos que a cópia da chave, recém feita, não funcionava. Resultado: dormimos na varanda sem comida quente porque não trouxemos fogareiros, contando com o fogão da casa.

 

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Mas deu para sobreviver com os sanduíches! No dia seguinte, o Mathias, outro amigo, veio de Porto de Cima e trouxe a chave salvadora.

 

Neste dia, em virtude do tempo fechado e sem vista, desistimos de subir no Olimpo e fizemos passeios ali por perto. Aquelas casinhas do Marumbi são muito interessantes. Escondidas no meio da mata, tem poucos metros quadrados e nelas só chegamos a pé. A maioria dos donos é de marumbinistas, montanhistas do Marumbi. A melhor casa é a do Niclevitz, o maior alpinista brasileiro, que dessa maneira se mantém fiel a sua origem no montanhismo. Não se via lixo. Muita mata conservada. Subimos num mirante perto da estação para mais fotos.

 

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Pico Paraná entre as montanhas ao fundo.

 

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Grande obra de engenharia: viaduto em curva sobre um precipício.

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De noite bisteca de porco e arroz carreteiro para matar a fome de comida quente. Otávio e Mathias estão de parabéns como cozinheiros.

 

Dia 07/09, manhã bem nublada. Descemos pela trilha do guarda, com mata fechada, até uma estrada de terra, onde pouco adiante Mathias deixou o carro estacionado. Seguimos para a bonita e arrumada cidade histórica de Morretes, lotada de turistas, onde comemos um típico barreado. Passeamos pela cidade e depois subimos para Curitiba pela Graciosa, que merece o nome, uma das mais bonitas rodovias no País. Soubemos que pouco depois de nossa passagem, chuvas derrubaram uma árvore que bloqueou a rodovia.

 

Conheci assim mais um pouquinho das belezas do Paraná, graças aos amigos Otávio e Mathias, ficando devendo a eles uma guiada pelo Vale do Paty, na Bahia!

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  • Membros de Honra

É interessante ver pelos olhos de "estrangeiros" o Caminho do Itupava. Por ser uma trilha muito conhecida por nós, pois é o nosso quintal, acabamos não dando o devido valor.

Foi uma pena que o tempo não colaborou para realizarmos a Araçatuba-Monte Crista, mas caminhar 4 dias na chuva, sem visual não me agrada mais, acho que estou ficando velho...

E o bivaque forçado serviu pra você testar seu equipamento para o frio, se bem que não fez muito frio, pelo menos pra um curitibano. :mrgreen:

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  • Membros de Honra

Hahahaha! "Estrangeiro". Estava frio para um baiano, no Marumbi, mas bem menos que em Curitiba.

 

Quiriri fica para uma próxima oportunidade. Vi que tem roteiros para dois ou tres dias. Volta e meia vou para o Paraná.

 

Valeu a guiada, Otávio. O caminho é muito bonito. Vcs tem sorte de ter estas trilhas tão perto de Curitiba.

 

Abs, Peter

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